Concessão de grandes extensões de terras aos estrangeiros
Por Raul Senda
O Banco Mundial (BIRD) está a pressionar o governo moçambicano, liderado por Armando Guebuza, no sentido de racionalizar e reformular as politicas de distribuição da terra. Os doadores exigem que o Governo pare com as concessões de Direitos de Uso e Aproveitamento de Terras (DUAT) para produção de bio-combustíveis, plantações florestais, fazendas bravias e outros fins que possam pôr em causa a produção de comida.
O BIRD exige que o executivo de Armando Quanta» adopte, com extrema urgência políticas que assegurem, de forma sustentável o aumento dos rendimentos e da produtividade agrícola.
Sublinha que devido à grande proporção de famílias de agricultores de subsistência que o país possui, o Governo deverá investir na melhoria do uso da terra e na promoção do desenvolvimento rural com vista a garantir um crescimento económico mais inclusivo.
Para o BIRD é inconcebível que nos últimos 15 anos, Moçambique tenha atingido estabilidade macroeconómica e experimentado um crescimento económico notável como é o caso do aumento do acesso aos serviços públicos, educação e saúde mas que as condições de vida da população continuem a deteriorar-se.
O Banco Mundial desafiou abertamente a política de Moçambique de encorajar grandes plantações de investidores estrangeiros em detrimento dos agricultores moçambicanos.
Para o Banco Mundial, a política governamental de concessionar grandes extensões de terras aos investidores estrangeiros para efeitos de produção de bio-combustíveis, plantações florestais entre outras actividades extra-produção de comida poderá pôr o país em perigo deixando a esmagadora maioria da população sem comida.
Para Michel Morris, quadro do Banco Mundial, apostar em pequenas propriedades agrícolas seria uma das melhores formas de garantir o apoio directo aos camponeses e promover o desenvolvimento do sector.
Morris disse que um estudo encomendado pela sua organização concluiu que há pouca evidência que sugira que, em Moçambique, o modelo de agricultura de larga escala seja necessário ou até mesmo promissora que a agricultura liderada por pequenos produtores.
Sublinhou que uma alternativa às grandes plantações estrangeiras seria a agricultura por contrato - machambas mais pequenas de estrangeiros produzindo parcialmente elas próprias mas, comprando a maioria dos produtos aos produtores circunvizinhos (nacionais).
No entender de Morris, as políticas de financiamento que vigoram no país, neste momento não abrem espaço ao desenvolvimento de grandes projectos agrícolas.
É que os projectos agrícolas sobrevivem através dum tratamento privilegiado da parte dos governos nomeadamente a facilitação no acesso à terra, baixos impostos, investimento em infra-estruturas e subsídios.
Marginalização das comunidades
Para o BIRD, o outro problema que resulta das concessões de grandes extensões de terras aos investidores estrangeiros é a marginalização das comunidades. A natureza dos acordos rubricado® entre o governo e os investidores também é muito ambígua.
Sublinha que até agora, os investimentos estrangeiros na produção de bio-combustiveis e plantações florestais em vez de beneficiar as comunidades prejudicam visto que, retiram as terras deixando-as sem espaço para produzir o seu auto-sustento.
Devido a fragilidade fiscalizadora do governo, mesmo em serviços sociais as referidas firmas nada fazem.
Mesmo em termos de infra-estruturas sociais, avança o BIRD, as comunidades têm ganho pouco. O que é oferecido é apenas para conquistar o acordo da comunidade no contrato inicial, mas habitualmente não há nenhuma promessa de continuidade do apoio.
O ganho aparente dessas comunidades é o emprego. Porém, o ordenado não è suficiente para a satisfação das necessidades mínimas.
Dizem que no processo de concessão de extensões de terra para efeitos de exploração, as grandes companhias não olham para os meios para atingir os fins e tudo serve.
São feitas grandes e vagas promessas, particularmente sobre empregos. Os régulos são muitas vezes aliciados com promessas de empregos ou pressionados para apoiar uma proposta que vem de cima.
