CRÓNICA Por: Gento Roque Cheleca Jr., em Bruxelas
As pessoas de verdadeiro valor estão fora das universidades. É chocante ver docentes apresentarem-se com o título “prof. Doutor.”, cuja indigência mental é evidente a todas as luzes. Os erros do sistema de ensino residem essencialmente nos professores. Os alunos são apenas um dado do problema. José Hermano Saraiva, Historiador Português.
Os efeitos da política de Guebuza fazem-se sentir em toda dimensão no país. O desemprego, a par da degradação das condições de vida e de trabalho, não param de subir. À semelhança da Agricultura, a Educação é o exemplo claro de um sector que não passou da mediocridade e do improviso, apesar dos remendos que nele se coloca.
A única diferença substancial que se verifica é que no sector da Agricultura há um baile contínuo de ministros em testes como se fosse o vaivém espacial em mais uma acção aziaga da NASA em descoberta de poços de petróleo no deserto de Sahara, por outro lado, no sector da Educação é o elevado número de políticas que não conduzem o país senão ao muro das lamentações.
Sabemos e sabemos muito bem o quanto o governo gasta em projectos insustentáveis que vão desde à destruição dos saberes até o escangalhar de valores étnicos, culturais e sociais, mas também, a proliferação de nadosmortos em matéria ligadas à Educação.
Neste capítulo infeliz, parecendo que não, temos bandeira de honra e glória a flutuar no pódio.
Uma visita ao site do Ministério da Educação (MINED) é possível verificar o desfile de instituições engalanadas, de pouca objectividade, onde reina à reprodução de aleluias de subjectividades; instituições essas que importam políticas educacionais do estrangeiro, que nada têm a ver com a realidade concreta do país, mas lá estão – ao que tudo indica – para incrementar medidas no sector em referência! Só não somos ainda um País de primatas porque de facto há oásis, dentro do sector da Educação, que tentam milagrosamente inverter o quadro negro da situação.
Alguém entendeu numa dessas viagens ao estrangeiro que devia convencer o MINED a introduzir as chamadas “passagens automáticas” nas escolas públicas, e foi dos piores improvisos que alguma vez se importou.
Uma medida aventureira como esta extravasa, de uma ou de outra maneira, a descolagem de um sector que continua a marcar passos de gigante rumo à
Antiguidade Histórica.
Tudo parece lógico que as chamadas “passagens automáticas” foram introduzidas para justificar aos doadores que o sector da Educação está comprometido em erradicar o analfabetismo no País. Na prática estas medidas estão a revelar-se insanas e aventureiras, porque não é capaz de colocar as nossas crianças a pensar, a reflectir e a discutir problemas.
Não resta a menor dúvida de que com este sistema as nossas crianças saem piores do que entram nessas escolas. É como se fosse uma esponja que absorve todo o tipo de líquido, isto é, que não é capaz de questionar as coisas com racionalidade, muito menos colocada à prova. Isto não só estraga a mente da criança como asfixia a sua capacidade reflectiva.
Não há nenhuma aprendizagem nova digna de realce senão a evocação de deuses de um certo partido e o decorar das letras do abecedário. Este é um sistema que não presta nenhuma atenção a essência dos problemas dos estudantes, dos professores e do funcionamento das escolas. Funciona mal e os resultados estão à vista. Nem os nomes desses deuses postos a decorar as crianças conseguem memorizar. Já nem falo das datas!
Enquanto os principais desafios do MINED forem de natureza política e não propriamente de cariz técnico, o parto defeituoso dos estudantes é para continuar. Dizia António Nóvoa que “A escola não está ao serviço de um projecto de ocupação, de agenda ou de entretenimento das crianças.” Para aquele educador português, “A escola está ao serviço de aprendizagem.”
Basta ver o Processo de Bolonha agora introduzido nas nossas universidades para verificar a grande trapalhada em que este governo se meteu. Viciado em apreciar as coisas por baixo, sem qualquer estudo sério de impacto conjuntural (económico, social, etc.) lá avançou com mais uma “ideia genial”. Não entendo patavina o porque deste ‘tchapo-tchapo’ todo ou seja da correria em formar “projectos de doutores”!
Como corolário disso, assiste-se hoje a fuga massiva dos famosos empresários de sucesso em áreas como a fé religiosa, a agricultura, o comércio, a indústria para se dedicarem ao ‘dumanengue’ do ensino. Eis a razão das 38 universidades que o país pariu nos últimos 35 anos.
Universidades sem salas de aulas, sem laboratórios, sem itinerário, sem o mínimo de condições, enfim, sem universalidade nenhuma! Alguma delas, 1 ano depois da sua criação, ainda se dá o ousio de atribuir prémios ‘Honoris Causas’ a figuras polissémicas da História Nacional.
É preciso não esquecer nunca que o Processo de Bolonha é custoso e não se faz com casas de pau-a-pique ou expulsando as nossas crianças das escolinhas para dar lugar a aspirantes à doutores, mas sim com meios e profissionais a altura. Não é necessário fazer-se uma sondagem assente numa amostra com validade estatística para compreender que o processo de Bolonha é uma treta. Não serve para os seus criadores e nunca há-de servir para os seus copiadores.
Por outro lado, o actual sistema da educação não se compagina com os valores académicos. Títulos toda a gente quer ter, poucos é que sabem usar com responsabilidade. Sempre que falo de títulos académicos vem-me à memória o golpe verbal que recebi de um professor universitário em Nampula quando, por lapso, lhe chamei de “ilustre professor” e não, como ele queria, de “professor doutor”. Nunca consigo apagar a imagem daquele professor de Geografia que, na minha apreciação, o tal professor não tinha nada de lente, nada de fenomenal, nada de brilho moral e intelectual, era mais um decorador de livros do que um apreciável investigador.
Ao contrário do professor João Mosca, não me oponho tanto quanto ao número de universidades existentes, até porque elas são necessárias nas áreas rurais e de menor impacto económico.
Sou apologista da criação de institutos politécnicos, de escolas agrárias e de universidades que ensinem o povo a governar. Este governo faz pouco e passa a vida a estragar o pouco que constrói. ‘Kochikuro’ (Obrigado).
PS1: Piratas cibernéticos invadiram, viciaram, sabotaram e bloquearam o meu anterior e-mail. Deixo no entanto aos leitores um novo correio electrónico de um novo provedor, ao que parece, de muito mais SEGURANÇA em relação ao anterior.
PS2: Uma palavra de pesar aos familiares das vítimas do acidente de viação ocorrido no passado dia 29/10 em Nampula. Esperava que o governo decretasse luto nacional em memória dos 18 moçambicanos perecidos nesse acidente. De resto não é atitude surpreendente para mim, porquanto um ex-ministro do Interior - de que estamos lembrados pelas manifestações de 1 e 3 de Setembro - chamou o povo moçambicano de vândalo… Lembram-se dele?
WAMPHULA FAX – 01.11.2010