Pela sua relevãncia destaco:
Penso que Afonso Dhlakama tem razão em descartar certas das coisas que o Bispo emérito da Beira disse, mas penso que ele teria feito melhor se não tivesse descrito Jaime Gonçalves como "burro e Satanás."
Jaime Gonçalves deu a entender que ele foi o iniciador do processo da paz. Sim ou não? Sabe se porem que a Igreja católica ou os seus bispos vinham se lamentando abertamente da catástrofe da guerra civil, apelando para o fim da guerra. Machel veio depois a fazer discursos nos quais faltava respeito aos bispos católicos de Moçambique que ele acusou de ter dito ao seu governo para negociar com a Renamo que ele apelidou de "javalis e porcos do mato" num discurso que fez em princípios dos anos 1980 em Chibuto, Gaza, e que foi depois radiodifundo nas antenas da Radio de Maputo.
Em princípios dos anos 1980 houve contactos entre a Frelimo e a Renamo em Pretoria que não tiveram nenhuns resultados e depois seguiu um silêncio durante o qual o Magarila morreu em Mbuzini na Africa do Sul.
Apesar de Joaquim Chissano não querer admitir publicamente que foi ele que incentivou o processo final depois da morte do Magarila, factos indicam que foi ele que impulsionou o processo adormecido por se ter visto derrotado. Armando Panguene, antigo embaixador de Moçambique para o Estados Unidos e o Canada, declarou a um grupo de diasporinos no Canada que "a paz foi possível visto que o presidente Chissano decidiu fazer a paz enquanto alguns não queriam que se negociasse com a Renamo".
Sabe-se porem que um dos que não queriam que se negociasse era o Marcelino dos Santos que exigia que se lutasse contra a Renamo até a vitoria final contra o bandidos armados. Marcelino dos Santos vivia num mundo desligado da realidade que enfrentava a Frelimo e Joaquim Chissano como presidente.
Bethuel Kiplagat, secretario permanente do ministério dos negócios do Kenya, confirmou que Artur Lambo Vilanculos foi o primeiro a pedir ao governo do Kenya que interviesse para acabar com a guerra civil. Kiplagat disse que o governo do Kenya descartou o pedido do Vilanculos, vincando que o governo do Kenya não queria se ver ligado com a Africa do Sul por causa das ligações da Renamo como o regime do apartheid.
Kiplagat adiantou depois que num encontro de dirigentes africanos "Chissano aproximou-se do presidente Daniel arap Moi e pediu-lhe que interviesse e lhe ajudasse a estabelecer contactos com a Renamo porque ele queria negociar com eles." Kiplagat disse que Moi não levou a sério o pedido formulado por Chisssano. Foi somente depois do Chissano repetir o pedido a Moi numa outra reunião de dirigentes africanos que Moi decidiu tomar as coisas a sério visto que ele, Moi, via-se entristecido com o sofrimento do povo de Moçambique.
Moi então encarregou a Kiplagat a tarefa de estabelecer os contactos com a Renamo. Enquanto Kiplagat ia conferir com Chissano em Maputo, faltava a ligação com a Renamo. Alguém sabia que eu tinha uma ligação no Malawi e já tinha entrado nas zonas da Renamo.
Foi assim que um em 1988 recebi chamadas telefónicas do Alto comissariado do Kenya em Ottawa, pedindo que eu fosse a Kenya, onde tinha vivido por 17 anos e onde na verdade cresci. Não sabendo do que se tratava, eu queria recusar, mas decidi-me aventurar visto que conhecia o Kenya. Fui a Kenya e depois regressei para la mais vezes para ir a Renamo antes de la ir com Kiplagat onde Kiplagat transmitiu a mensagem do Chissano que exigia que a Renamo aceitasse uma amnistia para ser integrada na sociedade moçambicana.
A delegação da Renamo que representava Dhlakama depois de ter marchando por oito dias de Gorongosa a Chire repudiou a mensagem como uma "brincadeira do Chissano." Na verdade o líder da delegação disse: "Chissano esta a brincar muito connosco." Durantes aqueles discussões entre Kiplagat e a delegação, os delegados transmitiam tudo a Dhlakama via radio transmissora e Dhlakama logo dava respostas.
O meu papel era de tradutor visto que Kiplagat nao falava português e os homens da Renamo também não falavam o inglês. Eu não era parte daquelas conversas. Só traduzir e interpretar. Não joguei o papel negocial e nem gostaria de fazê-lo. Já tinha decidido me desligar de Moçambique e dos seus assuntos e viver a minha vida no meu novo pais.
Durante aquela discussão Kiplagat disse a delegação de Dhlakama que na semana seguinte iria a Maputo para transmitir a posição da Renamo a Chissano. Assim aberta a via para a Renamo, depois daquela viagem Kiplagat ia a Moçambique para encontros com a Renamo sem precisar de mim.
De regresso a Nairobi, foi que me encontrei com a delegação dos religiosos que incluíam o cardeal Alexandre Maria dos Santos, o arcebispo Jaime Gonçalves pelo lado dos católicos e membros do Conselho cristão que incluíam o bispo anglicano Dinis Singulane e outros. A parte mais memorável do meu encontro com os tais religiosos foi a viagem que o governo kenyano arranjou para irmos ao Rift Valley e ao Lago Nakuru onde vimos milhares de flamingos e animais. Comemos no Nakuru Resort, um restaurante na reserva que se acede por caro somente.
O próprio Dhlakama não disse que Jaime Gonçalves não foi ter com ele, mas o líder da Renamo insurge-se contra as alegações do arcebispo segundo as quais foi o Dhlakama que iniciou o processo visto que Dhlakama se via desesperado visto que ele e os seus colegas sofriam muito e comiam lagartixas. Esta de lagartixas, o Jaime parece ter inventado. A falta de comida não era o problema principal nas zonas da Renamo visto que o povo vivendo em liberdade produzia muito para se manter e para apoiar a guerrilha. Dhlakama comia bem e viajava de motorizada com uma forte escolta de homens armados aos dentes também em motorizadas.
Dhlakama
não comia lagartixas. Duvido muito se alguém comia lagartixas. Cada vez que
estive com ele e comi com ele na Zambézia ou em Sofala, comemos bem e as vezes
havia vinho, o que era um pouco surrealistico.
Aquele foi o papel que joguei e nada mais.
Francisco Nota Moisés
(21.10.2012)
Recorde aqui vários vídeos sobre a RENAMO: