Está aberto mais um “caso” governamental. O debate de ideias e a liberdade de expressão que o Programa Televisivo “Em Directo” de São de Deus Lima, trouxe a sociedade são-tomense, desde Junho passado foi agora posto em causa pelo governo de Patrice Trovoada.
Para melhor compreensão do leitor, o programa “Em Directo”, da TVS criado pela jornalista São de Deus Lima, após o seu regresso a terra natal, pode ser comparado ao programa de “Entrevista” do canal português RTP que tem como apresentadora a jornalista Judite de Sousa.
O Téla Nón faz tal comparação para que o leitor compreenda a importância do programa em causa no esclarecimento da opinião pública nacional, sobre os mais diversos aspectos do país, mas também pela competência profissional da jornalista são-tomense que não fica atrás da colega portuguesa.
Por isso mesmo desde Junho passado que o “Em Directo”, tornou-se no programa de maior audiência da Televisão São-tomense. Era transmitido semanalmente as quartas – feiras com reposição no sábado. Aliás, a jornalista São de Deus Lima, que estudou jornalismo em Portugal, trabalhou como jornalista no país e ainda na primeira República exerceu cargos de direcção tanto na Rádio Nacional, como na TVS, e na Imprensa Escrita, tendo fundado em 1993 o Jornal “O País Hoje”.
Considerada como estrela da comunicação social são-tomense, através do programa “Em Directo”, São Lima, ressuscitou o debate do contraditório na TVS, que tinha falecido desde a década de 90 quando deixou o país para trabalhar como Jornalista na BBC de Londres. Antes de partir para Londres, era produtora e apresentadora do Programa Televisivo “Clonvessa”, que marcou o debate político, económico e social de São Tomé e Príncipe na década de 90.
Também Licenciada em Estudos Afro-portugueses e Brasileiros pelo king´s College de Londres e mestre em estudos Africanos com espacialização em Governos e Políticas em África, pela School of Oriental and African Studies de Londres, São Lima é também escritora em crescimento tendo já publicado 3 obras literárias que sustentam a cultura são-tomense.
É esta intelectual, reconhecida a nível nacional, e com saber e experiência a nível do jornalismo para transmitir as novas gerações, que o Governo de Patrice Trovoada, já não quer ver mais a demonstrar sua competência profissional na Televisão São-tomense.
O caldo entornou-se na última semana, quando o Governo decidiu proibir a realização da entrevista, que a jornalista já tinha acertado com o antigo Primeiro-ministro de Cabo Verde, Carlos Veiga, e com o aval do Director da TVS, Oscar Medeiros.
São Lima, jornalista independente, sem condições psicológicas para ser apenas um pau mandado, inconformada com a posição do governo, denunciou o facto na crónica que semanalmente escreve para o Téla Nón. «Depois do incidente envolvendo o doutor Carlos Veiga, em que uma entrevista com ele autorizada pelo director da TVS o senhor Oscar Medeiros, foi cancelada a última hora pelo Governo, o incidente aconteceu no dia 2 de Dezembro, e no dia 3 de manhã, as 10 horas, o senhor director da TVS Óscar Medeiros, chamou-me ao seu gabinete para me comunicar que o governo o instruíra a dizer-me que o meu contrato com a TVS que perdurará até 31 de Dezembro não seria renovado», afirmou São Lima.
Sanção pesada do governo que só faz lembrar actuações de regimes ditatoriais. «Perguntei ao senhor Director se lhe tinham sido dadas explicações. Ele disse que não. Perguntei-lhe se na qualidade de director da TVS, não deveria ele saber que razões estavam por detrás desta decisão do governo. Ele disse que não, que não tinha feito qualquer pergunta, e que se limitava a transmitir-me a decisão do governo e a instrução que o governo lhe dera para me transmitir», frisou a jornalista.
No entanto desde 3 de Dezembro que a jornalista da TVS, tinha endereçado ao Director da Televisão, uma carta onde pedia esclarecimento sobre as eventuais implicações deste pré-anúncio governamental sobre as suas funções de jornalista da TVS. A Direcção simplesmente não respondeu a missiva até a data presente.
O despedimento virtual de São Lima, acabou por ficar mais evidente na última segunda – feira. A jornalista já tinha tudo preparado para realizar mais um “Em Directo”, desta vez sob o tema a situação financeira do país. Recebeu aval do Director da Televisão. Contactou os convidados, mas, tudo mudou logo a seguir. «Sou avisada pelo Chefe da Divisão de Programas, o senhor Edson Carvalho que segundo o Director, durante todo o mês de Dezembro estavam cancelados os programas dessa natureza, porque só haveria programas recreativos etc, por causa da quadra festiva», explicou.
Programa cancelado, até 2011 e sem possibilidades de ser retomado. «A quadra festiva termina 31 de Dezembro, o meu contrato termina a 31 de Dezembro, e tendo ele me anunciado que não renovará o meu contrato, quando a televisão retomar os programas suspensos agora, o programa em directo do qual sou apresentadora não irá para o ar porque eu já não estarei vinculada a televisão», sublinhou.
Leitura certa do jogo sorrateiro para a afastar da TVS, São de Deus Lima, considera de extraordinário o facto de a decisão ter partido directamente do Governo. «Eu não sou ministra, não sou directora. Não tenho qualquer função de chefia na televisão.
Sou jornalista e apresento o programa “Em Directo”. Achei extraordinário que tivesse sido o governo a instruir o Director a dizer-me que o meu contrato não seria renovado. Sendo eu jornalista da TVS acho que cabia a ele, o Director, auferir da minha utilidade ou inutilidade para a televisão são-tomense. Achei extraordinário que a decisão não tivesse sido dele mas sim do Governo», pontuou.
A máscara do governo no teatro para matar o programa “Em Directo”, acabou por cair, por causa do contrato de São Lima. Na verdade o contrato diz que é válido por 7 meses e não renovável. No entanto outros 26 trabalhadores da TVS, continuam em actividade e com o mesmo tipo de contrato. Segundo São Lima, só a ela o governo anunciou que não vai renovar o vínculo laboral.
A máscara governamental, estatela-se no chão, quando é sabido que o programa em causa é de maior audiência a nível nacional. Mais ainda, a jornalista em causa é a mais competente que o país já teve. Mais ainda, os governantes sempre dizem que uma das grandes carências da TVS tem a ver com a falta de pessoal formado e capaz. Então porque é que não se renova o contrato com a melhor jornalista do país?
São Lima e outros quadros da TVS que trabalham sob o mesmo tipo de contrato, explicaram ao Téla Nón que o anterior governo decidiu avançar com o contrato válido por apenas 7 meses e sem possibilidades de renovação, porque o executivo anterior pretendia enquadrar todos os que estavam em regime de contrato, a partir de 2011, ou seja, por via da aprovação do orçamento geral do estado para o próximo ano.
Contactado pelo téla Nón a Direcção da TVS recusou prestar qualquer declaração sobre este assunto. Note-se que na estrutura do actual executivo, a pasta da comunicação social, está nas mãos do Ministro Secretário do Governo Afonso Varela.
Abel Veiga
Téla Nón – 08.12.2010