A POPULAÇÃO da localidade de Parta, no posto administrativo de Boila-Namitória, interior do distrito de Angoche, província de Nampula, que durante a campanha de produção de arroz se entregaram de corpo e alma à produção, lavrando mais de 100 hectares, para o cultivo deste cereal, estão agora a enfrentar dificuldades de comercialização do produto.
Tudo tem a ver com o preço do arroz, que divide os produtores e os comerciantes. É que segundo soube a nossa reportagem, no local, os agricultores querem comercializar a sua produção por um preço considerado por si mais justo, de 15 meticais o quilograma, contra os anteriores sete com que os comerciantes adquiriram o cereal na campanha passada.
Produtores contactados pela nossa reportagem fincaram pé em não reduzir o preço de 15 meticais o quilo de arroz, por o considerar mais justo, tendo em conta que os sete meticais com que o produto foi vendido na última campanha agrícola não compensam os custos de produção, nem o esforço empreendido.
Malice Castro Samuli é produtor de arroz. Segundo ele, nos dois hectares que nesta campanha lavrou e semeou, conseguiu 80 sacos de arroz de cem quilogramas cada. Mas produzir arroz não é fácil, daí que os produtores decidiram subir o preço. “O trabalho que realizamos na machamba não é compensado se colocarmos a nossa produção no mercado ao preço de sete meticais. Os comerciantes devem entender isso e colaborar”, disse.
“Muitos desses comerciantes intervenientes aproveitam-se da nossa desorganização para nos enganar e comprar o arroz a preços baixos como aconteceu nas anteriores campanhas. Mas desta vez nos organizámos e estipulámos que o preço mínimo é de quinze meticais o quilo. Se eles não quiserem comprar, vamos pilar e consumi-lo”, disse, peremptório, Malice Samuli.
Este agricultor que faz a cultura de arroz em bloco com outros produtores diz que a área disponibilizada pelas autoridades para a produção ainda é extensa e está calculada em 300 hectares. Tem potencial reconhecido para o efeito, devido às suas condições agroclimáticas, mas não é cabalmente explorada por vários motivos que interferem no processo produtivo.
“Para lavrarmos os trezentos hectares com enxada de cabo curto é muito duro, assim solicitámos que nos emprestem um ou dois tractores para fazermos a lavoura. Outra questão que temos a lamentar tem a ver com a construção de uma represa sobre o rio que atravessa a nossa área para a retenção de água para a rega”, anotou Samuli que mesmo assim prometeu continuar a praticar esta cultura.
A maior parte dos produtores de arroz é provedora de sementes que são disponibilizadas pelo sector de agricultura, como é o caso de Calavete Rosca, que afirma ter produzido muito arroz nesta campanha. Ele também entende que nas anteriores campanhas agrícolas os produtores eram injustiçados pelos comerciantes que querem adquirir o produto a preços baixos, para poderem ter lucros fáceis.
“Nós também queremos dinheiro para melhorar as nossas condições de vida com habitações melhoradas, assim como investir na educação dos nossos filhos. As nossas mulheres querem se vestir bem, mas para isso precisamos de dinheiro, que não é o que está a acontecer”, sentenciou Calavete Rosca.
Por seu turno, Virgínia Mário, produtora de arroz em Parta, disse sentir-se satisfeita com os volumes de produção que conseguiu durante a última safra, mas, como mulher, ela apontou a necessidade da construção de uma maternidade por forma a evitar que as mulheres grávidas percorram mais de 30 quilómetros para realizar trabalhos de parto numa maternidade. É assim que ela solicitou às autoridades governamentais para investirem na construção de uma unidade sanitária com maternidade.
São ao todo 199 produtores que na localidade de Parta dedicam-se à produção do arroz e que nesta campanha agrícola produziram pouco mais de 15 toneladas. Aliás, as autoridades do distrito costeiro de Angoche definiram como uma aposta prioritária no âmbito do Programa Acelerado de Produção de Alimentos a produção do arroz. Assim, planeia-se obter 20 mil toneladas daquele cereal, numa área lavrada de 13 mil hectares.
Calavete Rosca
ASSISTÊNCIA TÉCNICA NECESSÁRIA PARA IMPULSIONAR A PRODUÇÃO
O potencial agrícola do distrito de Angoche é inquestionável. Para além da produção do arroz, a zona tem condições agro-ecológicas e climáticas para os camponeses praticarem outras culturas alimentares e de rendimento, como são os casos de amendoim, feijões, mandioca, gergelim e castanha de caju.
Todavia, o distrito de Angoche clama pela presença de técnicos superiores agrónomos com vista a explorar as capacidades de produção existentes, segundo Gonçalves Cabral, supervisor da rede de extensão pública.
“Angoche precisa de mais engenheiros agrónomos para aumentar as suas áreas de produção e produtividade que serviria para alimentar toda a província de Nampula, porque com os extensionistas que possuímos conseguimos assistir uma área de pouco mais de mil hectares. Temos apenas um médico veterinário que igualmente cobre todo o distrito com uma extensão territorial de 2986 quilómetros quadrados”, anotou Gonçalves Cabral.
A nossa reportagem soube também que o distrito possui pouco mais de 4600 camponeses filiados em associações do sector familiar. Estes são assistidos por uma rede de extensionistas constituída por 44 elementos, um número considerado exíguo, tendo em conta o trabalho desenvolvido.
Virgínia Mário
MECANIZAÇÃO AGRÍCOLA E CONSTRUÇÃO DE REPRESAS
Num outro desenvolvimento, o supervisor da rede de extensionistas em Angoche referiu que o sector de agricultura, em coordenação com parceiros e envolvimento das comunidades, vê a mecanização do sector como um factor que pode alavancar o processo produtivo, por isso o executivo do distrito já adquiriu quatro tractores e respectivas alfaias para a lavoura e que foram distribuídos a igual número de postos administrativos, nomeadamente Boila-Namitória, Namaponda, Aúbe e Angoche-Sede.
“Estas máquinas servem os camponeses localizados também nas localidades desde que solicitem a sua utilização, pois foram adquiridos no âmbito do programa de produção de alimentos no distrito. Já realizaram trabalhos nos 181 hectares da localidade de Parta, mil hectares em Aúbe e noutras áreas lavradas para o cultivo de diversas culturas”, explicou Cabral.
Em relação à construção de represas para irrigação dos campos de produção do arroz e culturas da segunda época agrícola, o nosso interlocutor disse que já estão em funcionamento as reservas de Muzoa, no posto administrativo de Aúbe, em Inthothe, em Boila-Namitória e em Nanluco, no posto de Namaponda, para além da represa de Parta que vai ser reabilitada ainda este ano.
Por seu turno, o secretário permanente distrital de Angoche, Raimundo Quinta Iahavunle, referiu que a maior parte do Fundo de Desenvolvimento Distrital foi destinada a projectos referentes à produção de alimentos, facto que incrementou as áreas de cultivo de 40 mutuários, na sua maioria que se dedica à produção agrícola.Para o presente ano, o distrito de Angoche desembolsou deste fundo pouco mais de oito milhões de meticais que, para além da produção agrícola, os beneficiários usaram os fundos para a geração de renda, através da gestão de algumas moageiras e a prática do comércio informal.- Luís Norberto