Revolução popular
Número é avançado por membro líbio do Tribunal Penal Internacional. ONU estuda "zona de exclusão aérea" para impedir bombardeamentos pelo regime de Khadafi
Os confrontos entre os opositores ao regime de Muammar Khadafi e os seus apoiantes e forças de segurança já terão feito, pelo menos, 10 mil mortos e 50 mil feridos. Os números - balanço entre ontem e 15 de Fevereiro, data em que começou a contestação popular - foram avançados por Sayed al Shanuka, membro líbio do Tribunal Penal Internacional. Em declarações à televisão Al Arabiya, o presidente da Comissão de Justiça e Democracia do tribunal também referiu que "desde que Khadafi chegou ao poder assassinou milhares de pessoas e também milhares de presos". O desmedido número de vítimas mortais é ainda impossível de confirmar. Ontem, médicos dos hospitais de Trípoli, capital, e de Benghazi, segunda maior cidade, falavam em 400 mortos, assim como a ONU. Franco Frattini, ministro dos Negócios Estrangeiros de Itália, dizia que o total de vítimas poderia ultrapassar as mil.
Com a continuidade da repressão violenta dos manifestantes - alumiada anteontem pelo discurso de Muammar Khadafi na televisão, em que o líder pediu aos apoiantes para vingar o seu "líder da Revolução" perseguindo os opositores - começam também a surgir rumores de tentativas do regime para apagar as provas do massacre. O "El País" citava ontem várias testemunhas, líbias e espanholas a viverem no país, que descreviam "corpos a serem levados por forças de segurança" para "aparentes valas comuns". A mesma informação já tinha sido avançada, na terça-feira, ao i por Majede, um estudante de Medicina de Trípoli que garantiu que "ele [Khadafi] quer queimar os corpos para não haver provas". Ontem, o i voltou a tentar contactar o líbio de 27 anos, para saber do seu paradeiro e das investigações de que estará a ser alvo pela polícia por ter "dado guarida a um americano durante uma semana". Mas durante todo o dia, Majede esteve incontactável - na melhor das hipóteses pelas contínuas falhas na rede de comunicações do país.
O passa-palavra na Líbia centra-se agora no poder decrescente de Muammar Khadafi, cujos opositores garantem já ter perdido terreno "desde a fronteira do Egipto até Benghazi". Segundo a AFP, os rebeldes, na sua maioria armados, ocuparam a estrada próxima ao litoral mediterrâneo que vai do Egipto à cidade de Tobruk, que nos últimos dias se juntou a Benghazi como um dos bastiões da revolução. Os populares exibem a bandeira da independência de 1951, anterior ao regime de Khadafi, e cresce a garantia de que o líder caído em desgraça acabará por ceder. Mas o governo continua a fazer finca-pé. Depois de o presidente ter dito ao povo que os manifestantes estão a ser manipulados por líderes religiosos que querem "islamizar" o país, o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Khaled Kaim, garantiu que a al-Qaeda já "estabeleceu um emirado islâmico" em Derna (leste), que estará a ser dirigido por um antigo detido da prisão dos EUA em Guantánamo.
Zona sem voos
Lentamente, Estados Unidos e União Europeia começam a manifestar-se perante os acontecimentos na Líbia. Ontem, Jay Carney, porta--voz da Casa Branca, disse que a violência no país é "completamente inaceitável", adiantando que "várias opções, como sanções, estão a ser avaliadas". Em comunicado, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, também reagiu à "repressão contínua, brutal e sangrenta de civis líbios", que classifica de "revoltante" - sublinhando que "a Comunidade Internacional não pode continuar a ser mera espectadora desta violação maciça dos direitos humanos".
Perante a falta de consenso na União Europeia quanto a possíveis sanções a Khadafi, apenas a ONU fala de medidas práticas para travar as acções do regime. Navi Pillay, alto-comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, confirmou ontem os rumores de bombardeamento dos manifestantes pelo governo líbio, dizendo que existe uma "necessidade imediata" de aumentar a protecção dos civis. Para isso, referiu à Associated Press, a ONU está a estudar a imposição de uma zona de exclusão aérea, que impeça a Força Aérea líbia de utilizar caças e helicópteros contra a população.
Êxodo em massa Sybella Wilkes, porta--voz do Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados, falou ontem na possibilidade de uma crise humanitária na Líbia, dizendo que a organização se está a preparar para um "êxodo significativo" da população para países vizinhos. "É possível que as pessoas usem barcos para chegar à Europa. As opções mais viáveis são através de Tunísia, Egipto e, a norte, por mar. Precisamos de ser flexíveis".
JORNAL I – 24.02.2011
NOTA:
A União Africana, incluindo Moçambique, nada têm a dizer? É triste... para não utilisar outra expressão.
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE