1. Se bem que o título já coloca a interrogação sobre o nome Sakrani, outra questão se levanta ao longo da leitura: Porquê Guerrilha esquecida? Só que, afinal, chegados ao fim, é o próprio autor que coloca a questão e, sinceramente, pode-se não perceber por que razão considera essa guerrilha esquecida. Será que a grande arma que foi a saúde terá sido um capítulo esquecido? Terá sucedido que o percurso de vários combatentes que não puderam entrar em combate foi dalgum modo esquecido? Alguém se esqueceu dalguns momentos também eles históricos que a luta de libertação comportou?
2. O livro mostra-se bastante útil e de enorme alcance sobre assuntos e questões que qualquer intelectual moçambicano deve conhecer: A importância da sinceridade, a frequência de duas classes escolares num mesmo ano, de que se fala actualmente, e depois, com realce, a importância do estudo, conhecimento, sabedoria, informação para se ter livre o caminho para a independência, para a autonomia. O futuro de Moçambique passa pelo futuro da literatura?
3. “Mondlane, deliberadamente, não levou o assunto a uma discussão formal no Comité Central. Deixou isso para mais tarde, depois de falar connosco. Também neste caso Mondlane mostrou ser um grande estratega político e um líder com profunda sensibilidade para as especificidades dos comportamentos humanos”.
4. HM conta com pormenor, o que é espantoso, porque se consegue recordar de detalhes e circunstâncias que, com o andar do tempo, poderiam ter desaparecido. A sua infância, tem 74 anos de idade, as viagens, conversas, situações e, várias vezes, as datas dos acontecimentos. Parece ser mesmo feito com o detalhe de um médico.
5. Podemos ter aqui um manual de história de Moçambique, Portugal e até universal. O percurso das lutas pela liberdade do jugo colonial mostram-se espelhadas de forma sublime e, de algum modo, a teimosia de personagens que percebiam que existiam grandes mal entendidos mas persistiram na ideia de revolução.
6. “Muito provavelmente, ele tinha ouvido os tais boatos de que a FRELIMO seria uma coligação entre o imperialismo americano e o revisionismo soviético. Os camaradas que me reportaram esse encontro com o Che (Guevara), incluindo Mondlane, achavam que o seu cepticismo por vezes atingia as raias da arrogância”.
7. Nalguns momentos, esses lutadores aceitaram passar por portugueses para poderem contestar o fascismo. A magia da história está presente neste livro. Desculpam-se algumas repetições ao longo da descrição dos muitos factos e momentos e pessoas, do que resulta, por vezes, mas sem importância, o contar outra vez algo já narrado em outro capítulo. Também se justifica pelo facto de serem situações interligadas e parte de um mesmo processo que ocorria em diversas partes do mundo: Argel, Lisboa, Paris, Marrocos, Dar Es Salam e interior de Moçambique.
8. Por outro lado, é deveras interessante o desinteresse material que vigorava no tecido social da altura. Existia uma teia de amigos, amizades e conhecimentos que acabavam por resolver situações menos favoráveis, uns dos outros. Hoje, dificilmente seria possível encontrar tanta amizade (sincera e) despida de um cunho material.
9. “Era uma alemã de 19 anos chamada Heidi WITT. Era a loura mais bela que eu jamais tinha encontrado. Uma cara muito jovem, com um sorriso sexy encantador, uma extraordinária elegância, uma grande simpatia, um ar de mulher fatal, enfim, um sonho”.
10. O texto ganha muito quando fala do próprio autor, perde um pouco quando dá aulas de história ou de ciência política. A violência da literatura (da beleza do texto, das palavras e dos adjetivos) deve acompanhar-nos ao longo da nossa vida. Isso fortifica a mente com força e carisma, papel que HM desempenhou com mestria.
11. Não contou só por contar. Usou muita adjectivação ao mesmo tempo que efectuava uma incursão acentuada à história da saúde de Moçambique, um capítulo específico que teve a ver com uma área concreta e das mais importantes da luta – poderia haver outros que, por exemplo, descrevessem a educação, administração ou a economia.
12. Se valeu a pena lutar ou se os ideiais de Mondlane se mantém neste milénio?....Come on, Dr.....
SAVANA – 19.03.2010