XIPALAPALA
Por João de Sousa
A questão da reforma agrária, que tem sido uma das questões pelas quais se debate o polémico Julius Malema, suspenso do cargo de Presidente da Liga da Juventude do ANC, está longe de encontrar uma solução. Uma ala radical do partido no poder advoga o direito de nacionalizar a terra sem qualquer direito de indemnização aos seus actuais proprietários. Mas se recuarmos a 1994, verificaremos que na altura o programa da reforma agrária assentava em três pilares: redistribuição, restituição e reforma. E em qualquer destes casos, a compensação nunca foi posta em causa.
O projecto da reforma agrária na África do Sul continua a ser tema de debates, por vezes muito acalorados. E o último foi protagonizado pelo líder da Frente Mais, um dos partidos da oposição. Pieter Mulder, que por sinal é vice-ministro da Agricultura.
Ele afirmou perante o Parlamento que “os falantes das línguas bantu não têm o direito histórico de reivindicar 40% da terra do país”.
Acontece que os factos históricos, de acordo com o Dr. David Coplan, professor de Antropologia da Universidade de Witsdwatersrand, provam o contrário. Coplan refere que o pronunciamento do vice-ministro da Agricultura sobre reforma agrária traz à superfície a velha história do mito da terra vazia. Um mito perpetuado pelo regime do apartheid.
O outro lado da moeda aponta para a crítica do analista político Moeletsi Mbeki (irmão mais novo do antigo Presidente Thabo Mbeki), que questiona o ANC e o Governo por ter definido a meta de 30% de redistribuição da terra para os negros, como sendo “um jogo político com o objectivo de ganhar votos”. Só que, mau grado todo o esforço, essa fasquia ainda não foi atingida.
Moeletsi Mbeki considera haver a ideia de que todos os negros querem ser farmeiros, o que, no seu entender, não é verdade. Trabalhar a terra e transformá-la em fonte de produção de alimentos precisa de gente com capacidade e conhecimento.
E precisa também, adianta Moeletsi Mbeki, de dinheiro para investir, coisa que muitos negros, especialmente os da camada média da população, não tem.
O analista político vai mais longe ao afirmar que a ideia de que os brancos são os proprietários da maior fatia de terra existente no país não corresponde à verdade. Em muitos casos eles são apenas os “pontas de lança”, porque os verdadeiros proprietários são as grandes corporações e os bancos.
De acordo com dados oficiais 87% da terra estão nas mãos dos cidadãos de raça branca, enquanto 8% (dos 30% previstos) são propriedade de negros.
Embora o princípio seja o da igualdade de acesso e oportunidades, manda a verdade dizer que o processo de reforma agrária na África do Sul ainda vai dar azo a muitos debates. Segundo alguns analistas locais, não se pretende de forma nenhuma seguir o mau exemplo do Zimbabué nesta matéria, sob risco “de se fazer explodir a botija de gás num ápice”. Mesmo assim, há o receio da nacionalização sem direito a qualquer indemnização, o que leva a que entre 30 e 50 mil agricultores brancos estejam a movimentar-se no sentido de vender as suas propriedades e investir noutros países africanos, com especial incidência em Moçambique, Angola e República Democrática do Congo.
CORREIO DA MANHÃ – 29.02.2012