Segundo Hama Thai
Por Armando Nenane
O tenente-general António Hama Thai, actualmente na reserva e a desempenhar as funções de deputado pela bancada parlamentar da Frelimo, afirmou recentemente que a trágica morte do presidente Samora Machel, a 19 de Outubro de 1986, em Mbuzini, resultou de um golpe de Estado levado a cabo por indivíduos motivados pelo interesse de impor mudanças no regime em vigor até então. Hama Thai referiu-se a interesses externos como sendo uma das principais fontes da instabilidade política em África, mas não deixou de lado a lógica de que um golpe de Estado só é possível com o conluio de forças internas.
Esta é a primeira vez que a morte do presidente Samora Machel é classificada como tendo se tratado de um Golpe de Estado.
As declarações do tenente-general Hama Thai surgem numa altura em que ainda estão por desvendar as reais causas da morte de Samora Machel.
Machel morreu num acidente de aviação, quando o avião presidencial em que seguia se despenhou, na noite de 19 de Outubro de 1986, em Mbuzini, na África do Sul. Desde o primeiro momento que as autoridades moçambicanas falaram em sabotagem e crime ao se referirem às causas que terão levado à queda do avião, que causou a morte de Samora Machel
e de mais 33 elementos da comitiva. A morte de Machel foi atribuída ao então regime do apartheid. Porém, não faltaram vozes que afirmavam que a morte de Machel foi também com o beneplácito de uma mão interna.
Golpe do Estado
Hama Thai definiu golpe de Estado como se tratando de uma acção violenta e rápida para depor o governo do dia, através do assassinato de um presidente, ocupação de infra-estruturas vitais e procura de legitimidade na sociedade.
Regra geral, segundo a fonte, os golpes de Estado são feitos com o apoio dos donos dos interesses, graças ao que se chama de instabilidade política e a relação com os militares. “Quando falamos de golpe, falamos de mudança de poder”, considerou o político.
Para Hama Thai, que falava da “Instabilidade Política em África: Fracasso da Democracia e retorno dos militares à cena política?”, um debate realizado na passada sexta-feira pelo Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais do Instituto Superior de Relações Internacionais, não restam dúvidas que o presidente Samora Machel sofreu um golpe de Estado.
Parco em palavras e sem apresentar muitos detalhes para sustentar a tese do alegado golpe de Estado, o tenente-general referiu apenas que Samora Machel estava rodeado de inimigos que queriam ver mudanças no regime político da época.
Questionado sobre quais as mudanças que terão sido verificadas no regime da época, uma vez que um golpe de Estado implica necessariamente mudanças no governo do dia, o tenente-general na reserva manifestou-se indisponível a ir mais além na sua alocução, tendo-se limitado a afirmar que a alusão ao alegado facto de Samora Machel ter sofrido um golpe de Estado visava apenas enriquecer os seus exemplos sobre o tema em debate.
Para além de se referir à morte de Machel como tendo sido um golpe de Estado, o tenente-general António Hama Thai falou de uma série de golpes de Estado que têm vindo a ser registados em África desde a década de 60, servindo apenas para gerar um clima de instabilidade política no continente. Thai falou de casos de países que mantiveram alguma estabilidade política depois de registarem golpes de Estado, como o caso da Líbia, cujo chefe de Estado, Muammar Khadafi, ascendeu ao poder por essa via.
“Omar Bongo ficou muito tempo no poder, o general Mobotu também. No Zimbábwé, Mugabe continua no poder. As vezes é a própria sociedade que legitima”, frisou. Mesmo assim, Thai reconheceu que os golpes de Estado tendem a gerar um clima de instabilidade política interna nos Estados.
A instabilidade política por que têm passado alguns países africanos devido aos golpes de Estado, segundo o veterano da luta armada de libertação nacional, não são fáceis de se registar em Moçambique, pois, nas suas palavras, o país conseguiu consolidar a ideia de unidade nacional, não havendo situações capazes de gerar intensos conflitos tribais, étnicos ou religiosos, como tem acontecido em muitos desses países.
“Muitas vezes os interesses que geram instabilidade política se escondem por detrás de razões tribais, étnicas ou religiosas”, precisou.
Hama Thai entende que a instabilidade política em África está associada aos interesses externos, mais concretamente do ocidente. Nas suas palavras, os golpes de Estado que têm vindo a ser assistidos em África desde a década de 60 são, maioritariamente, fruto de interesses de mãos estrangeiras que ambicionam os recursos de África, tais como petróleo, ouro, alumínio, diamantes, os quais constituem base de acumulação de capitais e de enriquecimento dos países ocidentais.
Petróleo
Só a Nigéria, é responsável pela produção de cerca de 104 milhões de toneladas anuais de petróleo. Enquanto isso, a Líbia produz 100 milhões, Marrocos, 60 milhões, Argélia, 57 milhões. Por outro lado, estão Gabão, Angola, Tunísia e Congo, que produzem, respectivamente, cerca de 11 milhões, 8 milhões, 7 milhões e 1.9 milhões de toneladas de petróleo por ano.
Para Hama Thai, os países africanos devem evitar que os interesses externos sejam motivo de conflitos internos. Em outros tempos, os interesses externos manifestavam-se através do colonialismo ou do imperialismo, as fases mais avançadas do próprio capitalismo. Hoje, segundo a fonte, os interesses dos antigos colonos ou imperialistas continuam a ser os mesmos, não mudaram. “Basta pensarmos nas companhias majestáticas, onde é que elas estão? Não vale a pena acreditar que elas tenham deixado de se interessar pelos recursos”, considerou.
A recomendação dada por Hama Thai como forma de se evitarem golpes de Estado em África tem a ver com a melhor gestão dos interesses geopolíticos, geoestratégicos e nacionais. No seu entender, a falta de estabilidade político-militar não se circunscreve à falta de homens nem de meios, tem a ver com a interferência de mãos estrangeiras.
SAVANA - 17.07.2009