De acordo com as nossas fontes, o massacre de Mueda, ocorrido a 16 de Junho de 1960, foi um dos últimos episódios da resistência dos moçambicanos à opressão colonial antes do desencadeamento da luta armada de libertação nacional.
“É que saturados da opressão, da humilhação, da exploração e do trabalho forcado, plantando sisal e algodão, sem qualquer remuneração, os moçambicanos decidiram protestar junto do Governo colonial. Fizeram-no de forma e ordeira e paciíica, mas pagaram caro por esse atrevimento, disse Josina António, entrevistada a-propósito, no distrito de Muidumbe, província de Cabo Delgado.
Josina António conta que nesta data realizou-se uma grandiosa reunião popular com a administração colonial portuguesa que se recusava a conceder liberdade ao povo moçambicano.
“Eu era pequena, mas já me interessava pela causa da liberdade. Lembro-me que com este massacre a administração colonial pretendia desencorajar possíveis casos de revolta dos moçambicanos. Pretendia ainda mostrar, através da sua superioridade militar, que qualquer tentativa de revolta teria a devida resposta. Efectivamente, a reunião de Mueda terminou com um forte tiroteio que ceifou a vida a centenas de moçambicanos”, contou a fonte.
Ainda segundo Josina António, o massacre de Mueda ensinou aos moçambicanos que a única via para o alcance da independência e da autodeterminação não seria jamais por via do diálogo, mas tão somente pela via da luta armada.
“E é assim que os moçambicanos decidiram unir-se e levar a cabo a luta armada de libertação nacional que viria a terminar com a assinatura dos acordos de Lusaka a 7 de Setembro de 1974 e consequente proclamação da independência nacional a 25 de Junho de 1975”, refere a interlocutora, acrescentando que foi na base da união que os moçambicanos venceram a guerra.
Refira-se que Josina António é combatente da luta armada de libertação nacional desde 1964. Participou na luta encorajada pelos pais. No teatro das operações, Josina António apoiava outros combatentes transportando comida e material de guerra para as bases da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
A mesma indica que desempenhava tais funções ciente dos riscos que corria, pois, se as autoridades coloniais se apercebessem poderia terminar a sua vida na escravatura. Aliás, refere a combatente, o risco era igualmente grande nas florestas por onde caminhava dada a existência de numerosos animais bravios.
“Sabia de tudo isso. Mas eu tinha na cabeça que era preciso expulsar o colonialismo do nosso país. Hoje, olhando para o que se passou desde a revolta de 1960 em Mueda, passando pelo início da luta armada em 1964 até a proclamação da independência nacional dez anos mais tarde, sinto-me orgulhosa de ter combatido para a paz e bem-estar dos moçambicanos”, diz a interlocutora.
A fonte sublinha que conquistada a paz e liberdade, os moçambicanos devem unir-se tendo como horizonte o combate à pobreza. Salienta ainda que os combatentes da luta de libertação nacional fizeram a sua parte trazendo a independência nacional, sendo que cabe às actuais gerações trabalharem em prol do desenvolvimento de Moçambique.
“Como diz o Presidente Armando Guebuza, cada um que faça a sua parte para o bem- estar de todos os moçambicanos. Eu fiz e continuo a fazê-lo. Vivo em Muidumbe e desenvolvo actividades tendentes à melhoria das condições de vida da população. O meu combate, iniciado em 1964, só cessará quando todos os moçambicanos viverem o bem- estar político, económico, social e cultural”, sublinhou.
PONTA DO ICEBERG
Ninguém tem dúvidas de que o massacre de Mueda, perpetrado pelo regime colonial português contra centenas de moçambicanos que exigiam o direito à liberdade, precipitou o início da luta armada de libertação nacional – afirma Estêvão Chilavi, combatente desde a primeira hora da luta armada.
Estêvão Chilavi integrou-se na Frente de Libertação de Moçambique logo após a sua fundação e pertenceu ao primeiro grupo de 250 guerrilheiros seleccionados para treino militar na Argélia.
Na altura acabava de ouvir falar da morte indiscriminada de moçambicanos que exigiam a autodeterminação. É assim que quando foi recrutado em 1962 recebeu explicações das razões da luta e muito rapidamente abraçou a causa da liberdade. Na altura era professor – catequista e não queria de modo algum ir para a tropa colonial, pois já compreendia que tal seria para lutar contra os seus compatriotas.
“Senti na pele a opressão colonial. Testemunhei a partida de muitos moçambicanos para plantações de sisal e algodão; e fortalezas onde iriam ficar detidos; moçambicanos com marcas de tortura. Isso criou em mim espírito de revolta e quando ouvi falar do movimento de libertação, pouco depois do massacre de Mueda, preferi abraçar esta causa”, conta Estêvão Chilavi, igualmente residente no distrito de Muidumbe, na província de Cabo Delgado.
O combatente da luta diz que mesmo ciente da superioridade militar do regime colonial português, manteve sempre a certeza de que a luta do povo moçambicano terminaria com a sua vitória.
“E foi o que aconteceu. Fomos oprimidos, massacrados, desprezados, mas finalmente a justiça chegou. Ganhámos a guerra e já estamos em paz”, referiu a fonte.
Chilavi disse que o 16 de Junho deve ser exaltado e comemorado por todos os moçambicanos, pois foi graças a esta data que os moçambicanos decidiram pegar em armas e lutar contra o colonialismo.
Aliás, lembrou ainda que o 16 de Junho, mais recentemente, assinala o dia da criação da moeda nacional – o metical – uma das conquistas da independência nacional.
