"Desde quando é que um prato de lulas custa 400 meticais?" (cerca de 12 euros), perguntava, sem sucesso, o único "paisano" num mar de camisetas, bonés e lenços da Frelimo, na praia urbana do Wimby.
À noite, num restaurante mais seleto, junto do porto, repleto de ministros, gestores públicos, jornalistas e assessores, os vinhos sul-africanos e portugueses eram vendidos a partir de 500 meticais mas arranjar mesa era quase tão difícil como um oponente interno de Armando Guebuza ser eleito para o comité central.
O X Congresso da Frelimo, partido no poder em Moçambique desde a independência, em 1975, é o congresso de Armando Guebuza, da sua re-consagração partidária, apesar de dentro de meses abandonar a chefia de Estado. Ou, talvez, por isso mesmo.
Hoje, no dia do arranque do congresso, o semanário Domingo não poupava nas palavras para descrever o candidato, sem adversário, à sua sucessão na Frelimo: "Homem de negócios brilhante, líder político pragmático, para gáudio das bases do partido que nunca se sentiram esquecidas", lia-se no editorial do jornal detido pelo Banco de Moçambique.
E Guebuza voltou, hoje, a sorrir às bases quando assegurou que os militantes não eleitos para o congresso são tão bons ou melhores do que os delegados ali presentes e, depois, teve um momento inolvidável de propaganda do tipo comunista asiático, quando garantiu que "até há machambas (hortas) que levam o nome do X Congresso".
Se o estilo poderá recordar a Coreia do Norte, a realidade é, porém, outra. O Blackberry é o telemóvel preferido dos delegados e a entrada no recinto dos continuadores (como a Frelimo chama aos pioneiros) foi filmada por dezenas de gadgets, tablets e outros acessórios que custam mais de 10 ordenados mínimos nacionais.
Frente de libertação, partido marxista-leninista, organização empresarial, por quase tudo já passou a Frelimo, num processo de contradições visível nos convidados estrangeiros que torram sob o sol de Pemba.
Na cidade está presente o núcleo duro do comunismo internacional, com os partidos no poder na China, Coreia do Norte, Cuba e Vietname, assim como o Partido Comunista do Brasil, mas que, como disse à Lusa o seu dirigente Ronaldo Carmona, está no governo, não no poder.
No entanto, foi para Mari Alkatiri, da Fretilin e que viveu em Moçambique durante a invasão indonésia de Timor-Leste, a ovação da manhã, e isto depois de dois conservadores, o representante do PLD japonês e do PSD português, terem sido nomeados como "camaradas" pelo presidente da Frelimo.
Um epíteto a que Nuno Morais Sarmento (o representante do PS é Jorge Fão) está habituado, porque, disse à Lusa, este é o terceiro congresso da Frelimo a que assiste, a que se soma, quatro do MPLA.
Lusa - 23.09.2012