JORGE HEITOR
Presidente Sanhá obrigou os militares amotinados a retrocederem na intenção de afastar o responsável pelo Executivo. Está por saber quem irá ficar à frente do Estado-Maior
Um dos cabecilhas das movimentações militares de quinta-feira na Guiné-Bissau, o general António Indjai, pediu ontem à tarde publicamente desculpa por ter ameaçado matar o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, líder do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
Indjai, que partilhou a coordenação das operações com o contra-almirante José Américo Buba Na Tchuto, disse que estava alterado quando proferiu "uma frase que não é boa". Mas terá sido o Presidente Malam Bacai Sanhá, face às muitas condenações internacionais do que se estava a passar, a aconselhar os militares sublevados a respeitar a Constituição e a moderar-se.
"Se quiserem, matem-me, mas isto que fizeram é um disparate", terá dito o chefe de Estado, segundo descreve no seu blogue o jornalista guineense António Aly Silva, que tem vindo a acompanhar no terreno os acontecimentos dos últimos dias.
Ontem à tarde, em conferência de imprensa, António Indjai, vice-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, tentou explicar as razões porque decidira revoltar-se contra o seu superior hierárquico, Zamora Induta, mandando-o prender, bem como ao director da Informação e Segurança Militar, coronel Samba Djaló. Induta, que chegou a ser porta-voz da Junta Militar de Ansumane Mané, na guerra civil de 1998-1999, teria pretensões de "formar um Exército privado", alegou o major Dabana Walna, presente na mesma conferência.
Os políticos decidem
Quando interrogado sobre se se considerava o novo chefe do Estado-Maior, como na quinta-feira se lhe referira Buba Na Tchuto, Indjai voltou a recuar: "os políticos" é que deverão determinar quem fica com esse cargo.
A escolha das chefias militares compete de facto ao Executivo, agora de novo nas mãos de Carlos Gomes Júnior, que quinta-feira chegou a ser sequestrado pelos revoltosos.
Depois de uma longa reunião com o Presidente Malam Bacai Sanhá, o primeiro-ministro afirmou ontem que não se demitirá e que irá continuar o mandato para que foi "eleito pelo povo" nas legislativas de 2008, que deram ao PAIGC 67 dos 100 deputados do Parlamento.
Mas a Guiné-Bissau tem assistido periodicamente a erupções de violência, como as que em 1999 e em 2009 afastaram Nino Vieira do poder (depois de em 1980 ele ter derrubado Luís Cabral). Ou como a que em 2003 deu o mesmo destino a outro Presidente, Kumba Ialá, líder do Partido da Renovação Social (PRS).
Há um ano, o jornal espanhol El País escrevia que aquele Estado "caminha para a autodestruição"
Há algumas semanas, a organização não governamental Human Rights Watch, com sede em Nova Iorque, denunciou a existência na Guiné-Bissau de assassínios arbitrários e politicamente motivados, de espancamentos e de torturas, bem como más condições nas cadeias. A corrupção é generalizada, sublinhou o grupo, e existe a desconfiança de que pessoas altamente colocadas são coniventes com o narcotráfico.
Em Lisboa, a comissão parlamentar dos Negócios Estrangeiros, presidida por Ribeiro e Castro, deputado do CDS, pediu para ouvir logo que possível o secretário de Estado responsável pela política externa, João Gomes Cravinho, sobre os mais recentes acontecimentos guineenses. Ao mesmo tempo, os Supremos Tribunais lusófonos adiaram sine die a reunião que deveriam efectuar em Bissau de
O oficial que atacou Nino Vieira Indjai é sobrinho de Tagme Na Waie
António Indjai, o general que ameaçou matar o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, é sobrinho do falecido Tagma Na Waie, que a 1 de Março de 2009 foi vítima da explosão de uma bomba no quartel-general das Forças Armadas, em Bissau. Indjai, que desde então aspirava suceder ao velho guerrilheiro balanta como chefe do Estado-Maior General, foi também o homem que, horas depois da morte do tio, dirigiu o ataque à residência do Presidente João Bernardo Nino Vieira, espancado e morto a tiro, na madrugada de 2 de Março.
Segundo o jornal A Semana, de Cabo Verde, Indjai "é um indivíduo pouco ou nada escolarizado" e as suas relações com o almirante Zamora Induta, que decidiu derrubar de chefe do Estado-Maior, "estavam longe de ser as melhores". Para além de vice-chefe da estrutura militar dirigida sucessivamente por Na Waie e por Induta, Indjai tem comandado o batalhão de Mansoa, aquartelado a
PÚBLICO – 03.04.2010