Presidência Aberta em Manica
Texto e fotos de André Catueira, em Manica
Em menos de dois meses Inhazónia e Matsinho, duas localidades dos distritos de Báruè e Gondola respectivamente, lavaram as caras para receber o Presidente da República (PR) que efectua presidência aberta em Manica. Casa nova para o chefe da localidade, carteiras novas para os alunos, reabilitação dos postos de saúde, arruamento e outras acções que caracterizaram a lavagem da imagem das localidades por onde Armando Guebuza passou no primeiro dia da visita àquela província.
Dados na posse do SAVANA indicam que em dois meses (Março e Abril) teve que ser construída uma residência oficial de tipo três na localidade de Inhazónia para a recepção e acomodação do PR nas escassas horas que iria permanecer no local.
A casa foi mobilada por completo, incluindo um televisor plasma, para uma localidade sem nenhum sinal de televisão. O chefe do posto que vivia na sede distrital de Báruè, Catandica, por falta de condições de habitação na sua localidade, teve que se transferir de emergência para a nova residência. Um dia antes da visita teve que abandonar a casa, junto com a família, para permitir uma inspecção protocolar e posterior acomodação de Guebuza.
“Inhazónia nunca antes fora visitada por um PR, apesar de ser uma localidade histórica, pelos massacres que aqui foram perpetrados”, palavras de João da Silva, no comício popular, no bairro Maputo, no primeiro contacto de Guebuza com a população local. Mais adiante, Silva indicou: “queremos congratular a sua vinda, porque hoje vimos coisas diferentes”.
Matsinho
Já em Matsinho, duas escolas (EPC de Matsinho e EP1 das Mangueiras), onde há décadas os alunos sentavam no chão e/ou em banquinhos trazidos de casa, foram totalmente apetrechadas com carteiras. Os alunos que estudam por debaixo das mangueiras, onde decorreu o comício, foram dispensados esta terça-feira para dar lugar à “presidência aberta”.
Como Inhazónia, as ruas de Matsinho beneficiaram de uma descomunal limpeza. A casa do chefe da localidade e o posto de saúde também foram atingidos pela febre de melhoramentos.
“Eu estou muito contente por termos carteiras na escola, já não vamos mais sentar no chão. Se o Presidente viesse muitas vezes, talvez teriamos mais salas de aulas para todos estudarmos”, declarações de Neto Mutondo, aluno, visivelmente emocionado.
Apesar do brilho exibido, as duas localidades não conseguiram esconder as fragilidades de infra-estruturas básicas para acomodação, comércio entre outros serviços.
Ataque de trombose
Quem não teve “sorte” durante a passagem do Chefe do Estado foi o chefe da localidade de Matsinho. Francisco Sande teve um ataque de trombose nas vésperas da visita presidencial. As causas da baixa são projectadas em supostas ameaças de denúncias que a população preparava por causa dos seus actos.
Segundo apurou o SAVANA no local, Sande teve uma queda repentina numa das reuniões de preparação da visita presidencial, quando recebeu, dos seus subordinados, o alerta das possíveis denúncias, no comício popular, dos seus “desmandos”.
O chefe de Matsinho foi recolhido de emergência para o Hospital Provincial de Chimoio, onde foi internado para receber cuidados médicos. Até esta quarta-feira, o chefe da localidade continuava internado sob cuidados médicos, mas fora de perigo de vida. O ataque impossibilitou Sande de receber o PR.
Entre as supostas denúncias que iriam ser apresentadas em Matsinho, constam o desvio do gado bovino do OIIL (Orçamento de Investimento para Iniciativas Locais) para fins pessoais, e a alocação dos famosos “sete milhões” para seus familiares desenvolverem projectos na cidade de Chimoio, no bairro Centro hípico. Alega-se, igualmente, que algumas pessoas, incluindo professores, iam pedir a sua demissão do cargo de chefe da localidade devido à sua postura.
Intimidações
Alguns residentes de Matsinho procuraram o SAVANA para denunciar vários casos de supostas intimidações de que foram alvo as pessoas que pretendiam publicitar as atitudes do chefe máximo da localidade, no comício popular com Guebuza.
“Muitas pessoas foram prometidas torturas em caso de denunciarem qualquer caso de corrupção que envolve o chefe e o seu elenco. Tínhamos muitas coisas para apresentar ao Presidente”, disse uma senhora, pedindo o anonimato. A interlocutora fez notar que o gado bovino é distribuído entre os ricos e que os sete milhões só beneficiam funcionários públicos ligados ao chefe. Acusou ainda a cobrança de dinheiro de “maneira pouco clara” para apoiar no funcionamento de escolas públicas.
Um outro cidadão, que igualmente pediu omissão da sua identidade, disse que viu o seu projecto, já aprovado pelo conselho consultivo da localidade, a beneficiar uma outra pessoa que foi implementá-lo na zona anteriormente por si planeada.
“Já fiz de tudo, mas não consigo rever a situação. Um projecto por mim feito, está a ser implementado por uma outra pessoa. Há muita corrupção aqui (em Matsinho), sobretudo com o fundo dos sete milhões”, acusou.
Aula de pobreza
Entretanto, o PR fez do encontro uma oração sobre pobreza à população que acorreu aos comícios por si orientados.
Falou da necessidade da população perceber os sintomas da pobreza para poder combatê-la, tal como se fez com o colonialismo e a guerra que durou os 16 anos.
“Quando alguém não come o suficiente, não bebe água limpa, vive numa casa onde quando chove a água penetra, está doente e não tem hospital para se curar, quer estudar e não tem escola, quer trabalhar e não tem emprego, isso é sinal de pobreza”, referiu Guebuza, recebendo um estrondo de aplausos em compensação.
“Os sete milhões, alguns dizem que é pouco, mas estamos naquela situação em que alguém dá a mão e o outro quer ficar com a mão toda. Trabalha com a mão que tem e o resto virá”, disse Armando Guebuza, em resposta à algumas inquietações da população.
Esta quinta-feira Guebuza inaugurou duas pontes sobre os rios Lucite e Mussapa, no posto administrativo de Dombe, distrito de Sussundenga. As pontes que interligam o centro e o norte de Manica foram destruídas no longínquo ano de 1978 pela aviação rodesiana de Ian Smith, durante a guerra de libertação do Zimbabwe.
Na sua visita à Manica, o PR fez-se acompanhar pelos representantes diplomáticos das Maurícias, Itália e Alemanha, uma representante do Banco Mundial em Moçambique, além de ministros do seu governo.
SAVANA – 28.05.2010