Escrito por Amade Camal
“Quem semeia ventos colhe tempestades”, já dizia o velho ditado, fazendo jus ao velho filósofo e estratega Tsu Tzin segundo o qual “a guerra é a forma mais rápida de empobrecimento”. O querido governo do belo Moçambique humildemente recuou tomando corajosas medidas ou promessas com vista a minimizar a subida galopante do custo de vida, acalmando, assim, o maravilhoso povo manifestante do dia 1 de Setembro.
Mas afinal o que e que aconteceu entre 5 de Fevereiro de 2008 e 1 de Setembro 2010? Simplesmente o metical desvalorizou aproximadamente 100% em relação ao rand e 50% em relação ao dólar americano.
Razões oficiais dessa desvalorização:
1ª - Crise económica internacional;
2ª - Aumento dos preços de cereais e petróleo no mercado internacional;
3ª - Pouca cultura de trabalho e baixa produtividade, principalmente.
Algumas das razoes acima descritas são inverdades, e a utilização destes argumentos está fora do contexto, senão vejamos:
A crise internacional deu-se em2007 afectando sistemas financeiros (bolsas de valores, fundos de poupanças e investimentos, bancos e similares). Moçambique é um país com um economia de periferia da “global finance” não tendo sido afectado negativamente, pelo contrário, a crise financeira internacional abria novas perspectivas para Moçambique uma vez que o capital de investimentos procurava e procura oportunidades com retornos maiores que os destinatários tradicionais (USA, UE e ÁSIA) de investimentos.
Moçambique seria afectado, eventualmente, se fosse exportador.
Infelizmente não somos com excepção da Mozal e Sasol cujos contratos programas garantem uma estabilidade dos preços pelos diferentes parceiros designadamente a matéria prima, transportes, energia, transformação e exportação do produto final.
O segundo argumento referente ao aumento dos preços de cereais, petróleo e alimentos no geral não faz sentido se compararmos com os preços de 2007/2008/2009. Falar de aumentos, sem efectuarmos uma comparação do antes e do depois, ou seja, os preços dos cereais, petróleo e alimentos diversos estão mais caros em relação a que período?
De acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional), tanto quanto se sabe, os cereais, o petróleo e todas as matérias primas atingiram recordes em alta de preços em 2008, por exemplo: o barril de petróleo atingiu USD 150,00 contra os actuais USD 75,00 em Agosto de 2010; O trigo em 2007 custava em média USD 262,00, em 2008 USD312,00, em 2009 USD232,00 e, em Junho de 2010 USD 157,00.
O argumento de que trabalhamos pouco e temos uma baixa produtividade é, em parte, falso porque está descontextualizado. Os moçambicanos não são preguiçosos porque há inúmeros exemplos de empresas com sucesso baseadas na mão-de-obra nacional, bem como inúmeros países da região que competem na importação dessa mesma mão-de-obra.
Paradoxal, pensará o leitor e com razão. É que esta mão-de-obra ou outra (americana ou japonesa) não treinada, mal paga, desmotivada, muito mal liderada não pode ter produtividade elevada; quando devidamente enquadrada, é tão boa ou melhor. Já dizia alguém, cujo nome não me vem à memória, que “quem paga amendoins recebe macacos” sem desprimor aos primatas.
Apesar de ter concordado com o anúncio das medidas restritivas, visando finalmente a redução da despesa pública, preocupam-me algumas questões:
Se redução significa tirar, subtrair, minimizar e, se vamos reduzir, a primeira questão é a de saber quanto despendemos agora antes das medidas restritivas, e quanto despenderemos com a aplicação das medidas restritivas (aplaudidas pelo maravilhoso povo), ficaremos assim a saber o valor reduzido.
A questão a seguir tem a ver com a durabilidade das medidas, já que o governo anunciou que estas seriam válidas até Dezembro 2010. Tenho muitas dúvidas de que em 3 meses o governo consiga implementar 30% das reduções intencionadas ou anunciadas, e porquê? Simplesmente porque levará imenso tempo a preparar uma proposta pragmática de redução das despesas públicas, fazendo-a reflectir nos próximos orçamentos do Estado.
Por último, porque o Presidente da República no princípio do seu primeiro mandato, tentou implementar medidas semelhantes, tendo sido sabotado pelo “aparatus” do Estado – lembremo-nos do “ combate ao deixa andar”.
Deixar claro que estas medidas restritivas eram, são e serão necessárias, por todas as razões, nomeadamente porque: O desperdício é um crime; Esbanjar quando vivemos de ajuda de outros é inaceitável; Enquanto houver empobrecidos e pobres, é imoral gastar sem benefícios para os governados;
Pelo que espero que o governo não só estruture legalmente estas medidas restritivas, bem como aplique sanções àqueles que a violarem.
Espero, também, que o governo tenha a capacidade de reconhecer que as soluções para o nosso país passam por nós e não pelos “outros”, razão pela qual cada vez produzimos menos em relação ao consumo. Ridículo, vergonhoso e até humilhante termos de importar tomate, cebola, batata, repolho (lembram-se) alface, etc., simplesmente inaceitável para quem faz um discurso de auto-estima.
Terá chegado a altura de admitirmos que por muitas razões (históricas) nunca tivemos agricultores, temos, sim, camponeses que para sobreviverem trabalham a Terra. Estes camponeses têm de ser educados, treinados e emponderados na produção e gestão Agrícola, de forma pragmática.
As soluções do Banco Mundial, FMI, alguns parceiros de cooperação, Nepad, Desenvolvimento do Milénio e outras barbaridades não passam de paliativos comprovados e denunciados pelos seus próprios agentes como forma de perpetuar o empobrecimento com a cumplicidade dos nossos governantes.
Estamos numa situação de emergência. São necessárias medidas extraordinárias corajosas, não olhar a meios para se atingir os fins.
Em outras palavras significa fazer uma REVOLUÇÃO.
Para o efeito, o exemplo tem que vir de cima, que esse maravilhoso Povo, ao invés de queimar pneus e atirar pedras, irá cumprir como sempre faz. “SER ORGULHOSO É MAU, MAS SER ORGULHOSO POBRE É AINDA PIOR”
A luta continua
@VERDADE – 23.09.2010