Canal de Opinião: por Noé Nhantumbo
Contrapondo a tendência das vantagens unilaterais
O mosaico lusófono no mundo é uma realidade e os países que o compõem encontram-se em situações diferentes de desenvolvimento socioeconómico.
Embora em termos numéricos sua população não seja nada que se compare a outros grupos de países a sua importância tem crescido ao longo dos anos.
Diplomaticamente é reconhecido o papel que Portugal tem desempenhado ao nível das Nações Unidas. Economicamente Brasil pertence aos BRIC e goza de posição cimeira em áreas como a avicultura e produção de açúcar, biocombustíveis, café, pesquisa e exploração de petróleo no mar a grandes profundidades, indústria aeroespacial, extracção mineira só para citar alguns exemplos. Angola já suplantou a Nigéria como o maior exportador de petróleo africano e possui um dos mais altos níveis de crescimento económico em África.
Mas o panorama nos países da CPLP não é nenhum mar de rosas como algumas interpretações podem querer fazer crer. Como no resto dos países do mundo existem problemas e alguns deles até bastante graves.
Politicamente pode-se dizer “sem papas na língua” que há problemas de deficit democrático e de cultura democrática. Excepto Portugal, Brasil, Cabo Verde que tem realizado eleições credíveis e transparentes, todos os outros países membros da CPLP têm problemas recorrentes de eleições suspeitas e tingidas pela manipulação, fraude, eliminação de concorrentes e deturpação do quadro legal para favorecer determinados partidos.
Outro deficit que merece atenção de todos é o que os diversos interlocutores, públicos e privados estão fazendo no quadro das relações existentes entre os nossos países. Há todo um potencial de cooperação que existe mas que não está a ser aproveitado pelos países, pelas empresas, pelas instituições.
A abordagem eleita pelos governos, pelos empresários e corporações que avançam com projectos multifacetados nos mais variados países da CPLP tem sido obviamente com vista a promover operações lucrativas e neste sentido a agressividade dos intervenientes difere. As estratégias postas em prática também são outra área em que os países da CPLP ainda têm que concertar posições.
Há espaço para progredir e isso só poderá acontecer se as diversas entidades políticas e corporativas envolvidas assumirem uma postura que promova os interesses de todos.
Há espaço para mudanças em conceitos e procedimentos. Se os parceiros da CPLP não conseguirem estabelecer fundamentos práticos que conduzam a uma cooperação mutuamente frutuosa e benéfica para todos os pronunciamentos políticos vão redundar no inócuo e inconsequente.
Até aos dias de hoje e perante um quadro cheio de possibilidades e com potencialidades de todo o tipo verifica-se um fraquíssimo aproveitamento dos mesmos. Os governantes abraçando a ideia em voga de criação de organizações baseadas em alinhamentos linguísticos e históricos embarcaram, na CPLP, aparentemente sem conceitos claros sobre o que cada governo membro pretendia ver realizado ou concretizado. Por causa de custos e de agendas internas muitas acções foram sendo adiadas e outras não sendo equacionadas. Se algum ímpeto existe nas relações entre os países lusófonos é fruto de interesses empresariais que se estão adiantando ao que os políticos fazem. E esse facto tira liderança e a capacidade dos responsáveis políticos desempenharem um papel de coordenação estratégica da cooperação entre os parceiros. Fica-se por vezes com a impressão de que com a CPLP veremos os seniores submetendo os juniores como acontece com a globalização em geral das relações político-económicas mundiais.
Importa redescobrir cenários e aceitar cooperar em termos que tragam mais-valias para os parceiros e não relações de subalternidade ou de dependência.
A países como Moçambique importa colocar os seus objectivos na mesa e manifestar com vigor quais são as suas pretensões ao cooperar com o Brasil, Angola, Portugal e outros integrantes da CPLP.
Falar a mesma língua é um factor importante mas não é o suficiente para definir as relações entre países. Os interesses e a avaliação de como se promovem tais interesses em benefício de quem coopera são fundamentais para que se criem fluxos e dinâmicas apropriadas e vantajosas para as partes.
A tendência muitas vezes evidenciada de sobrepor e colocar a agenda dos que mais recursos financeiros e tecnológicos possuem à frente de tudo que se faça na CPLP pode levar a que se produzam conflitos de interesse que acabem minando a cooperação que se pretende desenvolver.
Existem condições concretas para a mudança e enriquecimento das instituições implantadas que simplesmente requerem a clarividência de governantes e comunidade corporativa e empresarial dos países que constituem e compõem a CPLP.
Há que pegar no que se tem e explorar as vantagens comparativas que todos possuem. Entrar para um caminho de diplomacia responsável que ultrapasse os estreitos corredores da defesa de lobbies que muitas vezes não passam de interesses unilaterais e descobrir as vantagens da abertura e frontalidade negocial. Defendendo os interesses nacionais muitas vezes significa abdicar do que parece à primeira vista lucro fabuloso e optar por situações de equilíbrio de vantagens sustentáveis.
Os governantes de hoje tem de com responsabilidade e clarividência abrir caminho para uma CPLP mais forte, unida e coesa na arena internacional. De nada vale continuarmos a ver um fórum que se reúne periodicamente e que só produz resoluções programáticas que jamais se concretizam.
Enquanto há travões e demoras a concretizar projectos mutuamente vantajosos outros conquistam o espaço que produtos e mercadorias provenientes da CPLP poderiam estar ocupando no mundo.
Se queremos impacto e consequência nas nossas relações temos de abraçar outra maneira de estar e de agir.
(Noé Nhantumbo)
CANALMOZ - 22.11.2010