A PROVÍNCIA de Sofala orgulha-se pela sua imensa potencialidade no ramo florestal. Com efeito, vários investidores nacionais e estrangeiros se posicionam no terreno praticando, por vezes, o abate indiscriminado e de menor diâmetro, da chamada madeira da primeira espécie.
Asiáticos de origem chinesa constituem principais operadores que apenas se limitam na compra de toros que depois de serem processados são directamente exportados para diferentes mercados além-fronteiras, sob olhar passivo dos nativos que, entretanto, vêm reclamando lá vão longos anos do uso sustentável destas espécies mormente na área de exploração que são as zonas rurais altamente pobres.
Trata-se, na verdade, de um problema já com “barbas brancas”! Paradoxalmente, dos 12 distritos da província de Sofala, excluindo a cidade da Beira, são maioritariamente ocupados na sua superfície total pela floresta constituída por madeiras de primeira qualidade e não só.
Cheringoma, Muanza, Marínguè, Gorongosa, Nhamatanda, Dondo, Búzi, Chemba e Caia estão em intensa actividade de exploração madeireira cujas comunidades só se beneficiam das chamadas taxas de exploração dos recursos em 20 porcento das receitas para impulsionar as actividades sociais como a abertura de furos de água para consumo, salas de aula, cantinas rurais, indústrias de pequenas moageiras, entre outros, numa gestão caracterizada por certo oportunismo pela parte de alguns líderes comunitários.
Por isso mesmo, avolumam-se no terreno as lamentações até ao ponto das comunidades não terem a possibilidade de adquirir simples refugos da madeira para seu mobiliário e muito menos para a produção de caixões de forma a permitir uma sepultura condigna dos seus ente queridos. Cansados de assistir a suposta pilhagem dos seus recursos, a comunidade começa a insurgir-se junto às autoridades de tutela.
Praticamente, a questão se levanta quase em todas as zonas potencialmente florestais da província de Sofala. O problema de fundo é que as pessoas não entendem porque os cadáveres registados na zona devem continuar a ser embrulhados em caniço, durante os funerais, com tanta madeira à sua volta! Também não percebem a atitude do Executivo neste caso vertente, enquanto investidores continuam a se enriquecer na base de seus recursos naturais.
O caso mais recente foi levantado na povoação de Chirimadzi, área da concessão TCT-Catapú do operador Jams White, no posto administrativo de Inhamitanga, distrito de Cheringoma. Num encontro promovido pelo substituto legal do governador de Sofala, Carvalho Muária, um cidadão foi ao pódio para, entre outras coisas, dizer que os funerais são atrasados na zona até três dias, numa altura em que a morgue do Centro de Sáude de Inhaminga não se dispõe do sistema de frio com a agravante de se estar na época de Verão em que decomposição dos corpos é cada vez mais acelerada.
“Não devemos sequer caçar uma simples ratazana ou abater árvores para lenha nem para construção de nossas casas, porque tudo isto tem dono que é o concessionário florestal. Estamos num país rico em florestas, mas os naturais continuam empobrecidos (…), enquanto os estrangeiros exploram tudo e levam para onde quiserem e nós, apenas ficamos com a receita de 20 porcento que também fica nas mãos do regulado”- desabafou Manuel Alfinete Leitão.
Num problema aparentemente de difícil solução, o Governo defende-se, através da Direcção Nacional de Terras e Florestas, que o uso sustentável de florestas passa, necessariamente, pelo licenciamento de áreas em regime de concessões cujos operadores devem implantar no terreno serrações e dinamizem actividades de responsabilidade social. Mas na prática nem todos concessionários cumprem integralmente com essas obrigações, factores que determinam a ira da comunidade, principalmente na falta da montagem de serrações.
FALAM OS OPERADORES
A concessão florestal TCT-Catapú que conta em Sofala com dois blocos de 26 mil hectares cada, opera no posto administrativo de Inhamitanga desde 1988 e é considerada exemplo na gestão sustentável destes recursos a nível daquela província. Emprega um total de 240 trabalhadores e tem uma fábrica de mobiliário na Beira onde vende seus produtos incluindo na cidade do Maputo.
Anualmente, segundo o operador Jams White, são explorados 2200 metros cúbicos de panga-panga nas matas de Inhamitanga, numa zona que conta com aproximadamente quatro mil habitantes em Matondo, Santove, Púnguè e Zânguè, para além de Chirimadzi. O concessionário indica ser sua função na zona de explorar, serrar e escoar a madeira para a indústria na capital provincial de Sofala. Diz ter guardas florestais para proteger o meio ambiente e afirma estar a transmitir à comunidade o valor da madeira, decorrendo o reflorestamento de 12 diferentes espécies.
“Nós convidamos membros das comunidades para aprender a tornear madeira derrubada e espalhada pela mata e machambas que tem valor e não deve ser queimada. O nosso parceiro é a população que faz a plantação de árvores nativas nas comunidades onde depois de quatro anos da sobrevivência da espécie nós pagamos algum dinheiro como simples incentivo”- disse.
Adiantou que aquela concessão florestal enfrenta imensas dificuldades na região relacionadas com caça furtiva e queimadas descontroladas. “Nós temos obrigações contratuais com o Conselho de Ministros para proteger todos aspectos do meio ambiente incluindo florestas e animais. Animais, passarinhos, insectos, população, ar e água formam o meio ambiente, sendo que uma suporta a sobrevivência de outra espécie” – precisou White.
