O estado de letargia em que Mecuburi se encontra é bem patente a partir do limite com o distrito vizinho de Nampula-Rapale, através da Estrada Regional (ER) nº 510, numa extensão de cerca de 60 quilómetros de terra batida. O trânsito nesta rodovia é feito com imensas dificuldades, pois os trabalhos de manutenção realizados quase que anualmente não têm atingido o mínimo de qualidade exigida.
A situação repete-se em relação a outras principais rodovias do interior do distrito, sobretudo na ligação entre a sede distrital de Mecuburi e os postos administrativos de Namina (39 quilómetros), Milhana (95) e Muite (90).
Mecuburi é um dos distritos de Nampula considerado potencialmente agrícola. Produz quase todas as culturas, desde alimentares, com destaque para o milho, gergelim, arroz, mapira, mandioca, amendoim e feijões, até às de rendimento, como o tabaco e algodão.
Conta igualmente com recursos florestais e faunísticos (madeira preciosa), cuja exploração é feita de forma intensiva, sobretudo na época seca, altura em que as dificuldades de transitabilidade das vias se reduzem.
PROMESSAS POR CUMPRIR
Mecuburi tem uma forte dependência em relação à cidade de Nampula, da qual dista a cerca de 85 quilómetros. Para cuidados médicos seguros a população do distrito tem que se deslocar à cidade de Nampula, o mesmo acontecendo quando é para comprar bens manufacturados, electrodomésticos e vender os seus excedentes agrícolas.
A satisfação das comunidades locais em serviços básicos é bastante fraca, o que obriga a que tenham que se deslocar sistematicamente à cidade de Nampula, elevando o seu sofrimento, tendo em conta o custo de vida e o estado das vias de acesso.
Flora Valongue, residente na sede distrital de Mecuburi, atira as responsabilidades ao Governo, acusando-o de ter prometido coisas que não está a cumprir.
Segundo ela, há mais de uma década que se fala da ampliação do edifício do centro de saúde local, como forma de proporcionar melhor atendimento às populações, mas de lá para cá nem água vem nem água vai.“Quando ficamos doentes somos obrigados a partilhar a mesma enfermaria com pacientes do sexo masculino. Isso fere as tradições locais”, disse Valongue.
“O centro de saúde é pequeno para atender a população do distrito e não há ninguém que veja esta situação, não obstante os gritos que lançamos sempre que acontece uma visita de responsáveis da província e do Governo central”, lamentou.
Por seu turno, Fernanda Rodrigues, membro da Organização da Mulher Moçambicana (OMM) em Mecuburi, considerou também que o seu distrito está votado ao abandono. Tal pode ser visto, segundo ela, pelo fraco desenvolvimento socioeconómico da região.
“É difícil aceitar que num distrito com muitos rios os seus habitantes continuem a consumir água contaminada retirada dos poços a céu aberto, riachos e cisternas de um edifício daqui da sede”, sublinhou.Fernanda Rodrigues lembrou que Mecuburi é actualmente a única vila-sede distrital sem energia eléctrica a nível da província, situação que, como disse, resulta da aparente negligência das autoridades administrativas locais para garantir o funcionamento do grupo gerador, pelo menos três horas ao dia, segundo está preconizado.
Por seu turno, Ernesto Manuel, produtor, está a equacionar transferir-se com a respectiva família de seis membros para o distrito vizinho de Nampula-Rapale e explica as razões: “Hoje tenho 32 anos de idade e nunca usufrui de boas condições de vida. Não gostaria de morrer sem nunca ter visto a televisão, sem beber água de uma torneira, dormir numa cama de um centro de saúde. Por isso vou à procura de melhores condições para mim e minha família, pois aqui está claro que isso não chegará tão já ”, sublinhou.Vitorino Namutapa, chefe do posto administrativo de Milhana, que conta com cerca de 15 mil habitantes, referiu que as mulheres não dormem em casa porque têm que passar a noite a procurar água. “Elas passam noites andando de um lado para o outro à procura de água para garantir pelo menos uma lata de 20 litros porque aqui a crise da falta de água é séria”, disse.
O centro de saúde de Milhana funciona num edifício em estado avançado de degradação. Há vozes que sugerem a quem de direito para a destruição daquela unidade sanitária para evitar danos humanos, já que o edifício pode desabar a qualquer momento.
“Houve promessas do Governo e de alguns parceiros de construírem um novo centro, mas já lá vão dez anos e nada ainda foi feito”, lamentou.
Mecuburi tem uma população estimada em cerca de 156 mil habitantes, servidas por 13 unidades hospitalares, das quais um centro de saúde com uma maternidade e enfermaria de medicina geral, outros nove centros rurais e três postos, uma rede que não beneficiou de expansão nos últimos 13 anos, não obstante ter registado, durante este período, um aumento de cerca de 13 mil pessoas.
O cenário leva a que uma cama esteja, em média, para dois pacientes e um técnico de saúde para atender 3200 mil pessoas.GOVERNO COM DIFICULDADES
O Governo de Mecuburi enfrenta dificuldades para a execução das suas tarefas. A própria administração dispõe de apenas uma viatura, afecta à administradora distrital.
