Também em 1988 havia sido criado em São Luís do Maranhão, Brasil, por iniciativa do então Presidente José Sarney, o Instituto Internacional de Língua Portuguesa. Foi uma época em que os meandros diplomáticos se movimentavam afincadamente, procurando firmar um espaço visível para a Língua Portuguesa e consequentemente para os países que usam esta língua. Foi a época em que o embaixador José Aparecido de Oliveira começou a delinear os contornos do que viria a ser a CPLP, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Mas também a época em que as Academias de Letras do Brasil e a de Ciências de Portugal lideraram o processo que levou ao primeiro esboço do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
Do ponto de vista histórico, estas manifestações que se intensificaram a partir da 2ª metade da década de 1980, consolidando-se na década de 1990, testemunham o evoluir de uma conjuntura que não podia ser diferente. O império português havia terminado no final da primeira metade da década de 1970, após uma década de conflito armado com as suas colónias africanas, por isso as emoções estavam ainda candentes e o processo de reconciliação das almas não é um caminho fácil. Persistia ainda na mente dos africanos a desconfiança natural para com tudo que viesse do antigo colonizador, mas por outro lado, na mente dos portugueses, a perda do império não quebrou a persistência do mito do império. Assim, tudo quanto dissesse respeito à questão da língua portuguesa encontrava referências nas fissuras criadas pelo processo histórico que levou às independências dos países africanos.
Tendo sido o Acordo Ortográfico ou o processo de elaboração deste uma das primeiras iniciativas de reflexão comum sobre a língua, fica patente o olhar desconfiado dos africanos, sobretudo de Angola e Moçambique, quer do ponto de vista científico, quer do ponto de vista político, cujas sequelas ainda persistem até hoje, embora com menor intensidade.
Curiosamente, é o Brasil e não Portugal quem toma a iniciativa de acções mais abrangentes no que toca à política da língua e dos países de língua portuguesa: José Sarney, em 1988, com a Constituição do Instituto Internacional da Língua Portuguesa-I.I.L.P, José Aparecido de Oliveira, que ao longo da primeira parte da década de 1990 levou a efeito um minucioso trabalho diplomático para a constituição da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
No tocante ao mundo ao mundo académico, mesmo as universidades portuguesas, quando começaram a pegar de uma forma mais sistematizada a questão da língua e da literatura de língua portuguesa foi de uma forma muito titubeante, desvanecendo-se estas hesitações a partir do momento que começaram a aparecer trabalhos científicos e académicos que muito contribuíram para o conhecimento do funcionamento e utilização da língua portuguesa nos países africanos.
No Brasil, diferentemente da atitude política, os estudos sobre os países africanos de língua portuguesa, no que toca à língua, à história e à literatura eram realizados acoplados aos estudos portugueses, demonstrando assim as grandes dificuldades que os países africanos enfrentaram para que se lhes fosse reconhecido o direito de merecerem ser objecto de estudo da língua portuguesa por si usada e da literatura por si produzida.
O êxito das movimentações, sobretudo políticas, para que a língua portuguesa na sua forma multifacetada em uso nos oito países da Comunidade de Língua Portuguesa se consolide, depende sobretudo dos estudos universitários. É daqui que vão ser produzidos os instrumentos que determinam as várias faces de uma mesma língua mais enriquecida. E o prestígio da língua portuguesa nos fora internacionais não pode ser considerado como um dado adquirido apenas porque é a terceira língua de origem europeia mais falada no Mundo. A experiência tem-nos mostrado que os nossos Estados ainda não conseguiram encontrar um denominador comum que defina políticas coerentes e sistemáticas para impor a língua portuguesa no concerto das Nações. É disso testemunho o facto de até hoje o Instituto Internacional da Língua Portuguesa continuar a existir no papel, sem grandes feitos e constituir matéria de lamentação em quase todos os encontros dos responsáveis da CPLP.
Por outro lado, o peso específico de cada um dos países que compõem a C.P.L.P deve ser comummente diluído numa ramificação comunicante, de modo a que as organizações internacionais considerem tão importante ouvir em português um representante do Brasil, Angola ou de Portugal, como ouvir um representante de São Tomé e Príncipe ou Timor Leste.
Teremos em Julho, mais uma cimeira da CPLP, que vai ter lugar em Luanda. É desejo de todos que a questão da política da língua no concerto das nações tenha em conta as conclusões alcançadas no encontro realizado em Brasília em Março último e que muito bem soube articular as reflexões dos académicos e a vontade dos governantes aí representados pelos ministros dos Negócios Estrangeiros dos oito.
Só com políticas sistematizadas e concertadas é que conseguiremos estudos cada vez mais de maior alcance, contribuindo para um cada vez maior prestígio entre os povos que a falam e também na arena internacional.
* Texto apresentado pelo Professor Doutor Lourenço do Rosário no âmbito da Comemoração do Dia da Língua Portuguesa e da Cultura da CPLP que teve lugar no dia 05 de Maio de 2010, no Instituto Camões em Maputo.- Lourenço do Rosário - Reitor da Universidade Politécnica