À custa da Hidroléctrica de Cahora Bassa
A empresa sul-africana fornecedora de electricidade, Eskom, tem vindo a vender energia eléctrica à BHP Billiton a 12 cêntimos do rand por kilowat/hora, o que é inferior ao custo de produção. A venda da energia é feita através da Motraco, uma empresa mista formada pela EDM de Moçambique, SEC da Suazilândia e a própria Eskom.
A revelação foi feita no Parlamento sul-africano por Pieter van Dalen, deputado da Aliança Democrática, o maior partido da oposição da África do Sul, segundo informa o jornal «Business Report» de Joanesburgo. Pieter van Dalen fundamentava as suas declarações em documentos “secretos” obtidos não oficialmente junto da Eskom.
O acordo tarifário secreto entre a Eskom e a BHP Billiton, destinado ao fornecimento de energia eléctrica à Mozal e a outras duas unidades de produção de alumínio na África do Sul, contribuiu para os prejuízos que a empresa sul-africana de fornecimento de electricidade sofreu em 2009 e que se cifram na ordem dos 9,5 mil milhões de randes. Segundo Pieter van Dalen, a “Motraco paga cerca de 12 cêntimos do rande por kilowat/hora, e a BHP Billiton 25 cêntimos do rande por kilowat/hora relativamente à energia consumida pelas unidades de produção de alumínio em Richards Bay. Estima-se que o custo da Eskom pela produção de cada kilowat/fora varia entre os 33 e os 41.6 cêntimos do rande.
A Eskom também possui acordos tarifários “secretos” com a empresa mineira, Anglo American, nomeadamente no caso da mina de zinco Zkorpion Zinc na Namíbia, e da empresa mista de exploração de diamantes, Namdeb, que é propriedade da De Beers e do governo namibiano.
Os documentos na posse da Aliança Democrática indicam que a Motraco fornece 95% da energia de que dispõe à Mozal. Aquele partido da oposição acrescentou que a Motraco não estava a pagar por aquilo que consumia. Johnny Dladla, porta-voz da BHP Billiton, confirmou que “até à presente data a Motraco tem sido uma fornecedora fiável da Mozal”, acrescentando que não podia comentar em nome da Motraco.
No depoimento perante o Parlamento, o deputado da oposição sul-africano disse que as unidades de produção de alumínio exploradas pela BHP Billiton contribuíam apenas com 0.1% para o PIB da África do Sul, acrescentando que a BHP Billiton tinha uma dívida para com a Eskom no montante de 100 milhões de randes.
Parte da energia fornecida pela Eskom por intermédio da Motraco é comprada à HCB. Antes do Estado moçambicano ter-se tornado accionista maioritário da HCB, a Eskom impunha tarifas baixas pelo fornecimento da energia do Songo como forma de pressionar o Estado português a alienar a sua comparticipação na estrutura do capital social daquela hidroeléctrica, abrindo assim caminho para um relacionamento comercial com o Estado moçambicano que fosse mais proveitoso aos interesses da empresa sul-africana.
Embora o regime da Frelimo se tivesse colocado ao lado da África do Sul no âmbito da estratégia posta em prática pela Eskom relativamente à anterior gestão da HCB, o director executivo do GPZ conta-se hoje entre os que, no seio desse regime, se lamentam da forma como a África do Sul tem vindo a lidar com Moçambique e outros países vizinhos em questões energéticas. Em livro de memórias recentemente publicado, o director executivo do GPZ considera que “a vocação predadora” da África do Sul “permanece, mesmo se aparentemente mais disfarçada”. Para ele, “Pretória permanece obcecada pelo mito da criação da Constelação de Estados e a vontade de fazer dos vizinhos fornecedores de matérias-primas, incluindo energia”.
Os documentos secretos na posse da Aliança Democrática ajudam a compreender melhor a forma de actuação da Eskom em relação à HCB. A política de desenvolvimento económico da nova África do Sul, que visa a criação de postos de trabalho como forma de pôr cobro ao assustador número de desempregados no país, tem como premissa a concessão de incentivos a investidores estrangeiros, como a BHP Billiton, vendendo-lhes energia eléctrica ao desbarato e à custa de fornecedores como Moçambique. O défice que a Eskom tem vindo a acumular como consequência dessa política do governo do ANC, impediu que a empresa fornecedora de energia da África do Sul procedesse à reposição de equipamento e à expansão da rede eléctrica nacional para poder acompanhar o crescimento económico registado com o fim do sistema do apartheid. Como consequência disso, registaram-se cortes constantes no fornecimento de electricidade, tendo a Eskom introduzido o racionamento de electricidade a sectores vitais da economia e a consumidores domésticos. Para fazer face aos investimentos que acabou por ser forçada a levar a cabo com carácter de urgência, a Eskom optou por agravamentos tarifários na ordem dos 35%, aplicadas a consumidores domésticos não só na África do Sul, como também nos países vizinhos que dependem da energia sul-africana.
Figuras de volto do mundo dos negócios, conotadas com o regime do ANC, tiraram partido desta situação, aliando-se a empresas como a Hitachi do Japão, para depois conseguirem, por portas travessas, a adjudicação de contratos destinados ao fornecimento de equipamento de novas centrais térmicas mandadas construir pela Eskom. (Redacção)
CANALMOZ – 23.04.2010