EDITORIAL
O encontro entre os presidentes Guebuza e Afonso Dhlakama, da Renamo, no último domingo, em Nampula, e as declarações de Guebuza dirigidas aos seus críticos em duas circunstâncias em que mais uma vez nos pareceu que o chefe de
Estado confundiu as suas funções de Presidente da República com as de líder do seu partido – Frelimo –trouxeram à liça algumas questões inquietantes que não poderíamos deixar passar sem comentar.
Comecemos pelo encontro entre os dois ex-beligerantes.
Quando o chefe de Estado recebe um líder de um partido que é simultaneamente o maior partido da oposição parlamentar e esse líder se faz acompanhar de uma força militar com a dimensão que todos vimos pelas imagens televisivas, se o pressuposto inicial do encontro entre Guebuza e Dhlakama alguma vez foi enterrar-se definitivamente o machado de guerra, para o País se tranquilizar, todos ficariam felizes. Mas se tivermos em consideração que o presidente da República também se fez rodear de um aparato de segurança pesado, facilmente se abandona a ideia de que se está no caminho da solução dos ciclos episódicos de violência armada entre os velhos beligerantes. Com o agravante da iniciativa de atacar sempre ter partido do Governo de Guebuza, quer por duas vezes em Marínguè, quer a 08 de Março na chamada capital do norte. E, sem qualquer dificuldade, vemo-nos perante a contingência de estarmos sujeitos a qualquer conluio que permita a ambos encontrarem o trilho ideal para recuperarem as suas respectivas imagens de homens que por mais que o tempo passe não são capazes de abandonar a sua índole militar.
Ambos comandantes-em-chefe de forças que ou se entendem ou não tardará, voltarão a confrontar-se com consequências que seguramente acabarão por levar anos a tratar. Dhlakama teve realmente a seu favor o facto de enfrentar Guebuza com todo o aparato que o partido Frelimo tem constantemente criticado. Conseguiu, inclusivamente, passar a ideia de ser um homem que com todos os seus defeitos, tem pelo menos carácter e não é um hipócrita. Mostra o que é e não esconde o que possui para qualquer eventualidade.
Afinal Moçambique ainda está na mão de beligerantes!…
Indo já para o desespero de Guebuza em fim de mandato como chefe de Estado e como alguém que pretende construir cenários que não lhe reservem um fim triste como aquele por que passou o presidente do Malawi, Guebuza ainda pretende continuidade no X Congresso em Pemba, mas os seus camaradas, como nos induz a conclusão a que chegou Cortês no nosso tema de capa desta edição, não deixarão, muito provavelmente, de levar isso em conta.
E como o ambiente está a ficar na Frelimo de cortar à faca, Guebuza não perde oportunidade para mandar recados: “Vamos continuar a irritá-los!!!”, disse sexta-feira referindo-se aos seus críticos.
É Guebuza imparável. Não perde uma oportunidade para mandar recados “aos de dentro e aos de fora”, como se apressou a dizer Margarida Talapa, em gesto com elevado sentido de oportunidade na continuidade.
Guebuza não deixa de enviar mensagens aos que não concordam com o seu modelo de governação. Já lhes chamou de tudo: “apóstolos da desgraça”, “detractores”, “tagarelas”, “intriguistas”, “preguiçosos”, “marginais”. São, enfim, as suas mais recentes lucubrações. Vocabulário agressivo. Um modus operandi psicadélico, “Raibow Nation” continua a ser um projecto adiado. É difícil entender Mandela?... Sapiência é outra coisa!... Malema, não!
“Guebuza, não! Tudo em que pegou estragou”, remataria Carlos Cardoso. Novos tempos para se construir. Mas, mais do que nos provar o seu estado de desespero, Guebuza dá-nos a mais importante garantia: que ele e a sua turma, afinal, governam para “irritar” os seus críticos e não para desenvolverem o País. “A nossa parte é continuar a irritá-los”, é o que disse o chefe de Estado e está gravado em cassetes vídeos e de voz. Está também registado na imprensa. Certamente que a nós irrita que o País esteja nas mãos de incompetentes.
Irrita-nos também o facto de moçambicanos continuarem a morrer por falta de medicamentos. Irrita-nos o facto de criarem-se oportunidades de negócios privados e outros com o Estado só para a família Guebuza e seus apaniguados. Assim como nos irrita o facto de estar a usar dinheiros dos moçambicanos para “irritá-los”.
Canal de Moçambique – 18.04.2012