Decidi hoje escrever sobre a candidatura de Manuel Araújo a presidência do Município de Quelimane nas próximas eleições intercalares, como consequência da “demissão” de Pio Matos.
Mas antes que me atente na análise, gostaria de chamar atenção ao que não irei comentar:
- Este texto não irá comentar o significado das lágrimas por ele vertidas nas câmaras da STV, numa entrevista por ele concedida há dias atrás;
- Este texto não irá comentar as entrevistas por ele dadas aos vários órgãos de informação por achá-las enquadradas dentro da sua estratégia de campanha;
- Este texto não discutirá a estratégia de campanha de Manuel de Araújo.
Manuel de Araújo é de facto um novo penteado na política Moçambicana.
Activista nato, político e académico com créditos firmados, surpreendeu-me e acredito a outros também, ao ter anunciado a sua candidatura pelo MDM. A novidade em mim não é necessariamente da sua candidatura e sim do partido com o qual alinha.
A minha opinião sobre o MDM é publicamente conhecida. Pela forma como conheço o Manuel, dificilmente pensei que pudesse um dia aliar-se ao MDM seja para que missão fosse. Isso, prova mais uma vez que (1) em política vale tudo; (2) nós conhecemos muito pouco os nossos amigos e (3) motivos conjunturais devem ter “empurrado” Manuel Araújo a candidatar-se ao município, avaliadas as condições e possibilidades para a vitória. Mas antes que me alongue nesse ponto, deixe-me por claro três aspectos essenciais:
a) Manuel Araújo é muito grande e importante para uma eleição intercalar, com um mandatinho de dois anos e meio, a avaliar pelo seu plano ambicioso de devolver à dignidade, os quelimanenses que tanto ama. Neste contexto, julgo os seus cálculos enviesados pela pressa e análise imprudente do ambiente político. Na verdade, quem ganha com essa candidatura é o MDM, que usa a imagem do Manuel Araújo para testar a sua popularidade em Quelimane. Assim, as possibilidades de ele maximizar o seu capital político individual – que é enorme, diga-se, serão muito limitadas na medida em que dependerá muito do MDM. Perderá por isso, simpatia de muitos que ele pensa estarem do seu lado, mormente vindos da Renamo, Frelimo e indecisos. Irei com mais acuidade debruçar-me desse ponto mais a frente.
b) Por causa do exposto na aliena anterior, eu preferiria que ele tivesse concorrido como independente, por várias vantagens dai advenientes, nomeadamente a possibilidade de de facto granjear apoios vindos de todos os lados, incluindo do MDM, Renamo, Frelimo, bem como de todos quelimanenses indecisos e não-alinhados. Teria campo para urdir um discurso político muito mais amplo, recorrendo sempre que quisesse, à todo tipo de recursos legitimatórios como o nacionalismo zambeziano, maximizando as suas amizades dentro da Frelimo, Renamo, MDM; buscando alianças com o empresariado local e nacional e internacional; imprensa e sociedade civil, etc.; evitando danos nos seus negócios; ou seja, podia com esses estatuto, manobrar-se como peixe na água em todos meandros locais, nacionais e internacionais.
Sairia mais a ganhar mesmo se tivesse perdido. Com o seu alinhamento, Manuel Araújo fechou muitas portas como aliás se pode provar com a desistência do primeiro-ministro em inaugurar o seu empreendimento avaliado em três milhões de dólares!
Porém, a sua decisão não é tão inocente quanto parece, do meu ponto de vista. É que concorrer como independente implica muitos recursos financeiros, humanos, etc., coisas que, a avaliar pela “urgência”, seriam difíceis de mobilizar em tão pouco tempo. Pelos meus cálculos, ele precisaria mais ou menos de US$ 3000 000, 00 (três milhões de dólares) para organizar uma campanha de 15 dias; e um movimento cívico suficientemente vibrante que num espaço muito reduzido de tempo, nascer e consolidar-se muito antes da data. Assim, concorrer pelo MDM confere a ele o acesso à toda infraestrutura já montada para o efeito. Mas, como se diz em gíria popular, o barato sai ou pode sair-lhe caro.
