O carácter secreto do ritual de evocação dos espíritos, que decorreu na lápide evocativa da inauguração da escola, já se adivinhava desde que começaram a circular informações sobre a realização da cerimónia, cujo programa foi "escondido" a "sete chaves" para que não fosse do domínio dos jornalistas nem do público, sendo apenas do conhecimento dos membros das duas famílias.
A cerimónia decorreu nas primeiras horas da manhã de sábado, sendo que quando o sol começava a raiar, quase que sobrava pouco para se assistir. Tiveram acesso ao recinto da escola pessoas que se identificavam como sendo Mavota ou Magaia, famílias relacionadas com a ocorrência do fenómeno dos desmaios naquele estabelecimento de ensino secundário geral.
Repartida em duas partes, tradicional e religiosa, a primeira foi dirigida pela família Mavota, durante a manhã e a outra, na parte da tarde como forma de pedir paz aos seus antepassados.
Desde o sacrifício dos animais até ao “kupalha”, apenas estas duas famílias estiveram envolvidas, sendo que o público teve acesso às restantes etapas da cerimónia, principalmente para a festa.
O secretário do bairro do Zimpeto, Fernando Chiluvane, explicou que a realização da cerimónia serviu para informar aos antepassados dos Mavota e Magaia sobre o que estava a acontecer.
Acrescentou que estes rituais são sempre realizados, em momentos de alegria como de tristeza.
“Quando se inaugurou a escola houve uma cerimónia do género, tal como fizemos quando se realizou o lançamento da campanha sobre o meio ambiente, daí termos aceite informar os espíritos dessas famílias sobre o que estava a acontecer”, disse Chiluvane.
Um dos membros da família Mavota, Tomás Panguene, afirmou que a sua família aceitou tomar parte nesta realização para mostrar, uma vez mais, que os seus antepassados não têm nenhuma relação com o que está a acontecer naquele estabelecimento de ensino.
Ademais, segundo Panguene, a atribuição do nome do seu antepassado à escola era sinal de satisfação para os espíritos dos seus entes, não percebendo porque é que as pessoas estariam a envolver os Mavota nesta estranha ocorrência.
DÚVIDAS SOBRE A “MHAMBA”
Olga Tomás, vice-presidente da Ametramo, afirmou que é preciso cumprir todas as etapas deste tipo de rituais para que os espíritos se sintam envolvidos e respondam positivamente ao pedido das pessoas que realizam o ritual.
Segundo disse, a sua organização não foi contactada, daí não ser oportuno fazer previsões sobre o que poderá acontecer depois deste acto. “Se todos os procedimentos tiverem sido bem cumpridos tudo vai correr bem”, caso contrário, terá sido um trabalho em vão, assegurou.
FESTA POPULAR
Foram sacrificadas quatro cabeças de gado, dois bovinos e dois caprinos, num acto realizado pelos “madodas” da zona, que lhes coube a responsabilidade de esfolar os animais e entregar as partes para a festa da “mhamba” e as outras para as famílias dirigentes.
À festa, que juntou centenas de pessoas foi lhe adicionada uma quantidade não especificada de bebidas alcoólicas e refrigerantes, tudo adquirido pelas autoridades do governo da cidade de Maputo, em resposta ao pedido da comunidade do Zimpeto.
Voltou a ser patente a unidade dos cidadãos, quando a causa é o bem-estar de todos. Pela manhã, homens e mulheres carregavam panelas, pratos e outros utensílios domésticos em direcção à “Quisse Mavota” para ajudar na preparação da festa, que iniciou um pouco depois das doze horas, quando já estava concluído todo o ritual tradicional.
Não era possível distinguir as diferenças sociais entre as pessoas, porque naquele dia o interesse era contribuir para que os desmaios deixassem de preocupar os alunos daquela escola.
ACESSO RESTRITO
Agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM), homens das Forças Armadas de Defesa de Moçambique esforçaram-se para barrar a presença de jornalistas, na cerimónia tradicional de "evocação de espíritos" na “Quisse Mavota”.
O carácter secreto do ritual de evocação dos espíritos foi "escondido" a "sete chaves", dos jornalistas e do público, sendo apenas do conhecimento dos membros das duas famílias. Estes homens chegaram mesmo a ameaçar arrancar os instrumentos de trabalho de alguns repórteres, que insistiam em tentar captar imagens do decorrer do ritual.
Mas pelo que soubemos, não aconteceu nada de especial, ou melhor, nada diferente daquilo que normalmente acontece em actos tradicionais: evocação de espíritos ou “kuphalha”, de modo a que os alunos e professores da Escola Secundária Quisse Mavota tenham paz, durante as aulas e não só. Quer dizer, se a causa dos desmaios era, de facto, algo relacionado com a necessidade da realização de uma missa, incluindo o sacrifício de alguns animais (vacas, cabritos e galinhas), então, a partir de hoje, espera-se que mais nenhuma aluna volte a desmaiar naquela escola.- Alcides Tamele