Conselho de Administração acusado de gestão danosa
Por Raul Senda
Vive-se um ambiente de mal-estar nos Correios de Moçambique E.P, uma empresa estatal tecnicamente falida. Os membros do Conselho de Administração (CA), liderados por Luís Rego, são acusados de gestão danosa dos parcos fundos à disposição da empresa. Como consequência disso, vários funcionários estão sem salários há meses e as dívidas da empresa para com terceiros estão a atingir níveis insustentáveis. Mesmo assim, o CA incrementou os seus ordenados em 100%. A crise verifica-se três anos depois da empresa ter começado a registar sinais de ressurreição e tendo, inclusive, canalizado cerca de 333 mil meticais aos cofres do Estado. Contactado pelo SAVANA para se posicionar sobre este assunto, o CA dos Correios de Moçambique, através da secretária da direcção, preferiu abdicar desse direito.
Recorde-se que dados recentes do Instituto de Gestão de Participações do Estado (IGEPE) mostram que apenas cerca de 10 das 130 empresas estatais geram lucros com as restantes, incluindo os Correios de Moçambique, a acumularem prejuízos. Mas mesmo perante este triste quadro, vários PCA,s e administradores de empresas públicas deficitárias continuam a beneficiar de luxuosos ganhos, muitos deles subtraídos de fundos vindos do Orçamento do Estado para o saneamento financeiro de tais firmas.
Trabalhadores indignados
Devidamente identificados pelo jornal, funcionários no activo nos Correios de Moçambique vieram ao encontro do SAVANA com documentação em punho para denunciarem aquilo que apelidam de “gestão pouco criteriosa” protagonizada pela direcção da empresa.
Fizeram notar que, em meados de 2009, canalizaram ao ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula, dados que demonstram que a empresa está a precipitar-se para a bancarrota. Porém, afirmam que de lá a esta parte, o Ministério dos Transportes e Comunicações, entidade governamental que tutela a firma, ainda não se dignou a verificar a real situação dos Correios de Moçambique. No ministério dos transportes ninguém se predispôs a abordar o assunto.
Os trabalhadores dos Correios de Moçambique afirmam que nos 16 meses que Luís Rego está a dirigir o CA da firma montou uma “gestão excessivamente centralizadora” de tal sorte que outros membros da direcção não encontram espaço para questionarem certas decisões. Toda a cadeia de comando de organização herdada nos reinados de Maria Dimas e Benjamim Pequenino foi desmantelada, segundo os mesmos funcionários.
Assim, segundo eles, todos os directores centrais e provinciais que não se identificassem com os moldes de gestão de Luís Rego foram transferidos e até destituídos das suas funções.
De acordo com os queixosos, foi numa dessas incursões que o CA exonerou, de uma única vez, três dezenas de quadros que exerciam vários cargos de direcção desde o nível central até provincial.
Mais adiante, os trabalhadores afirmam que as consequências imediatas da desorganização da empresa começaram a ter efeitos nefastos como sejam; a concentração do poder no PCA, a gestão privada de algumas contas bancárias pelo próprio PCA cujos movimentos não são conhecidos na tesouraria, transferências de dinheiro destas contas para contas pessoais dos membros do CA, pagamento de obras fictícias adjudicadas sem concurso.
“Hoje, a empresa Correios de Moçambique para pagar salários faz com recurso aos empréstimos bancários, facto que não se verificava há dois anos, quando no mínimo as receitas conseguiam garantir salários de todos funcionários”, sublinham.
Entre várias supostas irregularidades imputadas ao PCA, os funcionários daquela empresa contam que em Julho de 2009 foi aprovado o novo regulamento de carreiras profissionais. Os feitos jurídicos deste dispositivo deveriam entrar em vigor em Agosto do mesmo ano. Contudo, por razões não explicadas pelo CA, até hoje a medida ainda não está a ser implementada.
Aumentos de salários aos membros do CA
Afirmam que o argumento para a não implementação do projecto das carreiras profissionais avançado pelo CA tem a ver com problemas financeiros. Mas para eles este argumento não procede, uma vez que houve recentemente um aumento dos ordenados dos membros do Conselho de Administração em mais de 100%.
O aumento dos salários dos membros do CA teve aval do ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula.
O salário do PCA passou de 55 mil meticais para 120 mil meticais mensalmente. Sobre este valor é ainda acrescido um subsídio de USD3.500 dólares (o equivalente a 122.5 mil meticais ao câmbio médio de 35 meticais).
Assim, Luís Rego apesar de estar a frente de uma empresa tecnicamente falida aufere mensalmente 242.500,00, exceptuando outras regalias como é o caso de subsídios de representação, alimentação, telefone, residência, viatura e combustível.
Por seu turno, os seus administradores incrementaram os seus salários de 42 mil meticais para 80 mil meticais. Acima deste valor é ainda acrescido um subsídio de dois mil dólares americanos, o equivalente a 70 mil meticais.
Dessa forma, cada um dos quatro administradores dos Correios de Moçambique aufere mensalmente 150 mil meticais, sem contar com as regalias acima indicadas.
Contam que os funcionários dos Correios de Moçambique não se beneficiam dos aumentos decretados pelo Governo e muito menos os subsídios referentes ao décimo terceiro vencimento desde 2008.
Contudo, estas privações já não se verificam para os membros do CA que neste momento têm a situação salarial regularizada, bem como os referidos subsídios.
Lembre-se que a ideia de privilegiar subsídios e se baixar salários aos membros do CA foi tomada no reinado de Benjamim Pequenino. A medida, segundo soubemos, visava diminuir a carga da empresa no que concerne ao pagamento de salários históricos aos membros dos CA cessantes.
É que todos membros do CA que cumprem dois mandatos passam a beneficiar-se de 75% do seu ordenado e com salários altíssimos, como é o caso dos aprovados pelo elenco de Luís Rego, as despesas da empresa também aumentam.
Assim, com o anterior ordenado, Luís Rego, em caso de cumprir o segundo mandato, iria receber na reforma 40 mil meticais mas, com o incremento que ele decretou passará a auferir 90 mil meticais. Por sua vez, os seus administradores, se renovassem os mandatos, com o antigo salário teriam 27 mil meticais. Todavia, com os ajustes vão auferir 60 mil meticais nas suas reformas.
Viagens altamente lucrativas
Os nossos informantes referem que não obstante a empresa estar numa situação deficitária, os membros do CA continuam a efectuar constantes viagens para dentro e fora do país, deslocações que proporcionam altos subsídios.
Para sustentar esta afirmação, dizem que nos últimos 15 meses, o PCA dos Correios de Moçambique gastou cerca de 10 milhões de meticais em 100 viagens que efectuou no país bem como no estrangeiro. O valor foi gasto em ajudas de custo e passagens aéreas, excluindo alojamento e alimentação.
Os funcionários da empresa fazem notar que as constantes viagens do PCA não estão a beneficiar os Correios de Moçambique a avaliar pelo estágio em que a firma se encontra.
Sublinham que a casa forte da empresa onde são armazenados os selos e postais está a arrebentar pelas costuras, mas o CA continua a ordenar a produção fora do país, numa estranha operação de obter dividendos pessoais.
O CA é ainda acusado de transferir dinheiro da empresa para contas de pessoas singulares e colectivas estranhas à firma, ou que não tenham prestado qualquer serviço à companhia. Os funcionários exibiram e forneceram ao SAVANA alegadas cópias das referidas transferências.
Salários em atraso
Consta ainda que nos Correios de Moçambique há funcionários que não auferem os seus salários há mais de três meses.
São os casos dos funcionários afectos às direcções provinciais dos Correios de Moçambique em Cabo Delgado, Tete e Inhambane. Esta realidade foi confirmada pelo SAVANA no contacto que manteve com alguns funcionários afectos à delegação de Inhambane.
Silêncio
O SAVANA está há pelo menos duas semanas a tentar obter um posicionamento do CA dos Correios de Moçambique sobre este assunto. O pouco que conseguimos foi chegar a fala com a secretária da direcção que nos solicitou uma carta a detalhar o assunto que pretendíamos abordar. Fizemo-lo. Mas debalde. Nesta quarta-feira voltámos a carga. Contudo, mesmo perante a nossa insistência, alertando para a gravidade das acusações e da importância da versão da empresa, o CA não se comoveu, até ao fecho da presente edição.
SAVANA – 23.07.2010