BM está a fazer a sua parte
- Waldemar de Sousa, administrador e porta-voz da instituição
Por Emídio Beúla
A economia moçambicana continua sob pressão de alta de preços. Até Agosto último, a inflação acumulada medida pelo IPC (Índice de Preços no Consumidor) da Cidade de Maputo havia atingido 12.2%, nível mais alto dos últimos cinco anos. A taxa de variação homóloga havia ascendido a 17.08%, contra 4.21% do igual período do ano passado. Ainda no mês de Agosto, a taxa de inflação média anual estava nos níveis de 8.2%, após registar 3.5% em Dezembro de 2009.
Na análise da inflação de Moçambique - que agrega os IPC das cidades de Maputo, Beira e Nampula, o comportamento dos preços nas duas últimas cidades tem uma tendência alta comparativamente ao ano anterior.
Mas a dinâmica dos preços nas cidades de Beira e de Nampula é menos acelerada quando comparada com os preços na capital do país. “Temos, até Agosto, na cidade da Beira, uma inflação homóloga de 14.3% e na cidade de Nampula de 11.57%, inferiores a uma inflação homóloga de 17.0% que a Cidade de Maputo enfrenta”, disse esta quarta-feira Waldemar de Sousa, administrador e porta-voz do Banco Central.
Perante um cenário de pressão inflacionária, o BM (Banco de Moçambique) reage afirmando que está a fazer a sua parte. Mas avisa que a inflação não é combatida apenas com medidas monetárias. “O sector real da economia deve reagir (com aumento de produção) para desacelerar as importações, sobretudo de produtos alimentares”, apela o porta-voz do BM, no lançamento do relatório sobre preços e conjuntura financeira do primeiro semestre de 2010.
Causas
Para a actual tendência inflacionária, o BM tem duas explicações: fraca produção interna e correcção dos preços de bens administrados, com destaque para combustíveis líquidos.
O sector real da economia continua improdutivo. Na agricultura, os planos e estratégias de produção de alimentos, os chavões como Revolução Verde, só servem para legitimar a continuidade de instituições. O défice de produção interna é contornado com recurso à importação de produtos alimentares. Uma importação que, no dizer de Waldemar de Sousa, é feita num ambiente de persistente depreciação da moeda nacional, o que acaba interferindo sobre os preços finais no consumidor. Com o rand e o dólar a partilharem uma tendência de fortalecimento no mercado internacional, o metical, confrontado com desequilíbrios na produção doméstica e outros na balança de transacções correntes, vê a sua tendência de fortalecimento enfraquecida. As frutas e vegetais têm sido as categorias de produtos no IPC com maior pressão para alta de preços. “Caso isolássemos o factor frutas e vegetais no comportamento dos preços na Cidade de Maputo, diríamos que a inflação em Agosto estaria abaixo dos 12%”, disse Waldemar de Sousa.
O processo de correcção dos preços de bens administrados é o segundo factor de que decorre a actual tendência inflacionária. Aqui, o BM destaca os combustíveis líquidos como a classe de produtos com preços administrados com maior impacto no IPC. Entre Março e Agosto, o preço da gasolina ascendeu em 73.2%, o gasóleo em 38%, o petróleo de iluminação em 54% e o gás em 29%. A média ponderada desta categoria de produtos incrementou em
48% entre Março e Agosto de 2010. Ora, estes produtos (combustíveis líquidos) têm um impacto em toda a cadeia de valor de produtos que entram no cabaz de referência dos consumidores. Mais ainda, o seu peso gera um efeito multiplicador em outras faixas de produtos.
“Há também o factor inflação inercial”, acrescenta o porta-voz do BM. O fenómeno, explica, decorre das expectativas pessimistas da dinâmica dos preços que, por vezes, faz com que haja uma antecipação dos preços futuros no mercado doméstico.
Taxa de câmbio
O primeiro semestre do presente ano económico passou sob pressão de taxa de câmbio do metical. Mas nos meses de Julho e Agosto a perturbação voltou a estalar no mercado cambial doméstico. A taxa de câmbio ameaçava romper a barreira dos 40 meticais por dólar americano. O BM interveio e, até 20 de Setembro corrente, a taxa do MCI (Mercado Cambial Interbancário) tinha reduzido para 35.9 meticais por dólar. A taxa dos bancos comerciais, que também roçava os 39 meticais em Julho e Agosto, reduziu este mês para 36 meticais por dólar, depois da intervenção do BM.
