Escrito por Hélder Xavier
Moçambique é um dos países no mundo que mais recebe ajuda externa. Passados 35 anos de independência, o país ainda não conseguiu impor-se como uma nação economicamente independente. A economia ainda é sustentada pelas instituições monetárias ocidentais, nomeadamente o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM).
Ou seja, as instituições financeiras e a comunidade internacional continuam “a pensar por nós”, diz o economista do Grupo Moçambicano da Dívida (GMD), Humberto Zaqueu, para depois acrescentar que “é um cenário sombrio”. Diante desta situação, Zaqueu afirma que “se desenha um futuro em que vai ser necessário imprimir nova dinâmica na planificação pública, além de reforçar a política, mudar a forma de pensar e explorar novas formas de tributação”.
Uma situação que o economista acredita se pode reverter na medida em que os moçambicanos começarem a fazer “sacrifícios na componente da criação de capacidade interna de forma sustentável, de um sistema de cobrança de imposto eficiente e na aposta em matéria de fiscalização”. Já o economista Caldas Chemane é da opinião de que “com maior eficácia da máquina de cobrança de impostos podemos reduzir o défice que existe entre aquilo que são as receitas fiscais do país e aquilo que são as necessidades para o funcionamento do Estado”.
Mas adverte: “Tenho dúvidas de que a campanha de educação fiscal da população surta os efeitos desejados” porque as pessoas não pagam os impostos por falta de informação, muito pelo contrário, “há uma cultura de fuga ao fisco”.
Chemane afirma que a dependência económica de Moçambique é inquestionável, uma vez que “o desenvolvimento económico do país começa quando aceitamos ajuda externa” e “é impensável um Moçambique sem este apoio nos próximos anos”. Vários são os argumentos que defendem que o país pode ser sustentável mas “o crescimento das nossas receitas deveriam ter uma aceleração mais rápida do que temos vindo a verificar”, diz.
Portanto, aquele economista acrescenta que é necessário fazer “uma utilização que permita criar as bases de crescimento e autonomia económica”, através de uma cultura de investimento em lugar de “se preocupar com o consumo imediato”.
Da independência aos dias de hoje
Quando se alcança a independência, os moçambicanos herdaram as unidades de produção que eram praticamente dominadas pelos colonos e infra-estruturas, tais como rodovias, ferrovias, pontes e portos, estrategicamente montadas de modo a responder aos interesses do colono que era de servir de escoamento da matéria-prima para a metrópole e outros destinos comerciais, assim como facilitar a circulação das mercadorias dos países do hinterland.
Com a saída dos colonos, assiste-se à retirada do quadro de pessoal que assumia o controlo da economia, um dos factores que fez com que o país partisse para independência com alguma desvantagem, além da sabotagem de máquinas que deixaram as estruturas de produção bastantes débeis. A estes factores, veio sobrepor-se a agressão a nível da região Austral de África e a guerra civil dos 16 anos movida pelo regime do apartheid. Todos estes acontecimentos vieram reflectir-se na “performance económica do país”, afirma o economista Zaqueu.
No início da década de ‘80, o Estado traçou um programa que dizia ter “soluções para Moçambique”, como é o caso do PPI (Plano Prospectivo Indicativo), uma vez que se pretendia um crescimento rápido, mas nunca chegou a ser implementado. “O país foi ambicioso ao tentar introduzir o PPI, mas como nem todas as ambições nunca chegam a concretizar-se, esta não foi excepção”, comenta o economista do Grupo da Dívida. Enquanto se dispunha, por um lado, de um plano de crescimento, por outro, a dívida pública crescia de forma significativa para satisfazer as necessidades mínimas do povo.
E como resultado, em 1984, o país viu-se obrigado a declarar que não tinha capacidade de pagar as suas dívidas, dando-se o início às reformas económicas em resposta à crise. De uma economia planificada falhada passa-se para um sistema baseado no mercado, assistindo-se, portanto, à aceitação da entrada do FMI e do BM e à liberalização dos preços, sobretudo os agrícolas. Para o economista Chemane, a economia do país caiu depois da independência e o Governo tomou uma decisão ousada ao incorporar quadros sem formação em diversos ramos para “tomar conta da economia”.
Aquele economista acrescenta que o período das privações de alimentos por que passaram os moçambicanos nos primeiros anos de independência foi de aprendizagem e “ninguém gostaria de voltar a passar pela mesma experiência” e aquela situação “levou-nos a concluir que era necessário reverter a economia e assumir que precisamos do Banco Mundial e do FMI”. Os economistas são unânimes em afirmar que, com a guerra civil, a economia moçambicana regrediu, mas chegada a paz verificou-se um período “de franco crescimento” e o país é um exemplo de estabilidade macroeconómica, típico de uma economia pós-conflito.
E acrescentam que o mesmo poderia ter um crescimento mais rápido do que se verifica, mas, para isso acontecer, será necessário que se definam os sectores prioritários, estabelecer políticas de crescimento que sejam consistentes. Tem-se constatado que, algumas vezes, o Governo tem agido de forma desencontrada, ou seja, “há tendência de dispersão, onde cada ministério possui uma estratégia e é difícil verificar uma ligação naquilo que são os factores económicos essenciais”.
Humberto Zaqueu salienta que, desde a independência, Moçambique sempre foi “um país em transformações” e nunca teve tempo suficiente para “colocar os pilares, erguer uma estrutura sólida de produção para depois colher os frutos” do investimento que este teria feito em algum momento, porque teve de gerir situações de crise e mudança, desde uma dívida pública insustentável e um consumo público que excedia a produção - visto que a mesma não foi relançada -, passando pela guerra civil e adopção da economia de mercado até ao multipartidarismo que veio obrigar a acomodação de novas exigências.
O economista aponta como uma das razões de ainda não se estar a usufruir dos benefícios da independência o facto de o Governo não fazer “um estudo de custo e benefício das suas decisões”.
@VERDADE – 25.06.2010