A talhe de foice
Por Machado da Graça
Nos últimos dias falou-se de batelões. E, claro, não foi por boas razões.
No passado dia 10, feriado municipal de Maputo, muitas foram as pessoas que se deslocaram à praia da Macaneta para passar umas horas de descontracção.
A meio da tarde essas pessoas começaram a regressar a Maputo e os carros foram formando uma enorme bicha na margem norte do Incomati, esperando pelo batelão para atravessar o rio.
Só que o batelão demorava uma imensidão de tempo a fazer cada viagem. O sol foi-se pondo e a noite caiu. A bicha era cada vez maior e o desespero começava a atacar os condutores e as suas famílias.
Chegada a minha vez de embarcar, percebi o porquê daquilo tudo. A tripulação do batelão estava reduzida a uma única pessoa, o sr. Manuel. Essa pessoa conduzia o barco, cobrava os bilhetes e ajudava os carros a entrarem e a sairem do batelão.
E tive pena do sr. Manuel. Pelo tamanho da bicha ele iria ficar a trabalhar, sozinho, grande parte da noite. Uma coisa completamente desumana.
Do batelão de Caia, que se disse que viria apoiar o actual, nunca mais se falou. Ao que parece não há dinheiro para trazer para cá o barco, agora desnecessário, desde a construção da ponte sobre o Zambeze.
E o desenvolvimento de uma importante zona turística e de pesca continua suspenso de uma travessia problemática, constantemente interrompida por avarias mais ou menos prolongadas que, muitas vezes, deixam as pessoas presas no lado norte do rio, sem possibilidade de regressar à capital.
Nesta, três dias depois, afundava na baía a plataforma de embarque de automóveis no ferry que faz a travessia entre a baixa e o distrito urbano da KaTembe. E, devido a isso, as centenas de carros que atravessavam diariamente a baia, passaram a ter que ir dar a volta longa por Boane e Bela Vista. Até quando? Ninguém sabe responder.
Porquê tudo isto, perguntará o leitor.
Porque nos dicionários moçambicanos, aparentemente, não consta a palavra manutenção. Vai-se usando todo o tipo de equipamentos, sem se lhe dar a mais mínima manutenção, até aquilo rebentar, já sem qualquer possibilidade de reparação. Depois é preciso arranjar dinheiro para comprar novo equipamento e recomeçar tudo de novo.
E os anos vão passando, uns a seguir aos outros, as décadas sucedem-se umas às outras e parecemos não aprender esta realidade. E, quando não se aprendem estas coisas, acabamos por ter que sofrer as suas consequências, como está a acontecer agora com os passageiros que pretendem atravessar a baía, tendo que trepar por escadas inseguras, sempre em risco de um acidente grave.
Também destas coisas se fazem os relatórios, de que não gostamos, sobre desenvolvimento humano.
Talvez porque quem pode tomar medidas tem sempre a possibilidade de ir à Catembe de helicóptero…
SAVANA – 18.11.2011