30 de Setembro é feriado em São Tomé e Príncipe. Inicialmente designado dia da Nacionalização das Roças, a acentuada degradação das mesmas, levou as autoridades a designar o dia como sendo da Reforma Agrária.
36 anos depois do jovem Estado independente a 12 de Julho de 1975, ter decidido nacionalizar todas as roças do país, para pôr fim ao domínio dos colonialistas portugueses, sobre os meios de produção, não há palavras para descrever o nível de degradação das roças de São Tomé e Príncipe.
Degradação social e económica. Dados recolhidos pelo Téla Nón junto ao sector das estatísticas, demonstram o nível da baixa da produção do cacau. Em 1979 as 15 grandes empresas agrícolas de São Tomé e Príncipe, e as suas respectivas dependências, produziram 7489 toneladas de cacau.
Água Izé e as suas dependências destacaram-se com 1006 toneladas de cacau, e Santa Margarida ficou no segundo lugar com 990 toneladas, seguindo-se Agostinho Neto com 902 toneladas.
Com excepção das duas antigas grandes roças da ilha do Príncipe, nomeadamente Sundy e Porto Real que produziram cerca de 200 toneladas de cacau, todas as outras grandes empresas de São Tomé, garantiram em 1979 produção acima de 500 toneladas do principal produto de exportação, o cacau.
Actualmente a produção do cacau a nível nacional não ultrapassa 2 mil toneladas por ano. Baixa da produção e da produtividade com impacto negativo na economia nacional. O pior acabou por acontecer com a distribuição das terras das grandes roças, em pequenos lotes para exploração familiar.
Parte importante das terras, passou a ser matagal. Cacaueiros, que são arbustos se transformaram em árvores, porque os donos de muitos lotes, não têm vontade de trabalhar, ou porque não sabem fazer o devido tratamento de limpeza na planta que produz cacau.
Muitas das terras que eram trabalhadas sob ordens de feitores e capatazes, que definiam as tarefas e as técnicas de tratamento dos cacaueiros, passaram a ser propriedade de muita gente, que não sabe nada da agricultura, e principalmente do tratamento que deve ser dado ao cacaueiro ou ao cafezeiro.
A reforma agrária implementada com maior intensidade nos finais da década de 90, pôs fim a autoridade local nas grandes roças e suas dependências, que na era colonial e ainda nos primeiros anos da independência, funcionavam como um Estado dentro do outro.
Tinham hospitais, creches, morgue, cantinas, oficinas de carpintaria, mecânica, marcenaria, serralharia, água canalizada, energia eléctrica etc…etc.
Estrutura económica e social, que era mantida por responsáveis locais.
Havia pessoal que se encarregava diariamente da limpeza do quintal da roça, do tratamento dos jardins que ficavam cheios de borboletas.
Motivo de muitas brincadeiras de infância de são-tomenses que nasceram na roça.
Havia pocilga de bois, de porcos, muitos cavalos, e muita alegria no terreiro das sanzalas. Tempos em que a televisão não era realidade em São Tomé e Príncipe, e em que o espírito de grupo e de entre ajuda, era fortalecido no seio das crianças que a noite, cantavam e dançavam em roda no terreiro.
Outras vezes ouviam histórias contadas sabiamente pelos mais velhos.
Todos sentavam a volta do mais velho no meio do terreiro, para ouvir histórias e contos de gigantes, de feiticeiras, da esperteza do coelho ou do macaco, ou da sabedoria e paciência da tartaruga. Contos e histórias, que contribuíam para moldar personalidades dignas, tendo em conta o conteúdo sempre rico, na promoção de valores éticos e morais.
Mas tudo acabou, tudo desmoronou. O cenário actual das roças de São Tomé e Príncipe é equiparado a de um lugar que tivesse sido alvo de uma tremenda guerra, com bombardeamentos incessáveis.
Sem autoridade local, o capim invadiu os quintais, as luxuosas residências dos antigos patrões, foram abocanhadas por novos donos, que infelizmente, nada fizeram deixando a arquitectura singular e histórica dos imponentes edifícios, cair aos bocados até se transformar em simples escombro.
A imundice e a pobreza tomaram conta dos habitantes das roças. Santa
Margarida, antiga grande roça, um dos principais centros de desenvolvimento económico da região da Madalena, é um exemplo disso mesmo. Dava emprego a centenas de pessoas daquela região e não só, no sector agrícola, assim como nos serviços de carpintaria, marcenaria etc.
Actualmente tudo desmoronou. Alguns moradores passaram a viver no balneário público da roça. O nível de pobreza é gritante, a insalubridade é insuportável. O poder local de Mé-Zochi, visitou a roça e prometeu tomar medidas para pôr fim a insalubridade.
«Encontramos situações muito constrangedoras em que as pessoas defecam nas valas que passam pelo quintal, enquanto as casas de banho estão a ser utilizadas como habitação. Há necessidade de intervirmos,
retirando as pessoas das casas de banho que ocuparam e aloja-las num outro espaço», declarou Nelson Carvalho, Presidente da autarquia de Mé-Zochi.
Pocilgas de porcos tomaram conta do quintal da roça. Crianças e animais convivem no mesmo espaço. «Vimos pessoas a criarem porcos praticamente nas habitações, junto com crianças. As pessoas terão que desmantelar as pocilgas e recuperar o bairro como era antes», advertiu o Presidente da Câmara de Mé-Zochi.
A autarquia de Mé-Zochi prometeu agir o mais breve possível para sanear o ambiente na sanzala de Santa Margarida e de outras roças do distrito.
Em mais um dia de nacionalização das roças ou da reforma agrária, resta dizer “Santa Margarida e outras roças quem vos viu e quem vos vê”.
Abel Veiga
In http://www.telanon.info/economia/2011/09/30/8617/nacionalizacao-das-rocas-e-a-reforma-agraria/