Canal de Correspondência por Adelino Serras Pires
A propósito de termos referido, na nossa edição de segunda-feira última, 25 de Julho de 2011, que no livro «Moçambique 1974: O Fim do Império e o Nascimento da Nação»,
de Fernando Amado Couto, recentemente publicado em Maputo, consta que a FRELIMO assumiu ser responsável pela morte, durante a Luta de Libertação Nacional, em 1973, na operação contra passageiros de avião civil, na cotada de Nhamacala, do Dr. Angel Garabaizal, médico de Francisco Franco, chefe da ditadura franquista, recebemos de Adelino Serras Pires, presentemente a residir na África do Sul, uma carta que passamos a reproduzir na íntegra.
O autor da carta que nos foi enviada, o caçador-guia Adelino Serras Pires, na altura era administrador da SAFRIQUE, proprietária da cotada onde se deu a ocorrência.
Leia na íntegra a carta por nós recebida:
“Ex.mo Senhor Director do Canalmoz
Na edição do dia 25 de Julho do corrente, o jornal que V. Exa dirige faz referência a um livro de publicação recente, no qual vem citado um comunicado de guerra da Frelimo a reclamar responsabilidade pelo ataque contra o acampamento turístico de Nhamacala, ocorrido em 1973. O que o livro relata contém uma série de imprecisões merecedoras dos seguintes reparos:
No dia do ataque, em que morreu o médico de nacionalidade espanhola, dr. Angel Garabaizal, não havia qualquer soldado quer na pista, quer no acampamento de Nhamacala. O acampamento não tinha qualquer função militar, constituindo apenas um meio de promoção do turismo de Moçambique além-fronteiras e de criação de postos de trabalho.
Após a aterragem da avioneta civil na pista de Nhamacala, o primeiro a sair foi o dr. Angel Garabaizal e quando se preparava para fotografar os restantes passageiros a descer da aeronave, foi mortalmente atingido no coração durante uma rajada disparada a partir das bermas da pista, envoltas em capim, a uns escassos 50 metros de distância.
A flagelação feriu ainda dois outros civis, igualmente de nacionalidade espanhola.
O avião foi atingido, mas não ficou destruído, e nem sequer registou-se qualquer incêndio. O piloto e um mecânico dias depois levaram o avião de regresso à Beira.
O caçador-guia da Safrique, de nome Monteiro, respondeu ao ataque, disparando em direcção dos atacantes, pondo-os em fuga.
O comunicado de guerra a que o livro alude confirma que a Frelimo estava ciente de que o alvo que atacou era civil, pois vai ao pormenor de justificar o atentado como forma de “criar contradições do inimigo no seio dos seus amigos”. Torna-se, assim, evidente de que se tratou de um acto premeditado, que teve como consequência a morte de um civil e ferimentos em outros dois.
Estou em crer que os familiares do dr. Angel Garabaizal, perante os factos agora revelados em livro, indicando acto friamente premeditado, agirão da forma que acharem mais conveniente, em salvaguarda dos seus legítimos direitos.
Com a morte de seres humanos, quaisquer que sejam as circunstâncias, não se ironiza, nem mesmo quando se pretende romantizar, perante os leitores, actos abomináveis como o ocorrido em Nhamacala há 38 anos.
Atentamente,
Adelino Serras Pires
Waterkloof, África do Sul, 26 de Julho de 2011”
CANALMOZ – 27.07.20211