À excepção dos Serviços de Actividades Económicas, os restantes sectores públicos no distrito, como a Saúde, Infra-Estruturas, Educação, Polícia da República de Moçambique e Secretaria Permanente não dispõem de meios circulantes.
Por outro lado, a Administração, a Secretaria Permanente e os SDAE são os únicos que funcionam em infra-estruturas condignas, ou seja, edifícios construídos ou reabilitados nos últimos cinco anos, sendo que os outros, nomeadamente a PRM, Educação e Saúde encontram-se a funcionar em sedes que se apresentam em estado lastimável de conservação.
Outras informações colhidas pela nossa reportagem indicam que em missões de serviço os chefes dos postos administrativos de Milhana, Muite e Namina fazem-se transportar em motorizadas.
SOCIEDADE CIVIL DEPLORA
CARDOSO Cuachia, presidente da Associação dos Amigos e Naturais de Mecuburi (AMEC), deplorou o estágio de desenvolvimento deste distrito da província de Nampula e atira as culpas aos membros do Governo local que na sua óptica não estão comprometidos com o seu crescimento. Mas também apela ao Governo provincial no sentido de levar a cabo acções para melhorar as condições de vida das comunidades.
Cuachia lembrou que Mecuburi foi no passado uma referência a nível nacional, por ter sido pioneira no processo de planificação distrital e descentralização e considera que depois desta fase que hoje marca o processo de governação no país o distrito ficou votado ao esquecimento.
A energia eléctrica da rede nacional produzida na Hidroeléctrica de Cahora Bassa, em Tete, ainda não chegou a Mecuburi, o que é difícil de entender, segundo o nosso entrevistado.
Sobre as vias de acesso, Cuachia lembra-se que das dificuldades de circulação nas áreas do interior do distrito, particularmente, e diz que ninguém mostra interesse em resolver o problema, o mesmo acontecendo em relação à insuficiência de unidades sanitárias, escolas e fontes de água.
A nossa fonte propôs uma reflexão a nível do Governo Central sobre as estratégias visando tirar o distrito de Mecuburi da letargia a que está votado e para promover investimentos para a exploração dos seus recursos naturais a favor das comunidades locais.FUNDOS CONDICIONAM REABILITAÇÃO DE ESTRADAS
LIMITAÇÕES de ordem financeira são apontadas como sendo os factores que condicionam a realização das obras de intervenção localizadas no domínio das estradas, segundo disse Miguel Mangue, delegado substituto da Administração Nacional de Estradas (ANE) em Nampula, quando indagado a-propósito das actividades que o seu sector tem vindo a levar a cabo naquela região.
Destacou na ocasião, que os troços Mecuburi-Muite e Milhana são aqueles que têm merecido atenção particular da ANE.
Contudo, a fonte indicou que não foi possível este ano mobilizar fundos para custear as obras de manutenção de troços críticos como Mecuburi/Milhana, cuja característica dos solos (rochosos) exigem equipamentos adequados.
“Mas estamos a fazer melhoramentos localizados na estrada que liga a sede distrital ao posto de Muite. Igualmente estão em curso as obras para o melhoramento de alguns aquedutos que se encontram em estado crítico”, ajuntou o entrevistado.
A justificação do delegado substituto da ANE em Nampula faz transparecer que a comercialização dos excedentes dos produtores em Mecuburi poderá enfrentar dificuldades para a sua realização, na iminência da queda das chuvas na região.NÃO ESTAMOS PARADOS
FACE à ausência, por doença, da administradora distrital de Mecuburi, Nerina Bustani, convidamos o governador de Nampula, Felismino Tocoli, para comentar as alegações das populações sobre o pretenso abandono a que o distrito está votado. Tocoli reconhece alguns dos problemas levantados pelas comunidades, mas nega que o Governo não esteja a fazer nada em prol do distrito.
“Não rejeitamos as queixas da população de que a prestação do Governo no concernente à promoção do desenvolvimento do distrito não satisfaz as suas expectativas, mas importa referir que muitas actividades em Mecuburi têm sido realizadas, à semelhança de outros distritos de Nampula, para melhorar o nível de condições de vida das populações em vários domínios”, disse Felismino Tocoli, indicando, entretanto, que reina muita ansiedade por parte das pessoas de ver todas as questões resolvidas de uma só vez.
O governador de Nampula anunciou que a energia eléctrica da HCB deverá chegar a Mecuburi ainda no presente mandato, que termina em 2014. Nesse contexto, segundo ele, o Governo está igualmente à procura de investimentos para a exploração sustentável dos recursos naturais, particularmente florestais, como é o caso do plantio de eucaliptos para a produção de postes para as linhas de energia eléctrica muito solicitados nos últimos tempos face aos projectos de electrificação rural em curso no país.
“Contudo, o crescimento da economia no distrito de Mecuburi depende do envolvimento de todos, pois a prossecução de iniciativas geradoras de renda criam capacidades para o Governo resolver de forma gradual as dificuldades com que as populações se confrontam. Referimo-nos ao acesso à água potável, educação, cuidados sanitários, emprego para além de oportunidade de transitar em boas estradas”, referiu o governante, admitindo, contudo, que Mecuburi merece uma atenção particular por parte do Executivo face às dificuldades específicas que enfrenta.- Carlos Tembe