CRÓNICA de: António Nametil Mogovolas de Muatua
“ Pode fazer o favor de nos servir um copo de vinho tinto e outro branco?” disparamos o nosso pedido porque queríamos nos dessedentar do ressequimento da garganta que já nos vinha maltratando há bastante tempo.
A empregada de mesa, polidamente, perguntou-nos, em jeito de resposta ao nosso pedido: “Mas vocês são estrangeiros, não é?”
Ao que o nosso colega “maswazi”, sempre mais extrovertido e, consequentemente, mais brincalhão que o moçambicano e italiano que o acompanhavam, ripostou: “Mas tu és da Migração? Nós queremos somente beber vinho e mais nada!”
A simpática atendente, pacientemente, nos esclareceu que “há um Decreto Presidencial que só autoriza o consumo de bebidas alcoólicas em lugares públicos das 12 às 14 horas e entre as 18,30 e às 23 horas e fora deste horário são severamente punidos com multa os estabelecimentos prevaricadores”. Ante este esclarecimento o bom rapaz do “maswazi” voltou à carga para sugerir que ela nos servisse o vinho em bule e que nós o tamparíamos em chávenas, iludindo deste modo o cumprimento rigoroso do dito decreto. Aqui a moça, educadamente, desculpando-se informou-nos que se assim procedesse corria o risco de ser expulsa do emprego e o seu bar encerrado ou multado.
O rácio habitante/vacas é de um homem para cinquenta reses. O País tem (em 2010) 1,839 Milhões de Habitantes, vivendo 54% da zona rural.
Portanto, há mais vacas que pessoas naquele País da África Austral, membro da SADC e produtor de diamante do melhor quilate do mundo, que, com uma delegação de apenas quatro atletas aos recém-terminados Jogos Olímpicos de Londres, conquistou uma medalha de prata na modalidade dos 800 metros masculinos.
Quando a vaca já é velha, não reproduz, a mesma é sacrificada e a sua carne, que já não é tenra, é fervida em água e sal, desfiada e servida como um dos pratos nacionais muito procurados no País. Esta iguaria chama-se “sesswaa”, que também pode ser preparada com carne de impala. Nos hotéis e restaurantes daquele País a culinária nacional e internacional são postos, normalmente, nos respectivos menus, ficando ao critério dos clientes a escolha do que pretendem consumir.
Aquilo que o povo come no seu dia-a-dia em sua casa é, naturalmente, disponibilizado nas casas de pasto formais e informais. Diferentemente do que acontece, infelizmente, em muitos países, o prato nacional não é discriminado nos hotéis e restaurantes.
Falamos do Botswana, País de solos áridos e de clima tropical quase agreste, carente em recursos hídricos (aliás os órgãos de comunicação social passam, amiúde, um spot propagandístico apelando às pessoas a usarem a água com muita parcimónia), mas nem por isso deixa de ser um dos maiores exportadores de carne bovina de alta qualidade para o exigente mercado da União Europeia e cujo ambiente macroeconómico é caracterizado por estabilidade quase permanente.
Há um património intangível de grande valia que influencia positivamente o País na sua totalidade, que é a educação. Esta, que tem uma vertente profissionalizante muito acentuada, é gratuita em todos os níveis – desde o primário até à pós-graduação universitária, mesmo aquela complementada no estrangeiro – porque o Estado paga tudo. Quisemos saber quando é que cidadão reembolsa ao Estado pelos custos da educação ao que nos responderam que o Povo paga adiantadamente através dos impostos a que ninguém se furta em cumprir esta obrigação cívica e nacional. Portanto, a educação gratuita é uma das contrapartidas que o Estado dá ao cidadão por este honrar as suas obrigações para com o fisco.
Para melhor ilustrar o que nos dissera acerca do “edifício” da educação no Botswana, o nosso cicerone levou-nos a visitar a cidade universitária, vulgo Campus. O que nos foi dado a ver foi a implementação no terreno da vontade de um povo romper com as grilhetas da miséria apostando na educação para todos e a longo prazo. O professor primário ganha o equivalente a 3 (Três) Mil Dólares dos Estados Unidos da América por mês, porquanto se acredita que nesta fase etária é quando o sistema educacional nacional deve semear na fresca mente da criança os alicerces para boa aprendizagem posterior dos conhecimentos científicos e técnicos bem como dos valores socialmente válidos para o bom convívio na comunidade, no País e no Mundo. Em 1993, 78,9% (taxa de alfabetização) da população sabia escrever, ler e entender em uma de ambas as línguas oficiais do País – o inglês e o setswana.
O Botswana, que ocupa uma área de 582.000 Quilómetros Quadrados, ficou independente no dia 30 de Setembro de 1966, adoptou o regime de República cujo Chefe do Estado e do Governo é o Presidente da República (actualmente é o Tenente General Sereste KhamaIanKhama), tem a Capital em Gaborone (em português escreve-se Gaberone), produz, também, cobre, níquel e tem uma invejável fauna bravia mediante a qual, a par da hotelaria, desenvolve uma indústria turística de qualidade e padrão internacional elevados. A sua moeda nacional, é o Pula (1 USD$ = 6,8 Pulas). O PIB (Produto Interno Bruto) era em 2010 de 15 Biliões de Dólares dos Estados Unidos da América e que cresce à taxa anual de 7,2%, sendo o PIB per capita, naquele mesmo ano, de 5 Mil Dólares Americanos dos Estados Unidos da América. A sua taxa de inflação anual é de apenas um dígito (7%).
É um país politicamente estável em que o desemprego é tendencialmente nulo e com este rosário de bem-estar expresso pelos indicadores acima enumerados, não é de admirar que a segurança e tranquilidade públicas sejam constantes dia e noite. A título de exemplo, se alguém perde um celular, o transeunte que o achar leva-o à polícia e esta cuida de localizar o seu proprietário.
Os transportes públicos funcionam com invejável eficiência ainda não atingida por muitos ditos países desenvolvidos do chamado primeiro mundo.
Não é sem razão que os nativos auto-intitularam o Botswana de “The Proud of Africa” (o orgulho de África).
Bem hajam as pessoas do Botswana e que o sempre bom Deus continue a iluminar com muita sabedoria a sua liderança.
Marracuene, na FACIM, 29 de Agosto de 2012
WAMPHULA FAX – 30.08.2012