Pelo que ficou acima exposto, julgo que Manuel de Araújo não se preparou para essas eleições. Ele foi apanhado de surpresa e deixou-se seduzir por possibilidades fugazes.
Mas também, pode ter feito os seus cálculos pós-derrota ou pós vitória. Aliás, em política vale tudo. Volto a esse ponto mais adiante.
Manuel de Araújo pode ser e é de facto dos filhos mais queridos de Quelimane, empreendedor e homem que ama o seu povo. Tudo bem. Tem tudo para ganhar nestas eleições. Pessoalmente preferia que não tivesse concorrido nas intercalares. Ou no mínimo, que o tivesse feito na condição de independente – consciente claro que iria perder – mas com os olhos postos nas próximas eleições municipais, que de certeza Quelimane seria dele. A Zambézia nunca será ganha pelo MDM; dificilmente o MDM poderá levar a Quelimane; mas Manuel de Araújo SIM pode ganhar Quelimane. Concorrendo pelo MDM, complica as suas chances.
Mais uma vez; Manuel de Araújo é grande demais para entrar em contratos de dois anos e meio. Devia era usar essas eleições para testar o terreno. Um milhão e meio de dólares bastava para uma campanha de um independente (e podia ter esse dinheiro tão facilmente); UMA campanha linda, didáctica; limpa, aglutinadora de todas as sensibilidades; uma campanha de esperança que aglutinaria a juventude de todas as sensibilidades em torno de uma figura de
consenso! Uma oportunidade perdida.
Mesmo assim desejo-o boa sorte; e continuo seu amigo – aliás ele não tem como não ser. E como tal continuaremos a nos ajudar e a discutir como sempre fizemos.
Apesar de tudo isso, a candidatura de Manuel de Araújo tem um significado muito importante para a política moçambicana e constitui uma lição para o MDM.
A emergência de jovens intelectuais e intelectuais e académicos economicamente emancipados preocupados pela vida do país é um sinal claro que o futuro deste país não passa pela Pereira do Lago (ou Avenida da Frelimo) e sim por um pensar diferente e alternativo, independentemente da cor partidária. Significa o despertar para um imperativo consciente de repensar Moçambique como comunidade de destino, onde cada cidadão exerce livremente o seu dever e usufrui seus direitos, contribuindo para a construção de um país verdadeiramente livre.
Por outro lado e contrário ao cenário encorajador anteriormente referenciado, a candidatura de Manuel Araújo é prova inequívoca que em Moçambique a política passa pelos partidos políticos ainda. E do lado dos eleitores, a identificação partidária – a ligação entre eleitores a partidos políticos – conta muito. Ou seja, o comportamento político de cidadãos passa necessariamente pela forma como eles se identificam com cada partido! Até parece contraditório, mas Quelimane está mais alinhado com a Renamo e Pio Matos do que com a Frelimo e MDM. Assumir que a desistência da Renamo irá favorecer imediatamente o MDM pode ser fatal. Mas nestas condições, uma candidatura independente pode fazer muita diferença, se se explorar a desilusão pela Frelimo, Renamo e a emergência de uma figura de consenso, alternativa aos partidos políticos. Trata-se de momentos ímpares como os que levou Daviz a
reeleição, se bem que revestido com outras matizes. Em todo caso, conhecendo o Manuel de Araújo, estou convicto que ele tem o melhor plano para contornar isso. Espero que o MDM se supere.
Para concluir, gostava de por claro três aspectos importantes
1- Este artigo não expôs as fragilidades de Manuel de Araújo; aliás não vejo nenhumas. Ele tem muitas chances de fazer história. Para tal, desejo-lhe sucessos.
2- Reafirmo a minha amizade, solidariedade e apoio, caso seja necessário para ajudar que o meu amigo Manuel de Araujo ser feliz nos seus empreendimentos.
3- Esta candidatura é dele e do MDM. E eu não sou do MDM.
Abraços.
Compartilhar. Egídio Vaz
(Recebido por email)