SR. DIRECTOR!
“O meu maior mandamento é este: que vos ameis uns aos outros, como eu vos amei. Já não vos chamo servos, mas amigos, porque tudo quanto ouvi de meu pai vos dei a conhecer” - Jesus de Nazaré.
A questão que poderíamos nos colocar seria: como é que vive o trabalhador doméstico? Tentemos responder a esta questão. Falar do trabalhador doméstico, ou como muitos chamam empregado, na nossa sociedade moçambicana, equivale a falar do “escravo doméstico”.
Acho que todos sabemos o que significa ser um escravo. Se não, temos alguma noção sobre este. Escravo, em latim servus, para os romanos designava um indivíduo cuja vida é salva após a sua derrota num combate com a condição de colocar as suas forças ao serviço do vencedor. Portanto, o escravo está ligado ao trabalho árduo, duro.
Ante esta visão dos romanos, a primeira ideia que nos aparece quando pronunciamos a palavra escravo é: alguém sofredor, um sem direitos, um ser desprezível, sem valor. Num passado não muito distante, como povo, já fomos vítimas da escravatura fruto da dominação colonial. Os nossos portos foram usados para o transporte de irmãos nossos como escravos para o trabalho forçado. A história mostra-nos que foram compatriotas nossos da mesma pele, apelidados por sipaios, que capturavam e tratavam com crueldade os seus como escravos à semelhança do povo de Israel que fora escravo no Egipto conforme a sagrada escritura. Os egípcios fizeram sofrer o povo de Israel com trabalhos forçados e lhes fizeram amargar a vida com dura servidão, em barro e em tijolos, todo o trabalho no campo. Este povo sentiu na pele, na carne e no osso o que era sofrer e o que era ser escravo.
A verdade é única: o nosso trabalhador doméstico tratá-mo-lo como “escravo”. Um indivíduo sem dignidade, sem direitos, sem voz. Um indivíduo que não merece respeito. Um humilhado.
Se fôssemos capazes de fazer uma espécie de exame de consciência e de reflectirmos sobre as condições em que vive o nosso trabalhador doméstico, acredito que aprenderíamos a ser humanos para com este.
Ora vejamos como vive o trabalhador doméstico nesta sociedade: quase sempre entra às 6:00H da manhã e sai às 18:00H ou mais tarde consoante o trabalho do dia. Trabalha aos sábados e aos domingos. Não tem feriados e nem sabe o que são férias de um trabalhador. Recebe miséria. O seu salário não se aproxima ao chamado “salário mínimo” nacional. Há casos em que parte de 100,00MT ou 200,00MT. Em muitos casos, se chega aos 1.000,00MT é uma grande sorte. Eis a miséria do nosso “escravo” doméstico.
A relação que mantemos com ele é de patrão para “escravo” e de “escravo” para patrão. Dirigi-mo-nos a ele como se de cão se tratasse. Há casos em que um cão que na casa existe tratamos melhor, com mais respeito e com dignidade que o nosso trabalhador doméstico. Às vezes não tomamos em consideração a idade dessa pessoa. Mesmo se é mais velho nós tratamo-lo como de fosse bebé, só porque há uma relação de patrão e servo. Vejamos o cúmulo da nossa má educação e falta de respeito.
Até que ponto esse irmão ou essa irmã tem vida. Quase privado de ter tempo para estar com a sua família. Privado do desenvolvimento económico e social.
Tudo indica que esta maneira de tratar o nosso trabalhador doméstico herdamos do colono português. O colono nos tratou como escravos, animais. Diz o filósofo grego Aristóteles: “os que foram maltratados e acreditam que foram maltratados são terríveis, pois estão sempre à busca de sua oportunidade”. Hoje, passados 35 anos de independência do jugo colonial, nos tornamos “novos colonos” dos nossos próprios irmãos. Humilhamos e maltratamos os nossos. O colono tirou-nos a nossa humanidade. Deixou-nos marcas. Esta maneira de pensar chega a ser um sinal “indelével” para as nossas consciências.
Reconheçamos a eles como homens e mulheres dignos de respeito, consideração e apreço. O facto de serem pobres e procurarem algo para sobreviver não implica serem “escravos” nossos.
Melhoremos as condições de trabalho do nosso trabalhador doméstico. Visitemos as suas casas para nos inteirarmos de como vive ele ou ela vive. Não os tratemos de escravos, mas de amigos, nossos colaboradores. Como diz Jesus de Nazaré na Bíblia, “já não vos chamo servos mas amigos”.
Sejamos educados e solidários para com os nossos trabalhadores domésticos, convictos de que também estes são seres humanos com direitos e deveres, com dignidade e com sensibilidade.
Em suma, cultivemos uma ética de responsabilidade social para com os nossos trabalhadores domésticos.
- ZINHO LEMOS PANGARA