“O facto de a UE pagar subsídios a barcos de pesca nas águas africanas já constitui em si um problema porque, dessa forma, os contribuintes de impostos estão a exacerbar as dificuldades dos povos africanos pobres de manter a sua subsistência”, defende Isabella Loevin, membro do Comité de Pescas do Parlamento Europeu.
“Contudo, ainda é mais embaraçante e imoral que estes subsídios estejam a ser pagos a navios que estão a violar a legislação internacional”, acrescentou Loevin, que falava em entrevista a agência noticiosa IPS.
A Fishsubsidy.org, uma organização que fiscaliza a actividade de pesca com sede em Londres, comparou os registos de 42 casos julgados em tribunal com os pagamentos de subsídios de pescas feitos pela UE.
Segundo várias organizações para a defesa do meio ambiente, vários barcos de pesca foram surpreendidos a violar as leis nacionais ou internacionais nas águas africanas, mais concretamente a Leste da região do Oceano Atlântico, onde a pesca ilegal é mais generalizada comparativamente as restantes regiões do mundo.
Um dos maiores beneficiários dos subsídios da UE é a companhia espanhola Vidal Armadores, que recebeu pelos menos 2,8 milhões na forma de subsídios entre 2004 e 2005.
Em 2004, os barcos de pesca da Vidal Armadores foram surpreendidos com cerca de 24 toneladas de bacalhau de profundidade.
Dois anos mais tarde, um tribunal dos EUA condenou o proprietário desta companhia, António Vidal, a uma pena suspensa de quatro anos e ao pagamento de uma multa no valor de 400 mil dólares.
A UE também pagou uma soma substancial em subsídios ao Porto Mediterrâneo de Sète, base dos cercadores (navios de pesca) do Atum de Barbatana Azul.
Esta frota de navios franceses é considerada a maior que opera no Mar Mediterrâneo, incluindo nas aguas da Líbia. As organizações para a protecção do meio ambiente estimam que a pesca excessiva ilegal do Atum de Barbatana Azul nas águas do Mediterrâneo colocou esta espécie a beira da extinção.
ILÍCITOS RECEBERAM 13,5 MILHÕES DE EUROS
O estudo da Fishsubsidy.org revela que 36 barcos envolvidos na pesca ilegal receberam mais de 13,5 milhões de euros na forma de subsídios da UE no período compreendido entre 1994 e 2006.
Desta lista, cinco barcos receberam mais de um milhão de euros cada um.
Os proprietários dos barcos foram condenados por infracções graves, incluindo entradas incorrectas no diário de bordo, captura de peixe abaixo do tamanho mínimo, uso de equipamento de pesca ilegal e exceder as suas quotas.
Por isso, disse Loevin, o Parlamento Europeu já questionou à Comissão Europeia sobre a sua política de subsídios para as pescas.
Como resposta a “Comissão Europeia defende que cada governo tem a responsabilidade de assegurar que as suas companhias de pescas beneficiárias dos subsídios não violam a legislação internacional”, explicou.
Por seu turno, Jack Thurston, um dos fundadores da Fishsubsidy.org, disse que estudos anteriores revelam que muitos subsídios de pescas da UE contribuíram directamente para a pesca excessiva dos stocks de recursos marinhos.
“Porém, o nosso estudo é o primeiro que estabelece uma ligação entre os subsídios e a pesca ilegal”, afirmou.
O estudo apenas faz “uma fotografia do problema da pesca ilegal e da prevalência dos subsídios da UE que estão sendo pagos aos barcos que foram condenados por prática de pesca ilegal, ou que infringiram a lei depois de terem recebido subsídios”, acrescentou Thurston.
De acordo com Thurston, os investigadores recolheram dados “dos portais dos governos na Internet, reportagens da imprensa e registos dos tribunais. A informação sobre a acção judicial não está centralizada e nunca foi divulgada ao público”.
Por isso, ele defende que “os governos europeus deveriam publicar uma lista detalhada das companhias de pesca condenadas por prática de pesca ilegal para sabermos quem está a violar a lei”.
“Essa é a única forma de assegurar que o dinheiro dos contribuintes de impostos não beneficie as companhias que estão a violar a lei que protege as nossas preciosas reservas de pescado”, rematou.
Para Loevin, não existe a mínima margem de dúvida que o comportamento de algumas companhias pesqueiras e’ razão suficiente para a sua exclusão dos subsídios da UE.
ACTIVIDADE NÃO AJUDA CONTINENTE AFRICANO
No caso do Sahara Ocidental, o problema estende-se para além dos subsídios. O departamento jurídico do Parlamento Europeu apurou que os barcos de pesca que operam com a bandeira europeia nas águas do Sahara Ocidental estão a infringir as leis internacionais.
Ao abrigo de um acordo entre a UE e o Marrocos, os barcos de pesca europeus estão autorizados a pescar nas águas do Sahara Ocidental.
Contudo, o departamento jurídico do Parlamento Europeu apurou, num estudo recente, que “o povo do Sahara Ocidental nunca foi consultado, bem como nunca recebeu benefícios da exploração dos seus ricos recursos marinhos”.
As Nações Unidas classificam o Sahara Ocidental como um território não-autónomo desde a década de 1960. O controlo do território é disputado pelo Reino de Marrocos e pelo movimento independentista Frente Polisário.
Segundo um estudo da ONU de 2002, qualquer actividade económica que não esteja de acordo com os desejos e interesses do povo do Sahara Ocidental considera-se como sendo uma violação a legislação internacional.
Por isso, no seu estudo, os juristas do Parlamento Europeu instam a Comissão Europeia a suspender ou introduzir uma emenda no acordo UE-Marrocos para assegurar que “os barcos com a bandeira da UE sejam banidos de explorar as águas do Sahara Ocidental”.
Porém, esta posição do departamento jurídico do Parlamento Europeu, datada de Julho de 2009, continua ainda por implementar.
- AIM