Por Lázaro Mabunda
“A única diferença é que um é Afonso e outro é Daviz, mas o pensamento político, os critérios ou métodos de gestão e de liderança são os mesmos, tal como são os mesmos os apelidos – Dhlakama é Simango e Simango é Dhlakama. Os símbolos do partido também são aves da mesma espécie(...) Daviz tem uma visão localista e provinciana da política”.
Um amigo, moçambicano, ligou-me do estrangeiro, onde se encontra radicado. Pediu-me que lhe explicasse o que estava a acontecer na política moçambicana. Eu Pedi-lhe que fosse concreto: o que quer saber concretamente?
Ele ficou embasbacado e engasgado. Segundos depois, libertou-se do dilema e disse: se alguém te perguntasse o que achava do futuro da democracia moçambicana, o que diria? A minha resposta foi simples e curta: não sei, porque a democracia está em julgamento, após ter sido processada pelos ofendidos – todos os partidos políticos.
Como assim? Quis entender com pormenor, ao que lhe respondi: os partidos políticos processaram a democracia por considerarem que ofende a ganância e os interesses dos seus líderes, além de que é um sistema político criminoso, por defender os direitos humanos, as liberdades de pensamento, de expressão e de imprensa, a transparência, e, acima de tudo, constitui uma ofensa à cultura e aos apetites políticos dos principais actores da nossa política.
Cada resposta que desse, suscitava uma curiosidade ao meu amigo. E a conversa foi-se desenrolando(...). Entendi o seu pensamento, meu caro. Conta-me a história do MDM. O que está a acontecer?
- Ismael Mussá, João Colaço e Dionísio Quelhas demitiram-se por julgarem que a gestão que o seu presidente, Daviz Simango, faz no partido é a mesma que faz no município como presidente. Gestão familiar. Nunca ouviu falar disso? Aqui é muito comum este tipo de gestão. Dizem que está cheio de seus familiares, desde o conselho nacional até à Comissão Política do partido. O mesmo acontece no parlamento, em que o chefe da bancada é seu irmão. Aliás, há uma situação estranha. O secretário geral do partido, ora demissionário, era chefiado pelo seu subordinado, Lutero Simango, irmão mais velho de Daviz. Quer dizer, Mussá mandava nele fora do parlamento e no parlamento ele mandava no seu secretário geral. Curioso não é?
- É, de facto. Agora, que futuro para o MDM?
- O futuro? Não sou profeta, meu amigo, mas acho que terá o mesmo destino que a Renamo. Na verdade, o que está a acontecer no MDM, meu amigo, vou-lhe dar um cheirinho: Daviz Simango e Afonso Dhlakama foram cozidos na mesma panela. Aliás, Daviz bebeu muito da gestão aleatória e ad-hoc de Dhlakama. A única diferença é que um é Afonso e outro é Daviz, mas o pensamento político, os critérios ou métodos de gestão e de liderança são os mesmos, tal como são os mesmos os apelidos – Dhlakama é Simango e Simango é Dhlakama. Os símbolos dos partidos também são aves da mesma espécie: perdiz (galinha do mato, Renamo) e galo (macho da galinha doméstica, MDM). As suas acções e reacções são as mesmas.
- Não entendi, esclareça-me...
- Olha, Daviz não quer alguém que lhe faça sombra no MDM. Ele quer mostrar que é poderoso. Esta é a primeira questão. A segunda é que ele desconfia de todos, até do secretário geral que ele mesmo indicou para votação. Pensa que o secretário geral está feito com a Frelimo. Terceiro, sentiu-se incomodado porque o seu secretário geral questionou o negócio que ele fez com um empresário da praça do ramo automóvel, vendendo-lhe a licença de isenções fiscais de importação de viaturas para sanar a dívida que tinha com o empresário, resultante da importação de viaturas para o processo eleitoral passado. Esta é uma borbulha que vai rebentar, meu. Espera para ver ou ouvir. Continuo. A quarta questão é que Daviz tem uma visão localista e provinciana da política. Quer dizer, para ele, Moçambique é Beira e mais nada. Joga tudo por Beira, esquecendo-se que, da mesma forma que Beira se rebelou contra a Frelimo e contra a Renamo, pode ser da mesma que lhe pode virar as costas. Os beirenses são a população que vive a democracia da verdade. Quando o dirigente “pisa” os seus interesses, eles mudam-no. Quinto: tem uma visão e perspectiva tribalista.
E a Renamo? Onde anda Dhlakama?
- A Renamo anda em “negociações” com a Frelimo. A Frelimo diz que não são negociações, é diálogo. Esta semana, anunciou a manifestação pacífica porque a Frelimo não lhe satisfez as vontades.
- Que vontades?
- Ninguém quer revelar. Está no segredo dos deuses. Acho que é uma questão de sobrevivência. Quando há fome é preciso ameaçar para te ouvirem e te atenderem. Acho que é o que está a acontecer. A ameaça da Renamo é uma letra morta. Eles fazem a mesma coisa quando estão apertados, quando têm interesses superiores aos da nação.
- Dhlakama continua em Nampula?
- Sim, porque é lá onde encontrou a tranquilidade. Morre de amor em Nampula e por Nampula. O coração falou mais que a razão. E para lá foi, abandonando a família, e de lá ninguém lhe tira, por enquanto.
- Então, estamos lixados...
- Não restam dúvidas. O monopólio político da Frelimo parece que, infelizmente, veio para durar séculos. Nem a Renamo nem o MDM são sérios. As suas estratégias são de sobrevivência. Falam de liberdade, mas nunca deixam os seus membros se pronunciarem livremente. Os interesses e apetites políticos condenaram a nossa democracia...
O PAÍS – 22.04.2011