Leonel Mário d´Alva, foi o primeiro Ministro do Governo de transição investido em 21 de Dezembro de 1974. Na altura jovem economista de 39 anos, diz que foi uma missão muito difícil e complicada.
Téla Nón – Como é que começou a ser preparada a luta pela independência Nacional?
TN – Quem foi o representante Nacional?
Leonel – Foi o senhor Miguel Trovoada. Depois de uma reunião que fizemos em Bôbô Fôrro o designamos para ir a ONU, e dentre as coisas que deveria fazer era manifestar os nossos desejos de independência. O nosso enviado falou no comité de descolonização das Nações Unidas. Portanto a nossa voz foi ouvida.
TN – O massacre de 1953 terá reforçado o desejo pela independência.
Leonel – Efectivamente foi um detonador deste processo. O massacre feriu muito o povo e tínhamos consciência de que era preciso fazer qualquer coisa. Para além disso nos anos 50, 60 e 70 foram os anos da independência de África. Todos os países africanos reivindicavam a sua independência.
TN – E no Exterior do país é que o movimento ganha estrutura e torna-se mais actuante.
Leonel – Sim em 1972 houve uma conferência dos nacionalistas no exterior e criou-se o Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe, com um novo estatuto substituindo a CLSTP criada em 1960.
TN – A organização de libertação deambulou por muitos países da sub-região. Gana, Gabão, Guiné Equatorial, também Camarões. Porquê?
Leonel – Houve realmente a necessidade de encontrar um local mais apropriado. Não era suficiente criar uma organização, mas era necessário que ela tivesse contacto com São Tomé e Príncipe. Era necessário que o movimento estivesse num país aberto a independência. Para além disso houve uma certa divergência no seio dos nacionalistas, que levou uns a instalarem-se num país e outros noutros. Tudo em função das afinidades políticas e do apoio que poderiam encontrar junto as autoridades dos respectivos países.
TN – O apoio dos países de acolhimento era fundamental.
Leonel – Sim, a organização tinha de informar as autoridades do país, esse desejo de independência. O Gabão deu importante apoio, para além da própria Organização da Unidade Africana. Pessoalmente sai de São Tomé em 1963, estive em Lisboa, onde contactava com os nacionalistas, depois fui a Paris onde fui designado representante do movimento, para ligação com os nacionalistas na Europa. Por exemplo tinha contacto permanente com a dona Alda do Espírito Santo.
TN – Mas depois da independência, as divergências no seio do movimento terão aumentado de tal forma que teve que abandonar o país.
Leonel – Eu tive que exilar em 1982, porque não estava de acordo com determinadas posições do MLSTP. Achei que havia um radicalismo que só levava o país ao atraso. Algumas medidas que começaram a tomar contra os comerciantes. Algumas nacionalizações que começaram a fazer. São coisas com as quais não concordava. Havia também muita intriga e luta pelo poder. Assim decidi não continuar. As confrontações no seio do movimento são anteriores a data da independência.
TN – O que é que sentiu quando em 1974 tomou posse como Primeiro-ministro do Governo de Transição.
Leonel – Eu tinha naquela altura 39 anos. Sabia que era um peso muito grande. Estávamos num momento complicado. Havia falha de produtos alimentares. Os representantes dos proprietários das roças estavam a ser saneados, tudo isso punha em causa a produção nacional. Havia uma série de problemas. Mas em todo caso tive que ter coragem para os enfrentar. Tínhamos um acordo bem preciso assinado em Novembro de 1974, que era o acordo de Argel, que estabelecia o que devíamos fazer nesse período de transição. Mas no seio da organização nacionalista haviam pessoas que pensavam que poderiam fazer o que quisessem.
TN – Como é que considera o trabalho desenvolvido pela Associação Cívica
Leonel – Quando diziam que a Associação Cívica mandou queimar as propriedades, isso não é verdade. No entanto houve excessos, e nesse processo é normal. Estávamos a lidar com jovens. No momento do governo de transição estávamos preocupados com muitos problemas. A maior parte dos médicos que estavam cá eram portugueses. E quando uma vez eles apareceram no meu gabinete a dizer que imã embora, fiquei escandalizado. Como é que um país ia viver sem médicos?
TN – A opção pela via socialista foi a solução para resolver esses problemas?
Leonel – Foram os países socialistas que mais contribuíram para as independências. A luta pela libertação exigia meios financeiros. E naquela altura estávamos convencidos que o regime de tendência socialista seria melhor para o nosso desenvolvimento. Mas não enveredamos para um regime Marxista, porque sabíamos que as condições reais de São Tomé e Príncipe, não nos permitiria fazer isso.
TN – E agora passados 35 anos, como é que lê o país São Tomé e Príncipe?
Leonel – Acho que vale sempre a pena, que um povo lute pela sua liberdade. Julgo que estamos num processo de democracia pluralista, onde as pessoas têm direito de participar no processo político. No entanto é preciso que haja desenvolvimento económico. Não se troca a independência por nada. Agora o problema é a solução dos problemas básicos das populações. Mas é um processo que vai ser vencido com o tempo.
TÉLA NÓN – 12.07.2010