Lázaro Mabunda
“De um modo geral, a derrota do candidato do partido Frelimo foi condicionada pelos membros desta formação política, que se fizeram passar por militantes e simpatizantes do mesmo partido, liderados por Pio Augusto Matos, na companhia do Secretariado do Comité da Cidade, de comités de zonas, círculos, vereadores do Município, assim como alguns membros da Assembleia Municipal”, conclusão do relatório da Polícia da República de Moçambique sobre a derrota da Frelimo em Quelimane, publicado no semanário “Canal de Moçambique”, na edição do dia 16 de Maio em curso.
Na verdade, como dizia um amigo, o relatório da Polícia sobre as causas da derrota da Frelimo não é mais do que um pedido de desculpas ao partido Frelimo por não ter conseguido evitar a vitória da oposição.
A nossa Polícia da República de Moçambique produziu – algo incomum – um relatório resultante da investigação sobre as causas da derrota da Frelimo em Quelimane. Trata-se de um relatório produzido pela polícia para o partido Frelimo. Esta é prova inequívoca de que a Frelimo ainda não cortou o seu cordão umbilical às instituições do Estado, servindo-se destas para fins político-partidários. É igualmente prova de que ao nível dos comandos provinciais, até ao Comando Geral da Polícia e do Ministério do Interior, o partido no poder mantém vivas as suas células partidárias.
É interessante saber que a célula do partido Frelimo no Comando Geral da PRM tinha conhecimento de que “Pio Matos corrompeu altas individualidades do comité da cidade, da bancada da Frelimo na Assembleia Municipal e do Comité Provincial” e nomeara, para de secretários permanentes, “os camaradas primeiros secretários de zona sem consentimento do partido, além de que esses secretários passaram a desobedecer orientações emanadas pelo partido Frelimo. No entanto, por ingenuidade ou cobardia, os produtores, redactores ou, se quiserem, autores do relatório não denunciaram ao partido as acções maléficas de Pio Matos que deitariam abaixo todo o esforço e investimentos do partido, esperando fazê-lo após a derrota.
É preocupante saber que uma força policial está filiada a um partido político. Creio que não há coisas mais graves do que a força de segurança pública revelar-se militante de um partido político, num contexto de democracia multipartidária.
Preocupa, também, saber que uma força policial, com vários casos criminais não esclarecidos até aqui, investe todo o seu esforço e meios (do Estado) para investigar as causas de derrota de um partido político de que é simpatizante.
Na verdade, como dizia um amigo, o relatório da Polícia sobre as causas da derrota da Frelimo não é mais do que um pedido de desculpas ao partido Frelimo por não ter conseguido evitar a vitória da oposição. Por outras palavras, é uma penitência por não ter conseguido assegurar a vitória da Frelimo. A partir deste relatório, passa a fazer sentido o argumento da oposição de que as vitórias eleitorais da Frelimo resultam da conjugação de vários factores, dos quais a intimidação dos que se mostram favoráveis à oposição.
Achei indecorosa a queixa do Movimento Democrático de Moçambique de que muitos dos seus simpatizantes não foram votar por intimidação da Polícia. Julguei desculpa de mau pagador. Agora, começo a perceber a dimensão do problema e o papel das forças policiais nos processos eleitorais.
Nesse relatório, há uma revelação importante que mostra que alguns resultados eleitorais são influenciados pelas forças policiais, em coordenação com o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE): “…a sala de operações do gabinete de eleições não funcionou com área de defesa e segurança.” O que os autores do relatório querem dizer é que houve uma descoordenação entre as forças policiais e o gabinete de eleições do STAE, o que facilitou a vitória da oposição.
A derrota em Quelimane não só deixou marcas que parecem prenunciar o futuro, como também não parece, para a Frelimo, um resultado natural, resultante de manifestação de vontade de mudanças dos munícipes de Quelimane. A Frelimo deve saber perder, tal como facilmente sabe ganhar. Da mesma forma que anuncia a retumbância das suas vitórias, deve reconhecer a retumbância das suas derrotas.
O PAÍS – 20.05.2012