PROBLEMÁTICA DE CAIXÕES
Abordado pela Reportagem da nossa Delegação da Beira sobre a inquietação da comunidade relacionada com a alegada falta de uso sustentável de recursos florestais no distrito de Cheringoma, o chefe do sector das Actividades Económicas na região, Pedro Cofe, foi peremptório ao afirmar que as concessões e serrações não são obrigadas a produzir caixões para distribuir à população.
Mesmo assim, a fonte ressalvou haver muito apoio dos concessionários que têm serrações e o Governo faz algumas requisições de madeiras da última qualidade que são posteriormente cedidas às famílias para resolver aspectos pontuais. Exemplificou que, recentemente, o concessionário Jams White ofereceu caixões às comunidades de Púnguè e Chirimadzi.
“Portanto, nós não temos muitos problemas nesta componente. De facto, pode existir dificuldades no período em que as actividades de exploração da madeira estão em defeso, entre Dezembro e Janeiro, em que não se serra madeira por ser fase de evacuação das espécies em estância”.
Por outro lado, a fonte sublinhou que os concessionários cumprem maioritariamente com as suas obrigações de responsabilidade social, havendo nas povoações salas de aulas, furos de água potável, entre outros”.
Dos 8772 quilómetros quadrados que fazem parte de superfície total de Cheringoma, entretanto, 58 porcento são formados pela floresta. A região conta com nove concessões e duas serrações, sendo bastante rica em panga-panga, umbila, mutondo, missassas, entre outras espécies, e são anualmente explorados entre oito e nove mil metros cúbicos. Por conseguinte, funcionam na zona nove Comités Locais de Gestão de Recursos Naturais com contas em dia das taxas de 20 porcento.
Outrora, o distrito fora especialmente desenhado para a preservação da madeira e fauna bravia. Conta também com coutadas 10 e 12, para além de uma fazenda de bravio, numa fauna formada pelas impalas, búfalos, hipopótamos, crocodilos, cabritos cinzentos, azul e vermelho, gondongas incluindo macacos.
“A existência dessas riquezas naturais corresponde com o desenvolvimento do distrito, razões suficientes do aparecimento de muitos investidores, pese embora ainda continuamos com homens armados na zona de Mbunguyanga” – lamentou Cofe.
FUNERAIS CONDIGNOS
Sobre a reclamação de funerais em caniço por falta de madeira para caixões, o director dos Serviços Distritais de Saúde, Mulher e Acção Social em Cheringoma, Roberto Chiconda, desdramatizou tal versão da opinião pública, sustentando que em coordenação com o sector de Planeamento e Infra-Estruturas sempre se realizou funerais condignos.
Anotou que sempre que se registar qualquer morte há articulação entre as autoridades e concessionários no fornecimento de madeira para o fabrico de caixões. A fonte considerou como sendo um “falso alarme” levantado pela comunidade de Chirimadzi, porque, segundo ele, há comparticipação dos madeireiros no terreno.
Confirmou, no entanto, não haver sistema de frio na casa mortuária do Centro de Saúde de Inhaminga, mas reafirmou haver articulação no Governo que quando alguém perde a vida naquela unidade sanitária e não reclamado dentro de dois dias, então, são accionados mecanismos junto aos Serviços Distritais de Planeamento e Infra-Estruturas na tentativa de se realizar o funeral do indivíduo não reclamado.
“Nunca fizemos o funeral em vala comum, mas sempre de caixões com elementos de Planeamento e Infra-Estruturas em enterros condignos. Também nunca tivemos o registo de queixa, tal como aconteceu, desta vez, num comício. Contudo, vamos continuar a envidar esforços que situações como essas não possam aparecer ao de alto, porque sentimos que tanto os concessionários como os serviços distritais de tutela têm se empenhado bastante na melhoria das condições do nosso povo, em particular a questão da atribuição de madeira para a produção de caixões para os nossos ente queridos”- rematou aquele clínico.
ISTO É POBREZA!..
Na sua intervenção, o substituto legal do governador de Sofala, Carvalho Muária, indicou que o Governo está a trabalhar em conjunto para resolver estas e outras preocupações levantadas pela comunidade em Chirimadzi. “O país é pobre e continuamos a não explorar devidamente os nossos recursos. Isto é pobreza e algumas questões que levantaram neste comício vamos percebê-las melhor junto do Governo distrital e provincial” – elucidou.
Para ele, entretanto, o importante é que acreditemos nas nossas capacidades e recursos para a resolução de qualquer dificuldade que enferma as comunidades. Daí, prosseguiu, deve continuar a haver unidade nacional, porque isoladamente nada se resolve e exortou as comunidades rurais a manter as florestas por via de abandono das queimadas descontroladas.
A uma pergunta do “Notícias” sobre a reclamação da comunidades relacionada com suposto uso insustentável de recursos florestais na sua área de jurisdição, sobretudo em Cheringoma, o dirigente máximo da província de Sofala acredita que provavelmente o problema não seja tão verdadeiro porque, na sua avaliação, alguns operadores do ramo têm estado a apoiar a população.
Todavia, Muária alertou que qualquer família quando necessitar de caixão deve contactar as respectivas autoridades administrativas ou comunitárias como chefe da localidade e régulo. Exemplificou que a concessão TCT – Catapú, onde escalou nesta visita de trabalho ao distrito de Cheringoma, sempre está pronta a apoiar as comunidades quando for contactada pelas autoridades para o efeito.
- Horácio João