O ANO de 1981 ficou na história do Six Mile, a par do Parque Nacional de Gorongosa (PNG), entre outros locais, constituindo uma das maravilhas turísticas na província de Sofala.
Trata-se do Complexo Turístico de Sengo, geograficamente pertencente ao distrito do Dondo, mas que fica mais próximo da cidade da Beira e que o último conflito armado impossibilitou que o lazer continuasse ali a ser feito.
Na verdade, conforme testemunhámos recentemente e confirmámos junto de algumas personalidades ainda ligadas ao referido complexo, além de destruir praticamente aquilo que eram as infra-estruturas, a guerra também fez com que as principais vias de acesso, nomeadamente Dondo/Sengo e Beira/Sengo, se tornassem praticamente intransitáveis.
Partindo do posto administrativo de Savane, a estrada que dá acesso ao antigo complexo turístico de Sengo está praticamente intransitável, pois ao longo do seu trajecto de pouco mais de 130 quilómetros, para além de capim, todos os pontões desabaram.
Portanto, circula-se com enormes dificuldades, mesmo com carros com tracção às quatro rodas, como aconteceu recentemente durante a visita do governador Carvalho Muária ao local. Outra grande dificuldade verifica-se igualmente a partir do posto administrativo de Nhangau, a 20 quilómetros da cidade da Beira.
À semelhança do que se verifica no trajecto Dondo/Sengo, a via que liga a cidade da Beira, passando por Nhangau, até àquele centro turístico, também transita-se com grandes dificuldades, agravadas pelo facto de ter desabado a ponte sobre o rio Tsawane e destruição de quase todos os aquedutos que existiam na via, situação precipitada pelas chuvas.
Condenado ao isolamento
Se a estrada entre Dondo/Sengo continua sem projecção de reabilitação, a que parte de Nhangau para o local está a beneficiar de restauração, segundo testemunhámos.
Só que, infelizmente, a referida reabilitação foi afectada pelo desabamento da ponte sobre o rio Tsawane, a maior existente naquele troço. O empreiteiro já havia iniciado as obras, mas uma forte corrente de água desequilibrou uma grande parte, quebrando-a quase pelo meio, o que relega, novamente, ao isolamento do ex-complexo turístico de Sengo.
Para se chegar ao local foram feito muitos desvios ao longo da principal via, mas as dificuldades são tão grandes que só os mais ousados transportadores conseguem colocar lá as suas viaturas. Até soubemos que apenas existe uma única carrinha, velha, de marca Mercedes-Benz, que consegue lá chegar, mas de forma muito arriscada. Para já, a maior preocupação do Governo reside na reactivação do turismo nas lindas praias de Sengo, cuja via condiciona seu acesso. Com infra-estruturas completamente em escombros, incluindo o desaparecimento do mapa da então pista de aterragem, devido à guerra, a referida zona turística apresenta-se com uma beleza natural altamente atraente com a abundância de ecossistemas marinhos, faunísticos e florestais. O pescado e marisco completam a longa lista da sua potencialidade natural, entretanto ainda “adormecida”, fundamentalmente pelo actual estado deplorável da estrada.
Para a reactivação de Sengo, nos últimos tempos a administração distrital do Dondo tem vindo a estabelecer diversos encontros com potenciais investidores, bem como com residentes locais, sendo maioritariamente pescadores, camponeses, carvoeiros, pastores de gado bovino, produtores da bebida tradicional (denominada sura), entre outros extractos sociais. A iniciativa do Executivo em reactivar o turismo em Sengo merece acompanhamento e estímulo por parte dos agentes económicos, fundamentalmente locais.
“Mundo” de desagrego
São 11.30 horas de uma terça-feira. A comitiva do governador de Sofala, Carvalho Muária, chega às ruínas do ex-complexo turístico de Sengo. São dezenas de pessoas que estão sentadas sobre algumas ruínas. Afinal, o local serve de paragem dos revendedores ambulantes de peixe que diariamente se cruzam, num vaivém entre a praia de Sengo, Casa Partida e Praia Nova.
