Sérgio Vieira
Do Rovuma ao Maputo encontro legiões de jovens nacionais que desesperadamente buscam uma colocação, terminada a 12.ª classe sobretudo. Muito poucos os carentes de emprego entre os que concluem cursos técnicos, médios ou profissionais. Isto diz-nos algo.
Espero que o Ministro da Educação saiba por tento ao exagero de cursos pré-universitários e multiplique as escolas profissionalizantes de artes e ofícios, agricultura, indústria, escolas básicas para quem termine a 7.ª, as médias e superiores. Escolas com bibliotecas, laboratórios, docentes e não meros biscateiros. Estas escolas permitem o autoemprego e respondem à demanda das mais diversas empresas. O Presidente mandou transformar a escola pré-universitária de Kateme numa escola profissionalizante. Carradas de razão!
Existirem mais alunos no ensino superior do que em todos os cursos médios? Uma aberração consentida pelas instituições de tutela que permitem que se vendam ao desbarato títulos académicos. Disse e repito que, na minha terra, o total do número de instituições do ensino superior mostra-se superior ao do conjunto das padarias e barbearias existentes. Faz sentido?
Não respondendo o país ao que se precisa, desembarcam-nos do Zimbabué e Malawi carpinteiros, electricistas, torneiros, mecânicos, gente que sabe tomar conta de um motor, reparar uma torneira, fazer uma janela, trabalhar uma machamba. Inflacionamos as legiões de nacionais desempregados e descontentes. Porque se tornou o nosso país incapaz de dar emprego aos seus filhos, mas capaz de o fazer para os estrangeiros? Quem culpabilizar? Quem pode atirar a primeira pedra?
Dizem-me, que por dia uma centena de desempregados desembarca da antiga metrópole, quarenta ou cinquenta mil por ano, chegam também pseudo investidores com dois mil € na algibeira. Não se trata de fechar a porta, mas saber quem queremos receber como emigrantes.
Angola diz que investidor deve apresentar pelo menos um milhão de euros! Estará Angola errada ou nós?
Visto turístico que se torna de trabalho? Balelas. Vêm da Ásia, da América Latina, da África Ocidental, dos Grandes Lagos, da Somália, da antiga Jugoslávia, da extinta URSS, do Leste, das Américas.
Quando me desloco à Europa, como turista, exigem que mostre o extracto da minha conta bancária, bilhete de ida e volta, faça prova de comigo levar em dinheiro e cartões um valor X substantivo, sem preencher estes requisitos não me dão o visto. E nós o que requeremos?
Queremos mesmo isto? Chega-nos de tudo, desde gente séria a traficantes de toda a ordem e fanáticos que perigam a segurança nacional. Vêm milhares de enviados do Senhor de miríades de confissões ensinarem-nos a comprarmos paraísos e Deus a prestações!
Abrem restaurantes halal, ignoro se a tutela do turismo num país laico autoriza que na Changara ou em Caia uns estrangeiros me obriguem a comer num restaurante halal,onde com 40º não posso tomar uma cerveja. Mas por baixo do balcão compram ouro e pedras preciosas. Há os que vendem pneus, peças, baterias, telefones, canetas, óculos tudo com boas marcas mas produtos mais que falsos.
Chegados ontem com visto turístico ou sem visto, logo possuem um DIRE e... Até BI e Passaporte! Falam de luvas na migração, estamos perante factos ou boatos? Troca o emigrante emprego como quem muda de camisa. O DIRE acompanha! Conheço pessoalmente dois casos, por mero acaso, também não tomei conhecimento que se houvesse sancionado o corrompido nos serviços e quem o corrompeu. Apenas tomamos conhecimento que Ministério do Trabalho expulsou este ou aquele, mas e de novo não nos mencionam penas para os cúmplices, autores e prevaricadores dos desmandos.
Quem verifica? Que toleremos as barraquinhas dos nacionais, vá lá, mas dos estrangeiros? Transformamos a solidariedade internacionalista em bazar ou casa de leilões, onde o traficante fica promovido a combatente dos direitos humanos e militante antifascista?
Nas transnacionais e na gente que importam também há de tudo, nepotismo, luvas, toneladas de antigos colonos, de gente que não tolera a dignidade moçambicana. Escrevo sobre o que vi, ouvi e posso testemunhar. Mas se eu sei, simples cidadão, como faz a autoridade para ignorar?
Estamos convencidos que os indignados só existem fora de Moçambique? Quando e recentemente em Portugal um milhão de pessoas exprimiu o seu descontentamento, constatou-se que nenhum partido ou sindicato convocara as multidões. Mas havia indignação e revolta!
Assim aconteceu em Maputo em Fevereiro de 2008 e Setembro de 2010. A diferença está em que lá não se partiram montras, não se pilharam lojas nem queimaram carros. Cá na terra isso gera motins com desacatos sérios e vítimas inocentes. Manifestações de pilha galinhas! Mas cedo ou tarde os desempregados manifestar-se-ão.
Há que responder ao desenvolvimento em termos de sociedade, da pessoa que precisa que lhe reparem a cadeira ou a canalização, como também daquilo que as empresas e serviços precisam. Há que garantir que a produção de tomate ou batata abasteçam o mercado o ano inteiro
Um abraço para combatermos o desemprego,
Sérgio Vieira
P.S. Normal que se façam críticas. A crítica e autocrítica fazem parte da cultura, ideologia e estatutos da organização que pertenço desde a sua criação em 1962, há mais de cinquenta anos.
Jamais pretendi eternizar-me em posições e funções, ainda em 1986 e antes da morte do Presidente Samora, solicitei que me desligasse de funções governamentais, para fazer algo diferente e que almejara desde há muito, investigar, ensinar, escrever. Samora prometeu fazê-lo, a morte assassina o impediu de cumprir. Chissano aceitou em 1987 faz vinte e seis anos que saí. Na Assembleia da República terminei o mandato que exerci entre 1977 e 1987. A pedido do então Governador Muthemba e do saudoso Primeiro Secretário Provincial Aníbal Oliveira, a ela voltei entre 1994 e 2004, saí então porque não dispunha do capital de tempo necessário. Nos locais próprios sempre e livremente opinei.
Na semana passada saíram neste semanário dois ataques pessoais contra mim. Dois? Coincidência, telepatia, encomenda?
A PIDE, o colonial-fascismo jamais me intimidaram. Muito menos os ataques telecomandados e executados por pobres oportunistas em busca de posições.
Um abraço à discussão e crítica,
Sérgio Vieira
DOMINGO – 17.02.2013