A Talhe da Foice
Por Machado da Graça
É verdade que os órgãos de informação continuam a designá-lo como líder da Renamo. Mas será, de facto? Estará ele a liderar alguma coisa nestes dias que correm?
Para além do mais, Afonso Dhlakama deixou, praticamente, de ser visto. Não só não foi visto no almoço oferecido pelo Presidente da República. Não é visto em lado nenhum. E um político que não é visto é como se não existisse.
Há imenso tempo que parece estar fechado na sua casa em Nampula. Cercado por uma quantidade enorme de polícias, fardados e à paisana.
E digo “parece” porque já houve um jornal que afirmou que ele se teria escapulido de lá sem que os polícias de tal se apercebessem.
As notícias que nos vão chegando dizem que ele continua a tomar importantes decisões sobre a vida do seu partido:
Por exemplo decidiu, e afirmou-o com vigor, que os deputados da Renamo, eleitos para a Assembleia da República, não iriam tomar posse dos seus lugares, em protesto contra a fraude eleitoral.
No entanto vamos assistindo à entrada desses deputados, pela porta traseira do Parlamento, para ocuparem as cobiçadas cadeirinhas. Não sei se já lá estão todos os 51 mas, se não estão, muito poucos devem faltar. Mesmo muito poucos.
Outro exemplo das decisões de Afonso Dhlakama é a realização de manifestações de protesto, igualmente contra a fraude eleitoral.
E, também, no entanto, as tais manifestações não acontecem. As eleições já foram em Outubro, os resultados oficiais foram proclamados em finais de Dezembro e agora, nos últimos dias de Janeiro, ainda ninguém viu um único manifestante a desfilar por nenhuma rua deste país.
Tudo isto me leva a acreditar que, de facto, Afonso Dhlakama continua a tomar decisões sobre a vida da Renamo.
Só que ninguém as cumpre. Só que os membros da Renamo, mesmo aqueles que são considerados mais próximos do tal líder, estão-se nas tintas para as decisões que ele toma e fazem o contrário do que o chefe manda.
Este tipo de autoridade faz-me lembrar a do soldado que afirma ter feito um prisioneiro na guerra. Mas quando lhe perguntam onde está esse prisioneiro, responde: Ele não quis vir.
No Parlamento os deputados da Renamo constituiram bancada e foram eleitos para cargos de chefia nas várias comissões parlamentares. Será que tudo isso pode acontecer não só à margem das decisões do Presidente daquele partido mas até contra essas decisões?
Será que é possivel o seleccionador nacional escalar uns tantos jogadores para os Mambas e aparecerem a jogar no campo outros jogadores, não seleccionados, um dos quais como capitão da equipa?
Diz-se que quando, em Portugal, Salazar caiu da cadeira e deixou de regular bem da cabeça, os seus antigos ministros continuavam a ir lá a casa pedir orientações, fazendo este teatro como se ele ainda fosse o Primeiro-Ministro do país.
Estará a acontecer o mesmo na Renamo? Estarão a fazer o teatro junto de Afonso Dhlakama como se ele ainda fosse o dirigente máximo do partido quando, na verdade, já existe uma nova direcção a tomar decisões que, essas sim, são cumpridas?
O próprio desaparecimento físico de Afonso Dhlakama e a especulação, que acima refiro, de que ele possa já não estar no interior da casa de Nampula, não são boas coisas para a cama dentro do país. Se for verdade que já não está nesse local, está onde e a fazer o quê?
Tudo isto são especulações que só a própria Renamo e a sua direcção, seja ela quem for, pode esclarecer.
E era bom que esclarecesse a curto prazo porque a situação é bastante estranha e confusa e essas não são características que se desejem na segunda maior força política do país.