Encontro de presidentes na Ponta Vermelha
O presidente da República, Armando Emílio Guebuza, está previsto que receba hoje no palácio presidencial da Ponta Vermelha, em Maputo, os presidentes dos dois partidos da oposição com representatividade parlamentar, nomeadamente Afonso Dhlakama, da Renamo, e Daviz Simango, do MDM. O encontro foi confirmado ontem ao Canalmoz por uma fonte da Presidência da República e deverá ter lugar ao início da tarde.
O Canalmoz foi igualmente convidado para presenciar o encontro entre os três presidentes dos três partidos com representatividade parlamentar.
Armando Guebuza acumula a presidência da República com a presidência do seu partido, Frelimo.
Almoço ou negociação?
Segundo o convite formulado ao Canalmoz e Canal de Moçambique-Semanário para cobrir o encontro, trata-se de um “almoço” entre o chefe do Estado e os líderes partidários da oposição.
Dhlakama poderá vir a tentar uma negociação, visando a acomodação de interesses do seu partido.
Daviz Simango, sendo que Verónica Macamo já anunciou ao grupo de 8 deputados do MDM na Assembleia da República que “bancada nem pensar”, poderá ainda sair da Ponta Vermelha com uma “prenda” de Guebuza, isto é com a promessa de que o Regimento da Assembleia da República possa ainda vir a ser alterado para que o MDM ainda venha a ter a possibilidade de constituir bancada, o que a suceder colocará o MDM, perante o público, como um partido que já começou, tal como muitos outros, a andar a reboque da Frelimo. Mas, tudo isto, para já, são apenas especulações dos bastidores.
Fontes do MDM já confirmaram, ao Canalmoz e Canal de Moçambique – Semanário, que já está definitivamente assente que o Regimento da AR não vai ser alterado no que respeita à possibilidade de algum partido ou coligação parlamentar poder formar bancada sem ter pelo menos 11 deputados na Assembleia da República.
Interesses de Dhlakama
O presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, está desde a divulgação dos resultados do último processo eleitoral – em que obteve apenas 1/5 dos assentos parlamentares - muito interessado em negociar com o chefe do Estado, visando uma possível formação de Governo de Unidade Nacional.
O partido de Dhlakama, nas primeiras eleições multipartidárias realizadas no País, em 1994, obteve 123 assentos no Parlamento, tendo reduzido o número de assentos parlamentares para 117 nas eleições subsequentes, 1999. Nas eleições de 2004 elegeu apenas 90 deputados. Nas mais recentes eleições – do ano passado – a “perdiz” ficou reduzida a apenas 51 deputados, facto que gerou um descontentamento generalizado no seio daquele partido.
A Renamo decidiu que nenhum deputado tomaria posse na Assembleia da República e nas Assembleias Provinciais.
No entanto, houve uma autêntica reviravolta na Renamo aquando da Primeira Sessão da AR em que se deu posse aos deputados em geral. Alguns deputados à revelia da decisão de Dhlakama tomaram posse. Já nas vésperas alguns deputados às assembleias provinciais tinham desobedecido ao “boicote” decido pelo seu líder.
Nos últimos dias, a conta-gotas mais deputados da Renamo foram tomando possa. Ontem, praticamente todos os deputados tomaram posse. Entre estes deputados inclui-se alguns nomes sonantes no seio do partido como o caso de Saimone Macuiane, que foi mandatário nacional de candidatura da Renamo e da candidatura à Presidência de Afonso Dhlakama; Fernando Mbararano; Vicente Ululu e Ivone Soares – esta última é membro da comissão política da Renamo e sobrinha de Dhlakama. O próprio secretário-geral da Renano já tomou posse.
Os últimos acontecimentos revelam uma mudança de estratégia no protesto da Renamo contra os resultados eleitorais, e ninguém mais pode acreditar que todos estes deputados tomam posse à revelia da direcção do partido. E se for o caso só se poderá esperar que os deputados deixem pura e simplesmente de obedecer ao comando do seu ainda presidente, Afonso Dhlakama.
Agora que Dhlakama é convidado à Ponta Vermelha pelo presidente da República, será inédito se de facto lá aparecer. Se aceitar o convite do PR tudo leva a crer que Dhlakama terá conseguido a negociação que desejava. No entanto, Governo de Unidade Nacional almejado por Dhlakama é uma miragem que Guebuza não vai concerteza permitir que se concretize, tanto mais que já nomeou e já foram empossados todos os membros do novo governo composto por um primeiro-ministro 28 ministros e 22 vice-ministros, todos da Frelimo.
Os interesses de Daviz Simango
Confirmado que está, por Verónica Macamo – a nova presidente da Assembleia da República – que “bancada nem pensar”, como referem as nossas fontes, e confirmado que está por deputados do MDM no Parlamento que a sua estratégia “vai incidir, sobretudo, em fiscalização das actividades governativas” para o que, sem bancada e sem cargos em comissões terão assim “muito tempo disponível”, é de se esperar que Daviz Simango esteja hoje na Ponta Vermelha apenas para cumprir uma delicadeza protocolar.
A formação da bancada por parte do MDM só poderia acontecer com o “bom senso” da Frelimo, segundo o próprio MDM, baseado na Constituição da República. Mas o regimento da Assembleia da República só dá direito a formar bancada a pelo menos um grupo de 11 deputados e esse regimento é um produto da maioria absoluta da Frelimo na legislatura anterior.
A alteração do regimento para acomodar os interesses do MDM dependeria unicamente da vontade da Frelimo – que detém nesta legislatura uma maioria qualificada no Parlamento. E a Frelimo não está disposta a isso porque claramente o seu interesse é reservar para si o maior número de cargos nas comissões parlamentares e, sobretudo, chamar a si o maior volume de verba do Estado reservada às actividades parlamentares.
Por estas suas atitudes de exclusão a Frelimo tem estado ultimamente a ser vista como uma organização com intenções totalitárias e interessada apenas em manter a aparência de estar empenhada na construção da Democracia, ao permitir que esta seja consubstanciada por outras organizações mas na mais reduzida expressão possível.
Para o MDM até aqui tudo eram cenários possíveis quanto à hipótese da Frelimo vir a reconsiderar e a admitir a revisão do Regimento para que este não continue a contrariar o espírito da Constituição. No entanto, Verónica Macamo disse, esta semana, no Parlamento, a deputados do MDM, que “bancada nem pensar”.
A acontecer agora “bancada do MDM” será certamente um presente envenenado de Guebuza, simultaneamente presidente da República e presidente do Partido Frelimo, para fazer passar a ideia de que o MDM é mais um partido “esfomeado” da arena política nacional. (Fernando Veloso / Borges Nhamirre)
CANALMOZ – 22.01.2010