Para explicar este comportamento na taxa de câmbio, o porta-voz do Banco Central lembra a “tensão política” que afectou as relações entre o Governo moçambicano e os Parceiros de Apoio Programático. A postura dos parceiros que apoiam o OE (Orçamento do Estado), segundo o administrador do BM, criou algum “nervosismo” no mercado que se reflectiu de imediato no comportamento na taxa de câmbio pressionando para a depreciação do metical.
Balança de pagamentos
A balança de pagamentos do país está a registar, por razões imputáveis a crise económica e financeira internacional, problemas não apenas do ano 2010, mas também ao longo de todo o ano de 2009, introduz Waldemar de Sousa. As exportações – excluídos os grandes projectos - reduziram no primeiro semestre de 2010 em USD 138 milhões para níveis de USD 206 milhões, contra cerca de USD 344 milhões de igual período de 2009. A importância de se separar os mega-projectos na análise das exportações nacionais justifica-se pelo facto de os grandes projectos, regra geral, terem as suas contas bancárias e as suas receitas das exportações domiciliadas fora de Moçambique. Ademais, acrescenta Waldemar de Sousa, o fundo cambial do país, as divisas que alimentam as importações decorrem de exportações que as empresas moçambicanas realizam excluindo as de grandes projectos.
Incluídos os grandes projectos, nota-se uma melhoria das exportações registadas na balança de pagamentos de Moçambique no primeiro semestre de 2010 em cerca 11% para um valor de aproximadamente USD um bilião e dez milhões, contra USD 910 milhões registadas em igual período de 2009.
Enquanto isso, as importações, excluídos os grandes projectos, registaram no período em referência uma queda mínima de 5.5% para um valor de USD um bilião e duzentos e vinte e um milhões, contra USD 1.292 milhões registadas no primeiro semestre de 2009. Incluídos os grandes projectos, “temos uma queda menor de 4.3% para um valor de USD 1.550 milhões, contra USD 1.620 milhões do primeiro semestre de 2009.
O BM focaliza na sua análise das importações a excessiva concentração da factura de combustíveis. Dos USD 540 milhões que Moçambique vai importar em combustíveis líquidos, USD 200 milhões vão ser pagos em três meses, destacando que somente no mês de Julho a factura foi próxima a USD 93 milhões.
Madeira, castanha de caju e energia
Segundo o BM, até Junho de 2010, os produtos de exportação com maior dinamismo foram a madeira (que registou um crescimento no valor das exportações de 12.3%) e a castanha de caju (registou uma melhoria de 74%).
A madeira exportou no primeiro semestre deste ano cerca de USD 15 milhões, contra USD 13 milhões que exportou até Junho de 2009. A castanha de caju exportou USD 11 milhões, contra USD 6 milhões em igual período de 2009.
A energia eléctrica é outro produto de exportação que registou um comportamento positivo. Até Junho deste ano, o país exportou USD 141 milhões energia para os países que consomem energia da HCB, contra um valor de USD 373 milhões de exportações até Junho de 2009.
Peso dos combustíveis
A alta factura dos combustíveis líquidos, aliada à sua excessiva concentração em poucos meses do ano cria, aos olhos do BM, uma pressão adicional no mercado cambial do lado procura de divisas com reflexos na taxa de câmbio.
Até 22 de Setembro de 2010, o BM tinha colocado no MCI USD 620 milhões, contra USD 571 milhões e USD 446 milhões de iguais períodos de 2009 e 2008, respectivamente. “Há um elemento novo neste ano que decorre de uma medida recente que o BM tomou”, lembra o administrador, em referência ao valor destinado à importação dos combustíveis. Até Setembro corrente, o Bando Central vendeu, apenas para importação de combustíveis, USD 216 milhões, contra USD 84 milhões em igual período de 2009.
Todo o esforço que o BM realiza para conter a persistente depreciação da taxa de câmbio do metical tem uma expressão nas RILs (Reservas Internacionais Líquidas). E elas já denunciam uma tendência de ligeira queda. Dados provisórios referentes à Agosto de 2010 apontam para uma redução acumulada das RILs em USD 98 milhões, para um saldo de USD 1,742.6 milhões. Contribuíram para o desgaste das RILs as vendas líquidas no MCI na ordem dos USD 90 milhões, perdas cambiais líquidas decorrentes das aplicações do BM no exterior no montante de USD 31,6 milhões, pagamento de encargos da dívida externa no montante de USD 4,6 milhões e pagamento de diversas despesas do Estado em USD 5,5 milhões.
SAVANA – 24.09.2010