NUMA altura em que aumenta o fluxo migratório para o país, envolvendo cidadãos com os mais diversos interesses em Moçambique, parece-nos oportuno e refrescante o debate sobre a problemática da nacionalidade originária e seu enquadramento legal, desencadeado esta semana na cidade de Inhambane, no Conselho Coordenador do Ministério da Justiça.
Na verdade, Moçambique está a despontar como um destino apetecível para vários interesses, económicos, políticos e sociais, ficando isso a dever-se tanto à estabilidade política que o país vive, quanto ao vasto potencial de recursos que guarda nas suas entranhas. Por outras palavras, Moçambique está na moda.
Não é que isso seja mau para o país, mas entendemos que ele precisa de se preparar para os novos desafios que se anunciam pela crescente apetência que o mundo vai demonstrando em relação a Moçambique.
Trata-se de um assunto de soberania, a questão da nacionalidade precisa de ser encarada com frontalidade e responsabilidade, mas sem animosidades que possam prejudicar a profundidade que se impõe no seu debate.
Ainda bem que o Ministério da Justiça começou a pensar no assunto, e até já avança com ideia claras do que pode e deve ser feito para amortecer o impacto dos fluxos migratórios sobre, nomeadamente a preparação de uma proposta de Lei da Nacionalidade, capaz de criar o necessário ambiente à operacionalização dos comandos que a Constituição da República estabelece relativamente à questão da nacionalidade.
Preocupam-nos os relatos que correm sobre a facilidade com que cidadãos estrangeiros obtêm documentos que os identificam como moçambicanos, por vezes até originários, com todos os riscos que isso representa para a soberania nacional.
Por força da Constituição um moçambicano originário pode se candidatar a cargos de Presidente da República, de Presidente de Município ou Deputado da Assembleia da República, o que quanto a nós chama à atenção para a necessidade de se acautelar tudo o que possa permeabilizar o gozo deste direito.
Quer dizer, é preciso não tratar este assunto com superficialidade, porque pode ter graves implicações no futuro.
Mais do que levantar o debate e até apontar possíveis saídas para o problema, entendemos que é preciso agir-se com celeridade de modo que o Estado se antecipe daqueles que, ostensiva e dolosamente, possam querer tirar proveito da situação.
E temos motivos para nos preocupar quando sabemos que há muitos cidadãos oriundos da Europa, Ásia e de algumas regiões do continente africano que, chegados ao país, conseguem facilmente obter documentos de identificação que os conferem o estatuto de moçambicanos originários.
Sabemos que o conseguem não só os adultos como também crianças, filhas de pai e mãe estrangeiros, que são registadas como moçambicanos originários por via de intrincadas teias de corrupção montadas nas instituições responsáveis pela emissão de documentos de identificação.
Uma das janelas aproveitadas para este efeito são as brigadas móveis de registo e identificação civil que amiúde se movimentam pelo país fora, em acções aparentemente pouco coordenadas entre as instituições com responsabilidade no assunto.
Entendemos, por isso, que é preciso melhorar o controlo deste tipo de campanhas, muitas vezes corporizadas por indivíduos recrutados a nível local, que nem sempre detêm conhecimentos suficientes para garantir a necessária impermeabilidade.
Apesar de reconhecermos que essa pode não ser a solução mágica para o problema, a informatização dos processos de registo civil, criminal e de identificação civil pode ser meio caminho andando para a melhoria do controlo.
Ainda assim, a corrupção manter-se-á como um desafio a enfrentar nos próximos tempos, assumindo que é o Homem quem manipula os processos, sejam eles electrónicos ou analógicos.
Na verdade, foi bom perceber que o Governo reconhece fragilidades no sistema, e que tem clareza sobre o papel que deve exercer no controlo da situação, numa altura em que cresce a tendência dos cidadãos estrangeiros de conseguir meios para permanecer no país.
O que nos parece fundamental reter em tudo isto é a urgência com que todas, e cada uma das entidades com responsabilidade no controlo da situação, devem cumprir a sua parte no processo, para que o país não continue vulnerável à imigração ilegal, e que a nacionalidade moçambicana seja atribuída apenas àqueles que a merecem e a dignificam.