Peguemos na primeira alegada reclamação: Haverá falta de debate na FRELIMO? Creio que não. A mim me parece que o tipo e a qualidade de debate é que se alteraram. Nos primeiros anos da independência, por razões históricas, políticas e ideológicas, uma meia dúzia de indivíduos, genericamente coincidente com a grande maioria dos históricos actualmente zangados, monopolizava o debate nacional, ao ponto de até alguns dos seus discursos públicos se transformarem em lei ou prática protocolar. Esta meia dúzia de indivíduos rodeava o Presidente da República e cerrava o círculo para que mais ninguém tivesse acesso ao Marechal (será que os Presos Políticos, alguns com o quinto ou com o sétimo ano dos liceus, foram mesmo traidores da Pátria para merecerem aquela humilhação ou era uma forma deste grupo afastar potenciais concorrentes?).
Este grupo era o que também identificava os temas de debate. Determinava antecipadamente as conclusões do debate (e ai de quem dissentisse!). Esta meia dúzia de históricos ensinava como essas conclusões do debate se adequavam à solução dos problemas do povo. Provavelmente o país não tivesse muitos quadros naquela altura (será verdade?). Os órgãos de comunicação não passavam de cinco, todos ferreamente controlados e massivamente povoados por seus aliados, de modo a papaguear os problemas e soluções determinados pela meia dúzia de históricos que rodeavam o Presidente e que também dirigiam, através dos seus aliados as instituições públicas, sem deixar lugar para mais niguém alegando falta de quadros.
Não era só o controlo do debate. Era também o esforço titânico de agradar e de engrachar o Marechal. Alguns, neste seu escovismo chegavam a dar nomes africanos e de heróis da resistência aos seus filhos, falando português com sotaque maconde e hoje têm o desplante de acusar de lambe-botas os que mostram lealdade ao Presidente Guebuza. São os mesmos que criticam a transmissão televisiva do septuagésimo aniversário do Presidente Guebuza mas esquecem-se do seu papel preponderante nas celebrações dos 50 anos do Presidente Samora Machel transmitidas em directo pela Rádio Moçambique: um deles, em plenas instalações da Assembleia da República, onde decorreu a cerimónia, e não Ponta Vermelha como foi o caso da do Presidente Guebuza, chegou a oferecer uma casa ao Marechal na Província onde era Governador!
Voltando à questão do debate, hoje o país tem milhares de quadros que, livres do sufoco e do condicionamento dos históricos, participam de diversas formas no diálogo nacional. Fazem-no através de dezenas de meios de comunicação plurais na sua forma e conteúdos. Fazem-no através de várias plataformas virtuais, nas quais o país é analisado e dissecado. Fazem-no através de uma miríade de organizações da sociedade civil. Fazem-no através de um Parlamento multipartidário. Fazem-no através de dezenas de Partidos políticos, alguns dos quais presentes nas várias autarquias instituídas no país. Fazem-no através das presidências abertas e inclusivas e outras formas de governação aberta. Ou seja, hoje o país possui muitas plataformas de diálogo e todas elas concorrem para configurar o Moçambique que todos nós queremos. Não é mais uma meia dúzia de indivíduos que sabe onde mora a felicidade da nação e para lá a querem conduzir com a política da unanimidade que esses históricos, que hoje reclamam, haviam instituído. Os que governam a nação têm a obrigação de estar atentos a esta diversidade de formas de diálogo para que o futuro de Moçambique possa ser resultado de todas estas formas de o pensar e não apenas ouvir meia dúzia de indivíduos. Mesmo que se diga que o debate que se reclama é interno, dentro da FRELIMO, estas considerações são validas. Lá também há milhares de quadros que no passado eram sufocados e limitados a bater palmas e a votar a favor do que propunham esses históricos hoje maldizentes.
Em relação à outra reclamação destes históricos: é demagogia e má-fé veicular a ideia de que as calamidades naturais e, em especial, as cheias, resultam de imprevidência de qualquer natureza. Muito mais quando se alega que, da mesma forma que se conseguiu o financiamento para a Circular de Maputo, se deveria conseguir, com a mesma facilidade, os financiamentos necessários para as Barragens de Bué Maria, Moamba Major e de Mapai. Neste caso, escamoteia-se o facto de a Circular de Maputo e a Ponte da Katembe serem projectos eminentemente comerciais, com portagens, que vão gerar rendimentos susceptíveis de garantir o reembolso dos financiamentos concedidos. Este tipo de projectos é perfeitamente bancável, pois os mercados financeiros sentem uma natural propensão para, neles, colocar o seu dinheiro, dada a elevada probabilidade de estes projectos gerarem o dinheiro necessário para reembolsar os créditos concedidos. Em contrapartida, barragens de controlo de cheias são projectos eminentemente sociais que, em princípio, não geram qualquer tipo de receitas.
Em caso de empréstimos, estes devem ser pagos pela economia nacional, no seu todo, e não pelas barragens. Assim, os financiadores deste tipo de empreendimentos só libertam o dinheiro após a avaliação positiva da capacidade da economia, no seu todo, de o reembolsar. Toda esta explicação é dada para mostrar que a falta de barragens e as consequentes cheias não se devem a qualquer imprevidência. Devem-se, sim, à dificuldade de obter os necessários financiamentos.