As comunidades locais continuam a perder e os investidores quase sempre ganham.
Como consequência disso é que quase todos os grandes projectos de investimento causaram conflitos com comunidades e alguns, como a Procana, provocaram, significativa "turbulência social”.
Outros exemplos claros das consequências negativas resultantes da concessão de altas parcelas de terras aos investidores estrangeiros em detrimento dos nacionais estão a verificar-se na província de Niassa.
O BIRD refere que no projecto de plantações florestais denominado Chikweti Floresta onde a população local queixa-se da companhia.
Foram concedidos à Chikweti 30 000 hectares, e estão em processo de concessão mais 14 000 hectares Mas a investigação feita pela Direcção Nacional de Terras e Florestas, diz que a companhia ocupa ilegalmente mais outros 32 000 hectares. A Chikweti está a invadir as terras da população local prometendo compensá-la mas não cumpre com as promessas.
Algumas das terras ilegais foram concedidas á Chikweti por régulos locais sem consultar as comunidades como a lei exige, ou sem terem sido pedidas ao governo central.
Segundo o boletim Informativo da AWEPA, os gestores da Chikweti comportam-se como verdadeiros colonos. Estes compram o régulo, com dinheiro ou empregos para os filhos.
Avança referindo que a Chikweti está a plantar pinheiros e eucaliptos, que são espécies não-nativas de rápido crescimento, e supostamente seriam apenas para utilizar em solos degradados. Mas o estudo da Direcção Nacional de Terras e Florestas diz que, quando negociou o estabelecimento da plantação, a Chikweti disse que iria plantar apenas em áreas marginais mas de facto invadiu a terra agrícola produtiva bem como a terra de pastagens.
A DNTF descobriu também que a Chikweti estava a desbravar a floresta indígena densa para plantar novas árvores.
Procana
No seu estudo denominado Rising Global ínterest in Farmland, o Banco Mundial avança referindo que o desastre da Procana devia ser um aviso acerca de negócios envolvendo grande investimento, cozinhados em segredo.
Segundo o documento a Procana foi uma tentativa da Central Africa Mining para entrar na produção de etanol a partir do açúcar. Na base de ter obtido 30 000 hectares em Massingir, angariou 13 milhões de dólares americanos, mas prometeu investir 500 milhões de dólares (a maior parte deles provenientes de empréstimos).
O projecto não tardou em ficar atolado em problemas. Usava água que os produtores de arroz queriam, tirou terra de camponeses locais, em particular terra de pastagem, e as comunidades locais opunham-se a eles.
Além disso, foi dada à Procana terra que tinha sido reservada para reassentar pessoas que vinham do Parque Transfronteiriço do Limpopo.
A proposta de projecto assumia que a Procana conseguiria elevadas colheitas de cana-de-açucar para transformar e produzir quatro vezes mais etanol que qualquer outro produtor em Moçambique, o que era nitidamente irrealista.
Em dois anos a companhia só abriu 125 hectares e a seguir, em 2009, retirou-se, voltando para o negócio das minas e deixando o governo com uma batata quente nas mãos.
O Banco Mundial reporta que no caso da Procana, embora com poucos benefícios materializados. a população local perdeu acesso à floresta especialmente para lenha, carne de caça e peixe. O investidor usa o abastecimento de água local e as estradas, sem compensação; afecta assim negativamente as mulheres que procuram água.
O Governo
Perante os questionamentos do BIRD o governo de Moçambique justifica-se referindo que sempre esteve comprometido com o modelo dos grandes projectos argumentando que Moçambique precisa de capital estrangeiro, know-how e tecnologia para acelerar a modernização.
Assim, justifica-se o executivo, os grandes projectos são a forma mais rápida de criar empregos, produzir bens para consumo local e gerar recursos para criar mais desenvolvimento.
De acordo com Oldemiro Baloi, ministro dos Negócios Estrangeiros, nunca foi vontade do seu executivo prejudicar a população.
Na verdade o Estado tenta todo custo proteger os direitos existentes das comunidades.
SAVANA – 25.02.2011