Corrupção, ganância e exclusão
A semana passada foi a Embaixada da Suécia em Maputo que confirmou ter endereçado uma carta ao Ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Oldemiro Baloi, a exigir a devolução de mais de 13 milhões de meticais alocados para o desenvolvimento da Província do Niassa, mas que acabaram desviados para fins inconfessos dos governantes, ou seja, para corrupção. Esta semana é o ministro da Planificação e Desenvolvimento, Aiuba Cuereneia, que reconhece ter recebido a carta da Embaixada do Reino dos Países Baixos em Maputo, a anunciar o fim – pelo menos por enquanto – da ajuda directa da Holanda ao Orçamento do Estado de Moçambique. Motivos: também corrupção.
Parece que os doadores estão a começar a acordar para a real situação da corrupção e de aproveitamento da condição no Estado que certos senhores acocorados nele não se cansam de empreender em beneficio pessoal e dos seus entes, menosprezando as necessidades dos outros cidadãos mais carenciados.
Parece que os doadores estão finalmente a compreender o que tem vindo a indignar-nos e a indignar a sociedade civil tanto moçambicana como dos países que sacrificam os seus próprios contribuintes convencidos que a ajuda reverte a favor de quem realmente precisa em Moçambique.
“Água mole em pedra dura tanto dá até que fura!”. O ditado está a confirmar-se. Está-se a confirmar que vale a pena bater constantemente na mesma tecla.
Finalmente os doadores começam a convencer-se que os insaciáveis do regime já sofrem de bulimia. Comem dos fundos do Estado tanto que já não sabem viver de outra forma, salvo honrosas excepções, obviamente.
Parece que alguns Estados que desde há muito “patrocinam” Moçambique, através da ajuda directa ao Orçamento do Estado, estão finalmente a aperceber- se que o enriquecimento precoce dos dirigentes em Moçambique tem afinal origem em esquemas de corrupção à custa do esforço de quem aqui paga imensos impostos, como de quem ajuda Moçambique convencido que está a ajudar o povo moçambicano, os mais carenciados.
Desde 2010 há uma mão cheia de países que anunciaram a redução da ajuda ao Orçamento, para passarem a reforçar o apoio directo aos projectos que beneficiam directamente a população. Estes países começam a acordar e voltam a recuperar a credibilidade perdida com o seu laxismo a pretexto de que em Moçambique estávamos a sair de uma guerra e era preciso criar-se urgentemente uma elite.
Essa elite está aí com todas as características mais reles que se pode encontrar em quem com o discurso nacionalista exacerbado esconde a sua real vocação para a delapidação e extorsão do Estado.
Aos poucos os doadores estão a convencer-se que essa tal elite tornou-se sôfrega e até já perdeu a noção da decência.
A Áustria, Dinamarca, e o Reino Unido já abriram os olhos. A Suécia, a Holanda, a União Europeia parece que finalmente entenderam que a sua estratégia de ajuda estava errada. Em vez de estar a beneficiar o povo moçambicanos os doadores estavam antes a alimentar esquemas corruptos e a alimentar predadores do Estado.
Estão agora a cortar a ajuda ao Orçamento do Estado e a destinar os fundos para apoio directo e mais controlado. Muito nos apraz assinalar esta mudança de atitude.
Os países doadores não se podem deixar levar pelo discurso de que querendo mandar eles próprios no dinheiro da ajuda estão a ingerir-se nos assuntos internos de Moçambique. Esse discurso pretensamente nacionalista não passa de uma estratégia para quem se apoderou do Estado moçambicano não só abusar da fragilidade da sociedade civil nacional como abusar do “bom coração” de outros povos.
A Holanda e a Suécia estão a dar exemplos que devem ser seguidos.
A Suécia sobretudo quer que lhe devolvam o que foi desviado. E devia até dizer que enquanto quem roubou não deixar o Estado não voltam a dar mais nada ao Orçamento a cargo deste governo.
Outros Países devem seguir o mesmo exemplo daqueles que já se aperceberam que este regime no poder em Moçambique continua a satisfazer a sua ganância com corrupção e a promover exclusão social.
A decisão da Holanda de que falamos nesta edição é mais um caso em que depois de uma série de avisos que os doadores já vinham fazendo em relação à corrupção sempre tolerada pelo Governo de Moçambique, finalmente resolveram agir. Já não era sem tempo. Já vem tarde. Mas nunca é tarde para se mudar.
A Inglaterra, Espanha, Bélgica há muito que já tinham optado pela suspensão do apoio directo mantendo apenas apoio sectorial. O que acontece é que, longe de lutar efectivamente contra a corrupção, o Governo foi avançando com discursos paliativos que já não estão a convencer os doadores que se tinham deixado completamente adormecer.
O que indigna os doadores é a vida faustosa que os dirigentes levam muito à custa da corrupção e esquemas enganosos. Isso também indigna os cidadãos moçambicanos que também se vinham indignando com a passividade dos doadores. Mais ainda: com a aparente cumplicidade dos doadores com a corrupção.
O caso dos apartamentos da Vila Olímpica de Zimpeto, tratado nesta edição do Canal de Moçambique, é apenas um exemplo da exclusão e ganância desmedida do regime. Figuras da elite do partido Frelimo – no poder em Moçambique desde a Independência Nacional, não param de fazer do Estado a sua machamba colectiva.
Açambarcam tudo. Agora até apartamentos construídos com dinheiro de crédito que será pago pelos moçambicanos vivos e futuras gerações.
Apartamentos que deviam ajudar a jovens que não têm onde habitar por falta de política de habitação inclusiva, foram concedidos a figuras da nomenklatura que por sua vez passaram a seus familiares directos, numa mensagem clara de que quem não nasceu numa família do regime que espere pela sua vez.
“Quem não dá apoio ao partido Frelimo e quem não concorda ou discorda abertamente pode ter dificuldades de progredir em Moçambique”, diz o historiador Suíço, Professor Dr. Eric Morier-Genoud, em entrevista que o Canal de Moçambique também publica nesta edição.
Já não é novidade para ninguém que em Moçambique só vive quem é do regime e que o regime vive e sobrevive da corrupção.
Da nossa parte diríamos que os doadores demoraram a entender que o dinheiro das contribuições dos seus cidadãos que remetem a Moçambique para ajudar os mais carenciados, apenas ajuda a fomentar corrupção e a alimentar a ganância de quem controla a máquina estatal.
Agora que estão a deixar de ser ceguinhos estão a tomar a decisão certa. Não estão a retirar nem a cortar ajuda, estão sim a cortar e a reduzir ajuda directa ao Governo e a passar a canalizar estes fundos aos moçambicanos.
Só assim se poderá acabar com o paradoxo do Estado moçambicano de que em 2010 falava o alto-comissário de Reino Unido em Maputo, Shaun Cleary:
“Moçambique é um país paradoxal porque, por um lado é um exemplo de sucesso (em termos de crescimento económico), mas, por outro, é ainda um dos países mais pobres do mundo”.
A miséria do povo não pode continuar proporcional à riqueza de quem governa!...
Canal de Moçambique – 25.07.2012