Mesmo nas cidades! Pode ser que, nos últimos tempos, se verifique alguma gestão irregular do solo urbano. Todavia, não é essa deficiente e recente ocupação que causa problemas nas nossas urbes. É, sim, o processo migratório campo-cidade caótico, que ocorreu entre meados da década 80 e princípios da década 90, do século passado, derivado da guerra de desestabilização.
Este texto já vai longo. Não vou-me ocupar da questão de má distribuição da riqueza nacional ou do crescimento das desigualdades sociais. Prometo fazê-lo em próxima ocasião. Todavia, tenho para mim que se os nossos históricos insistirem em simplificar e caricaturizar os problemas nacionais, apenas com o intuito de obter aplausos fáceis, correm o risco de atraír uma multidão de pagãos, como aquela que acorria, para lá na minha aldeia, assistir a Ngalanga do Evangelista. E, como me dei conta na minha infância, esses aplausos são falsos, são irónicos, destinam-se apenas a ridicularizar indivíduos que, no passado, eram vigorosos férreos e fervorosos pregadores da disciplina partidária. São aplausos para mostrar como dança, hoje, o evangelista que, num passado recente pregava, em êxtase, o unanismo e tinha descoberto um inferno conveniente para os que ousavam dissentir.
Históricos da FRELIMO à procura de aplausos fáceis (fim)
Voltando à questão do debate, hoje o país tem milhares de quadros que, livres do sufoco e do condicionamento dos históricos, participam de diversas formas no diálogo nacional. Fazem-no
através de dezenas de meios de comunicação plurais na sua forma e conteúdos. Fazem-no através de várias plataformas virtuais, nas quais o país é analisado e dissecado. Fazem-no através de uma miríade de organizações da sociedade civil. Fazem-no através de um Parlamento multipartidário. Fazem-no através de dezenas de Partidos políticos, alguns dos quais presentes nas várias autarquias instituídas no país. Fazem-no através das presidências abertas e inclusivas e outras formas de governação aberta. Ou seja, hoje o país possui muitas plataformas de diálogo e todas elas concorrem para configurar o Moçambique que todos nós queremos. Não é mais uma meia dúzia de indivíduos que sabe onde mora a felicidade da nação e para lá a querem conduzir com a política da unanimidade que esses históricos, que hoje reclamam, haviam instituído. Os que governam a nação têm a obrigação de estar atentos a esta diversidade de formas de diálogo para que o futuro de Moçambique possa ser resultado de todas estas formas de o pensar e não apenas ouvir meia dúzia de indivíduos. Mesmo que se diga que o debate que se reclama é interno, dentro da FRELIMO, estas considerações são validas. Lá também há milhares de quadros que no passado eram sufocados e limitados a bater palmas e a votar a favor do que propunham esses históricos hoje maldizentes.
Em relação à outra reclamação destes históricos: é demagogia e má-fé veicular a ideia de que as calamidades naturais e, em especial, as cheias, resultam de imprevidência de qualquer natureza. Muito mais quando se alega que, da mesma forma que se conseguiu o financiamento para a Circular de Maputo, se deveria conseguir, com a mesma facilidade, os financiamentos necessários para as Barragens de Bué Maria, Moamba Major e de Mapai. Neste caso, escamoteia-se o facto de a Circular de Maputo e a Ponte da Katembe serem projectos eminentemente comerciais, com portagens, que vão gerar rendimentos susceptíveis de garantir o reembolso dos financiamentos concedidos. Este tipo de projectos é perfeitamente bancável, pois os mercados financeiros sentem uma natural propensão para, neles, colocar o seu dinheiro, dada a elevada probabilidade de estes projectos gerarem o dinheiro necessário para reembolsar os créditos concedidos. Em contrapartida, barragens de controlo de cheias são projectos eminentemente sociais que, em princípio, não geram qualquer tipo de receitas. Em caso de empréstimos, estes devem ser pagos pela economia nacional, no seu todo, e não pelas barragens. Assim, os financiadores deste tipo de empreendimentos só libertam o dinheiro após a avaliação positiva da capacidade da economia, no seu todo, de o reembolsar. Toda esta explicação é dada para mostrar que a falta de barragens e as consequentes cheias não se devem a qualquer imprevidência. Devem-se, sim, à dificuldade de obter os necessários financiamentos.
Mesmo nas cidades! Pode ser que, nos últimos tempos, se verifique alguma gestão irregular do solo urbano. Todavia, não é essa deficiente e recente ocupação que causa problemas nas nossas urbes. É, sim, o processo migratório campo-cidade caótico, que ocorreu entre meados da década 80 e princípios da década 90, do século passado, derivado da guerra de desestabilização.
Este texto já vai longo. Não vou-me ocupar da questão de má distribuição da riqueza nacional ou do crescimento das desigualdades sociais. Prometo fazê-lo em próxima ocasião. Todavia, tenho para mim que se os nossos históricos insistirem em simplificar e caricaturizar os problemas nacionais, apenas com o intuito de obter aplausos fáceis, correm o risco de atraír uma multidão de pagãos, como aquela que acorria, para lá na minha aldeia, assistir a Ngalanga do Evangelista. E, como me dei conta na minha infância, esses aplausos são falsos, são irónicos, destinam-se apenas a ridicularizar indivíduos que, no passado, eram vigorosos férreos e fervorosos pregadores da disciplina partidária. São aplausos para mostrar como dança, hoje, o evangelista que, num passado recente pregava, em êxtase, o unanismo e tinha descoberto um inferno conveniente para os que ousavam dissentir.
JORNAL DOMINGO – 24.02.2013