MARCO DO CORREIO
Por Machado da Graça
Olá amigo Josué
Como vai essa saúde? Cá por casa tudo bem, felizmente.
Gostava hoje de te falar, outra vez, do enorme escândalo que está a ser o julgamento do caso da Aeroportos de Moçambique.
É que, há poucos dias, houve duas intervenções, de declarantes, que me parece que merecem que falemos sobre elas.
Uma foi a do Dr. Arlindo Chilundo, Director da Escola do partido FRELIMO.
Disse ele, entre outras coisas:
- Que não sabia se a contribuição de Cambaza para as obras da Escola eram a título privado ou em nome da Aeroportos;
- Que não conhecia o quantitativo porque esse tipo de contribuições a Escola recebia em géneros e não em dinheiro;
- Que não sabia se era ilícito receber dinheiro de empresas públicas.
Ora vejamos estas afirmações uma a uma:
Ao dizer que não sabia se a contribuição de Cambaza era a título individual ou em nome da ADM, o Dr. Chilundo está a afirmar que está convencido que Cambaza tem, individualmente, capacidade financeira para fazer uma contribuição daquele
volume. Poderá o ilustre académico dizer-nos de onde pensa que virá essa capacidade financeira num servidor do Estado? Eu, lamento dizer, não acredito nesta afirmação do Dr. Chilundo.
Disse também que não conhecia o quantitativo mas, pergunto eu, quando a Direcção da Escola verificou que eram necessárias obras, não pediu orçamentos sobre quanto estas iriam custar? Pediu e aceitou de Cambaza a reparação sem saber quanto é que isso representaria? Volto a lamentar mas volto a não acreditar em mais esta declaração.
Por fim, Arlindo Chilundo lançou a dúvida sobre se será ilícito receber dinheiro de uma empresa pública.
E isto aqui já merece melhor análise.
Porque o raciocínio pode ser: Se uma empresa pública pode patrocinar, por exemplo, um filme, uma exposição de pintura, um bailado ou uma edição de um livro, por que não poderá patrocinar as obras da Escola do Partido FRELIMO?
Entramos agora numa área que, de forma alargada, se convencionou chamar de “conflito de interesse”.
E eu diria, de forma muito simplificada, que a questão aqui é a possibilidade, ou não, de haver uma retribuição pelo patrocínio dado.
Enquanto no caso do filme, da exposição, do bailado ou do livro a retribuição não vai, normalmente, além da colocação do logótipo da empresa no programa, no catálogo ou na contra-capa, no caso do apoio ao partido que está no poder as coisas são bem diferentes: o agradecimento pode ser através da manutenção no cargo que ocupa, numa eventual promoção ou em outras medidas igualmente lucrativas para os bolsos do benemérito patrocinador.
E espero que o Dr. Chilundo não nos venha também com a tese, já defendida neste julgamento, de que patrocinar uma actividade do partido FRELIMO não é patrocinar o próprio partido.
Portanto há que concluir que estas declarações de Arlindo Chilundo não têm ponta por onde se lhes pegue. E é pena ver alguém que tão bem raciocina, em termos académicos, raciocinar tão mal em termos políticos.
Declarações interessantes e importantes as do Inspector-Geral das Finanças, que dão ideia de que o saque na ADM foi muito maior do que aquilo que tinha sido levado a julgamento.
Foram viagens de pessoas que não pertencem à empresa (quem seriam essas pessoas), foram transferências para contas no estrangeiro (em nome de quem estarão essas contas?), foram pagamentos de trabalhos que nunca foram sequer executados (pintura da pista de Tete, por exemplo), enfim, um estendal de porcaria e pouca vergonha que parece não ter fim.
O Inspector-Geral das Finanças disse que tinham sido feitas duas auditorias, anteriormente, à ADM, em que tinham sido detectadas já várias irregularidades, entretanto agravadas.
E eu pergunto: Será que as Finanças também estão a fazer esse tipo de auditoria a outras empresas públicas? E, no caso de estarem, que resultados estão a ter?
É que aquele dinheiro é nosso, meu, teu e de todos os outros moçambicanos...
Um abraço para ti do
CORREIO DA MANHÃ – 18.12.2009