A CIDADE de Inhambane ainda está na ressaca das eleições intercalares realizadas semana passada e as conversas da esquina, dos cafés e bares, bem como em algumas instituições públicas e privadas, são ainda sobre acontecimentos que caracterizaram o movimento na urbe em vários momentos do processo eleitoral.
Quanto mais a votação se aproximava a adrenalina do próprio movimento eleitoral também ganhava outros contornos e a “Terra da Boa Gente” conhecia outro ambiente, onde a tónica dominante era de pessoas em pequenos grupos entre apoiantes deste e do outro candidato, planificando as estratégias da vitória nas urnas. Alguns se juntavam à noite para cavaqueiras normais, mas tudo balanceado para comentar o decurso da preparação das eleições.
As músicas de campanha de ambos concorrentes só baixavam de intensidade depois das 19.00 horas em quase toda a cidade. Havia boas músicas. Inhambane foi andando assim nas duas últimas semanas. Se calhar foi por causa de algumas mensagens das músicas que a “raiva” se apossou de alguns munícipes para se dirigirem às urnas, escolhendo programas da sua preferência para o tempo que resta para as próximas eleições autárquicas.
Os resultados até agora oficialmente divulgados, penalizam alguns e são motivos de festa para outros. Até porque numa linguagem vulgar, a enxada virou o cabo, ou seja, o feitiço virou contra o feiticeiro, pois enquanto um grupo de apoiantes de uma das duas candidaturas através de músicas de propaganda acusava outros de serem ladrões “Dzi mbafa dzi modhue”, o que significa os ladrões foram apanhados, agora a música virou de feição. Os apoiantes dos ganhadores dizem que o “Gongue wo modue”, ou seja o galo foi apanhado. Bem, são coisas de campanha. Numa disputa, no fim a alegria de uns, é tristeza para outros.
Mas a tónica da minha crónica para esta semana, a última sobre as eleições intercalares, tem a ver com a reflexão das abstenções e votos nulos. Diz-se por aí que os votos nulos aparecem em resultado do alto índice de analfabetismo no país, porque muitas pessoas da terceira idade não sabem colocar sinal no seu candidato de preferência. Nada disso. Para alguns analistas, os votos em branco também pertencem a um grupo de eleitores que chegado na cabina de voto, votar é apenas escolher no seu íntimo e dobrar o boletim e introduzir na urna. Também nem é só isso.
Tanto uma ou outra versão não tem sustentação, pois verifiquei na assembleia de voto instalada na Escola Industrial e Comercial Eduardo Mondlane na mesa número 0987, exactamente onde votou o professor Fernando Amélia Nhaca, o candidato derrotado, um dos três votos nulos encontrados tinha uma mensagem.
A mensagem pelos vistos, não foi de um eleitor analfabeto, é de alguém que sabia o que queria. Acordou de manhã, suportou e bicha e foi à cabina de voto, com seu punho numa caligrafia bem visível, escreveu por baixo dos dois candidatos no boletim de voto, a sua preocupação: “ Onde está Samora?”. Dobrou o boletim e introduziu na urna e estava conciliado consigo mesmo, pois, na sua opinião, fez chegar aos decisores, segundo julga, a sua preocupação.
Naquela mesa, o caderno usado tinha 1104 eleitores e apenas 472 introduziram votos na urna e três votos foram nulos, um dos quais com a mensagem mencionada. Como se pode depreender, o eleitor que no lugar de colocar um X no quadradinho de um dos dois candidatos, encontrou uma oportunidade para falar com os dirigentes e deixou registado a sua mensagem. Ele que não é nenhum louco, não deixou no boletim a sua identificação, mas exprimiu o seu sentimento. “Onde está Samora?” E foi-se embora, feliz com o coração aberto em ter cumprido um dever cívico, dado que votou!
- Victorino Xavier - [email protected]