Joaquim Paulino e Paulino Simões são dois dentre centenas de compradores e revendedores de peixe que abordámos na circunstância. Disseram que estão neste negócio de peixe há cerca de dois anos. O negócio tem lucro? Tem sim, responderam.
A ida à praia de Sengo, segundo os nossos entrevistados, é feita de várias maneiras, ou seja, pode-se ir de barco, a partir da Praia Nova, ou da Casa Partida, cuja viagem custa 120 meticais. Também pode-se tomar a única carrinha de caixa aberta que faz ligação entre Sengo e Nhangau, pagando 50 meticais.
‘’Quando chove não se vai de carro porque não se passa. A estrada fica intransitável devido à água e lama. Também quando a carrinha está avariada a única alternativa é o barco’’- acrescentaram aqueles revendedores de peixe. Tal como aqueles dois jovens, a nossa Reportagem dialogou com outros revendedores que destacaram a importância da reactivação do ex-complexo turístico de Sengo.
“Se este complexo estivesse aberto o nosso negócio teria mais lucro porque aproveitaríamos os turistas que cá viessem’’- disseram as nossas fontes.
Angústia e esperança
João António Chipeja é um nome que está associado ao ex-complexo turístico de Sengo. Trabalha no local desde 1994. Fala com propriedade sobre o seu trabalho. Diz-se angustiado pelo facto de a guerra ter destruído aquilo que considera de “monumento turístico de grande valor”. Com um olhar que revela profunda tristeza, Chipeje foi quem explicou ao governador Carvalho Muária como funcionava aquele complexo. Disse tê-lo feito com esperança de que, como governante, haveria de tomar decisões que possam (quem sabe?) reactivar, rapidamente, o “monstro” adormecido.
Conta que o Complexo Turístico de Sengo foi erguido no tempo colonial, cuja data não se recorda. Pertencia a um tal português chamado Júlio Apolinário, que era funcionário da Câmara Municipal da Beira, e depois da sua saída do país a gestão passou para a então Indústria Hoteleira.
Volvido algum tempo o Estado entregou a gestão do local a um tal de Coelho, que também não conseguiu gerir da melhor forma, trespassando-o à extinta empresa de safaris, a Safrique que, por sua vez, abandonou-o em 1981, tendo retomado a sua gestão em 1994, para seis anos mais tarde, isto é, em 2001, altura em que fechou as portas, passado à responsabilidade a direcção provincial de Turismo.
O ex-complexo turístico de Sengo era composto por 10 rondáveis, seis de tipo vivenda, um apartamento, igual número de casa para gerência, casa de hóspedes (tipo três), bar, restaurante, cozinha, duas câmaras de frio (uma de choque e outra para a conservação), dois armazéns, central eléctrica, cantina, elevador, três poços com as respectivas motobombas, pista de aterragem e dois balneários.
Garantida a saúde
Se o Complexo Turístico de Sengo ainda continua em ruínas, a verdade, porém, é que os mais de três mil habitantes daquela área já têm garantidos os serviços sanitários de qualidade. Com efeito, foram concluídas o ano passado e entregues este ano as obras de construção de um centro de saúde que vinham sendo desenvolvidas desde 2006, com participação comunitária, da Kulima e do Instituto de Desenvolvimento de Pesca de Pequena Escala (IDPPE), no quadro do Projecto de Pesca Artesanal no Banco de Sofala.
João Massandique, técnico extensionista das Pescas (IDPPE), disse que aqueles serviços servirão basicamente a comunidade local, composta maioritariamente por pescadores, carvoeiros, criadores de gado e camponeses, bem como aos que, caso o complexo seja restaurado, frequentem o local.
“Este centro de saúde, para além de ajudar aos residentes, esperamos que os turistas possam igualmente usufruir dos serviços sanitários sempre que necessário, uma vez que o centro localiza-se a escassos metros do complexo turístico”- explicou aquele extensionista das Pescas.
Para além do centro de saúde, o projecto também integrou a construção de duas casas para enfermeiros.