“Apelo aos mais jovens para que assegurem esta independência empenhando-se na sua consolidação e preservação. Os jovens devem trabalhar para o desenvolvimento do país, inspirando-se naquilo que fizeram os moçambicanos em Mueda, em Chai, iniciando a luta armada até a independência. Se não o fizerem estarão a hipotecar a independência nacional”, frisou.DIVULGAR A HISTÓRIA
O GOVERNADOR de Nampula, Felismino Tocoli, defendeu ontem a divulgação da história da luta de resistência do povo contra o colonialismo português para que as novas gerações entendam e valorizem cada vez mais a independência nacional.
Tocoli fez estas considerações em plenas comemorações do 16 de Junho, que este ano assinala ontem a passagem dos 50 anos do massacre de Mueda. Também assinalou-se dia da criação do Metical – a moeda nacional.
O 16 de Junho também Dia da Criança Africana, pois foi nessa data em 1976 que o regime minoritário do “apartheid” abriu fogo contra centenas de estudantes no Soweto, arredores da cidade de Joanesburgo, que exigiam igualdade no sistema educacional na África do Sul.
Felismino Tocoli afirmou que estas datas devem ser do domínio das novas gerações, pois fazem parte do património cultural e histórico de Moçambique e do continente.
Referindo-se especificamente ao 16 de Junho como dia do Metical, o governante de Nampula apelou a todos moçambicanos para trabalharem em prol da sua preservação de modo a que ganhe o valor e a estabilidade desejados.
Ainda ontem, por ocasião das comemorações, o gabinete da esposa do governador provincial confraternizou com dezenas de crianças acomodadas no Centro de Refugiados de Macarretane.
Nas diferentes escolas da cidade e província foram levadas a cabo palestras elucidativas da importância histórica da data e promovidas diversas actividades de índole político- cultural.
As crianças marcharam pelas diversas artérias da cidade, plantaram árvores e, na praça dos heróis onde foi depositada uma coroa de flores, pediram mais protecção e respeito aos seus direitos.FESTEJAR COM A CHAMA
A PROVÍNCIA de Gaza assinalou ontem a passagem dos 50 anos do massacre de Mueda erguendo bem alto a tocha da Chama da Unidade Nacional que percorre os distritos a caminho da cidade de Maputo.
Segundo Raimundo Diomba, falando diante centenas de pessoas que se juntaram na Praça dos Héróis Moçambicanos em Xai-Xai, para assinalar a data, o massacre de Mueda foi o culminar de várias tentativas do povo moçambicano em busca da indipendência.
Aquele governante saudou as crianças de Gaza, por ocasião das celebrações do Dia da Criança Africana, pela sua capacidade de organização visando a defesa dos seus direitos.
De acordo com Diomba, o Governo, por seu turno, tem estado a priorizar diversas acções tendentes a melhorar a vida da “pequenada” desde a extensão da rede escolar e sanitária entre outras acções de vulto.
Segundo ele, apenas no primeiro trimestre do ano em curso foram assistidas mais de 800 crianças carentes.
CONSERVAR O LOCAL
ALBERTO Vaquina, governador da província de Tete, apelou ontem a população da localidade de Wiriamu, no distrito de Changara, a melhorar a preservação do local onde está erguido o monumento em memória das vítimas do massacre de Wiriamu, perpetrado pelo regime colonial português em Novembro de 1972.
A denúncia do massacre de Wiriamu pelo padre Hastings nos “medias” londrinos teve uma enorme repercussão internacional que levou ao isolamento cada vez maior do regime colonial português.
Aquele governante falava após a deposição simbólica de uma coroa de flores em Wiriamu nos arredores da cidade de Tete, pela passagem dos 50 anos do massacre de Mueda.
Foi a 16 de Junho de 1960 que as tropas coloniais portuguesas assassinaram cerca de 600 pessoas no posto administrativo de Mueda que pacificamente exigiam a independência do julgo colonial.
O massacre de Mueda é um dos últimos marcos que aumentou a consciência do nacionalismo levando á unificação dos três movimentos para a criação da FRELIMO, em 1962. Entretanto, o ARPAC, instituto de pesquisa sociocultural em Tete, está a efectuar um levantamento exaustivo dos locais históricos associados á luta armada de libertação nacional, sendo Tete uma das três províncias com zonas libertadas que possibilitaram o prosseguimento da Luta Armada de Libertação Nacional para as zonas centro e sul do país.
VALORIZAR O SANGUE DERRAMADO
UMA das formas de imortalizar os que perderam a vida pela libertação do nosso país do jugo colonial é valorizar e consolidar as conquistas da independência nacional e buscar inspiração para enfrentarmos a batalha pela erradicação da pobreza. Este sentimento foi expresso ontem em Quissico, distrito de Zavala, pelo governador de Inhambane, Agostinho Trinta, nas celebrações do 50º aniversario do Massacre de Mueda ontem assinalado em todo país.
Para o dirigente de Inhambane, o engajamento de todos nas actividades agrícolas, para matar a fome, na luta contra a burocracia, corrupção e o espírito do “deixa-andar”, é parte da valorização e consolidação das ideias que levaram a que centenas de moçambicanos fossem mortos, porque queriam o bem-estar de todos.
Entretanto, as crianças de Inhambane exigiram numa mensagem lida por ocasião da passagem do Dia da Criança Africana maior atenção por parte do Governo para que elas cresçam e se desenvolvam de forma harmoniosa.