JOÃO MANUEL ROCHA
É a primeira vez que representantes da comunidade lusófona contactam formalmente com golpistas de Abril.
A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) integra uma missão internacional enviada a Bissau para, a partir de domingo e durante cinco dias, avaliar a situação no país, oito meses após um golpe de Estado que afastou o Governo eleito.
É a primeira vez que representantes da CPLP, que condena o golpe, estarão em diálogo directo com o poder instaurado pelos militares que, a 12 de Abril, derrubaram o Governo do primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior. Mas isso não significa que tenha alterado a sua posição, disse o novo secretário executivo da comunidade lusófona, o moçambicano Murade Murargy, numa entrevista a publicar no domingo, na edição impressa do PÚBLICO.
"A nossa presença na Guiné-Bissau não significa, temos deixado isso bem claro, que reconhecemos aquele Governo", afirmou. "O que a CPLP quer é defender os interesses dos guineenses, não queremos interferir no processo, queremos é que eles se entendam."
A missão internacional é coordenada pela União Africana e integra também senior officials (altos funcionários) da CPLP, da CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) - que reconhece o poder instaurado após o golpe e tem uma força militar no país -, das Nações Unidas e da União Europeia.
A possibilidade de envio da missão começou a ser discutida em Setembro, em Nova Iorque, durante a última Assembleia Geral das Nações Unidas, num encontro entre Murargy e a CEDEAO.
"Eles descreveram a situação como estável. Tudo era normal, tudo funcionava, tudo estava muito bem. [E disseram:] Se quiserem, podem ir lá verificar. Podemos fazer uma missão para vocês in loco. E eu disse: Ok, vamos fazer uma missão conjunta", disse Murargy.
Depois de outros contactos e encontros, realizou-se uma reunião em Addis Abeba, onde os termos da missão e a data foram definidos. Chegou a estar previsto um encontro na capital da Etiópia entre delegações do Governo afastado pelos militares em Abril e representantes do poder pós-golpe, que acabaram por não comparecer.
O objectivo da visita dos próximos dias é "avaliar a situação [em matéria] de segurança e definir um calendário para restituir a Guiné-Bissau à estabilidade", disse o secretário executivo. Estão previstos encontros com representantes do executivo de transição, comissão de eleições, procurador geral, organizações internacionais que trabalham na Guiné-Bissau, embaixadores, partidos, militares e outras entidades guineenses. O poder instaurado pelo golpe que derrubou o Governo de Gomes Júnior anunciou em Abril que seriam realizadas eleições após um período de um ano. Gomes Júnior (agora a viver em Portugal) venceu a primeira volta das presidenciais deste ano. A segunda volta não se realizou, devido ao golpe liderado pelo general António Indjai.
PÚBLICO(Lisboa) – 15.12.2012