RAFAEL Correia, presidente da segunda autarquia mais importante de Cabo Delgado, que sucedeu a Alberto Paissene, sob direcção de quem esta cidade foi autarcizada, em 1998, não esconde hoje que localmente o problema de abastecimento de água não se vai resolver. É preciso o envolvimento de parceiros de peso.
Maputo, Quarta-Feira, 29 de Maio de 2013
NotíciasÉ o principal quebra-cabeças que se coloca ao município, razão pela qual encabeça a lista das actividades não realizadas no mandato prestes a findar, ajuntando aos os problemas colocados pelas vias de acesso, a erosão, havendo, porém, intervenções que terão que ser permanentes, segundo o presidente do Conselho Municipal de Montepuez, quando recentemente fazia o balanço do seu último mandato.
“Sempre que nos perguntam sobre o grande problema que não estamos a conseguir transpor, prontamente dissemos: abastecimento de água. Como município não temos capacidade para resolvê-lo, requer avultados investimentos, é preciso contar com parceiros, sobretudo do Governo”, reitera Rafael Correia.
Na verdade, no terreno, a nossa Reportagem encontrou os rigores por que passa uma cidade que no último quinquénio regrediu em matéria de abastecimento de água, ao contrário do que seria de esperar, nomeadamente o aumento do volume de fornecimento daquele líquido indispensável à vida humana.
Correia confirma-nos os factos, precisando que, se antes a cidade tinha conseguido abastecer os seus habitantes de água potável, na ordem dos 65 por cento, ao fim deste mandato, baixou para 54 porcento. O nosso interlocutor justifica-se pelo seguinte:
“O aumento do número de habitantes, avaria de electrobombas, o abaixamento da capacidade de alguns furos, em virtude do assoreamento das fontes de água”.
Tal como deixa ver o quadro prevalecente, houve apenas retrocessos no capitulo que se refere ao abastecimento de água, que entretanto sabíamos que havia projectos de vulto, no quadro da Millennium Chalange Acount – Moçambique, que previa uma reabilitação de proporções mais ajustadas ao actual estado do sistema de abastecimento.
“Não foi possível, fomos postos fora e a alegacão é geral, que passa pela subida de preços dos materiais de construção, um fenómeno que apanhou em contrapé o financiador, que terá estado relacionado com o Mundial de Futebol, na África do Sul, o mais promissor e próximo mercado” explica o presidente do município de Montepuez.
Rafael Correia
Uma cidade com uma avenida asfaltada
O segundo problema, segundo Correia, são as vias de acesso, principalmente de ligação entre os bairros periféricos, donde sai a maioria dos munícipes de Montepuez para alimentar o movimento burocrático, comercial, político-administrativo, económico, industrial, desportivo e recreativo, que fazem daquela autarquia a maior, depois da capital provincial, Pemba.
“O Fundo de Estradas serve para o que serve, por isso, ainda enfrentamos estas dificuldades, cuja solução é ténue e paulatina ”acrescenta o nosso entrevistado.
Do mesmo modo, as dificuldades financeiras fazem com que tecnicamente não esteja a ser possível estancar a problemática à volta da erosão que ameaça uma boa parte da cidade de Montepuez. Ainda há muito por fazer, apesar de ter sido ensaiada uma vala de drenagem, no bairro de Nacate.
A cidade de Montepuez tem 45 quilómetros de vias e a única estrada asfaltada tem o nome do arquitecto da Unidade Nacional, Eduardo Mondlane. As obras de construção e/ou reabilitação da estrada Montepuez/Ruaça, ligando as províncias de Cabo Delgado e Niassa, partem, conforme se pode perceber, desta cidade.
Por esta razão e segundo nos confirmou Rafael Correia, pretendia-se que a CMC, empreiteira encarregue por esta obra, pudesse conseguir algum valor no fim do projecto que fosse empregue para a reabilitação de uma parte das ruas urbanas de Montepuez.
Porém, em função do que foi possível, a municipalidade já pôde beneficiar algumas vias, com o uso de pavês, pelo menos em 200 metros da rua Nachingwea e 300 do Agostinho Neto.
Estudo já tinha alertado
Um docente da Universidade Pedagógica, delegação de Montepuez, em conversa com o nosso Jornal, duvidou que a prestação do Conselho Municipal tenha atingido sequer metade do que lhe cabia, em função das suas promessas.
“Tudo o que está a acontecer aqui é por força da própria dinâmica de desenvolvimento, fora dos planos existentes no município. A sorte que Montepuez tem é essa, mas falando francamente, nada aconteceu, para além das iniciativas individuais e privadas de cidadãos que querem progredir” disse.
Para a nossa fonte, o município de Montepuez parou no tempo ao não ter conseguido fazer algo de novo no último mandato de Rafael Correia, havendo situações em que não foi capaz de consolidar as suas próprias conquistas do mandato anterior, como é o caso de abastecimento de água.
O movimento do comércio, na urbe, também atribuído às forcas de mercado, de jovens maioritariamente provenientes da cidade portuária de Nacala e estrangeiros dos Grandes Lagos e África Oriental, que enchem de artigos a cidade de Montepuez, principalmente, roupa, electrodomésticos, mobiliário, entre outros bens de uso e consumo.
“Vale a pena ir ter com o dono (presidente), para pessoalmente autoavaliar-se e se for honesto certamente que dirá tal como estou a caracterizar este município. Espero que os seus patrões (o partido e os eleitores) vislumbrem algo que me ponha na posição de um equivocado” humorizou, antes de nos confidenciar sobre a existência de um estudo de 2009, que não abonava nem o município nem o distrito como tal.
Em meados de 2009, com efeito, Montepuez, Mocímboa da Praia e Chiúre faziam parte de um grupo de seis distritos e três autarquias, cujos aspectos críticos da sua governação local tinham sido identificados por um estudo que havia sido apresentado, em Pemba, pela Iniciativa de Monitoria da Governação Local, em Moçambique, que concluíra que mais de metade das actividades inscritas nos seus Planos Económicos e Sociais, para o ano de 2008, não tinham sido realizadas.
Estava-se no primeiro ano do segundo mandato de Rafael Correia. Na altura o estudo debruçava-se sobre outras áreas, incluindo as ligadas ao território fora do município, mas em termos gerais alertava para a necessidade do cumprimento dos programas e planos governativos, tanto locais como municipais.
Havia, então, a percepção de que fosse a situação de quase todos os governos locais em Moçambique, mas o estudo cingira-se aos Governos locais de Bilene, Mabalane e Manjacaze, em Gaza, Cheringoma, Búzi e Marromeu, na província de Sofala e os de Chiúre, Mocímboa da Praia e Montepuez, Cabo Delgado, cujas justificações apresentadas pelos dirigentes, conforme o estudo, prendiam-se com constrangimentos de ordem técnica e/ou financeira.
Mas a análise da iniciativa sugeria que o principal nó de estrangulamento estaria na engenharia institucional em torno da elaboração dos planos económicos e sociais e orçamento distrital. É que ainda não existia uma combinação harmoniosa entre o plano e orçamento, o que trazia limitações ao plano económico-social e orçamento distrital, como único instrumento de planeamento e afectação de recursos dos órgãos centrais para o nível distrital.
Em face disso, o figurino institucional em que se realizava a planificação e orçamento em Moçambique, o plano económico-social e orçamento distrital tinham sérias limitações como instrumento confiável para o exercício de monitoria da governação local, na medida em que havia uma grande incerteza na sua execução, que resultava da discrepância entre a lógica de planificação e a de orçamentação.
Montepuez era, pois, apresentado como o distrito que fizera um plano com 18 actividades cobrindo várias áreas, com destaque para as infra-estruturas. Para a monitoria, a iniciativa seleccionara 7 empreendimentos, sendo todos da área de infra-estruturas, correspondentes a 100 porcento e o trabalho de campo veio dar no seguinte: das 7 actividades seleccionadas nenhuma fora concluída, uma estava em execução ao tempo do levantamento e seis não tinham sido realizadas.
Do ponto de vista estatístico das actividades seleccionadas ficava-se com uma percentagem de realização situada em zero porcento (0 por cento), se bem que 14.3 por cento estavam em execução e 85.7 por cento não tinham sido realizadas.
É o que parece se ter prolongado e contagiado o município que praticamente não conseguiu cumprir na íntegra nenhum plano constante no seu manifesto eleitoral, que falava, nomeadamente, do abastecimento de água e saneamento, do combate à erosão, de infra-estruturas sociais e das áreas transversais.
Na verdade, segundo o presidente do Conselho Municipal, “construímos fontes de água, quer dizer, fizemos a abertura de algumas fontes (poços e furos) e reabilitámos outros”.
“Fizemos a manutenção periódica de algumas vias de acesso, mas não conseguimos satisfazer em 100 por cento o que queríamos e tínhamos planificado, em alguns bairros ficou um trabalho por completar” diz Rafael Correia.
No que se refere à construção de infra-estruturas sociais, Rafael Correia diz ter podido construir 10 salas de aula e respectivos gabinetes para as direcções e professores, facto que não satisfaz os anseios do timoneiro de Montepuez, por se tratar de programas fora do município e confessa:
“ Na verdade, a cidade beneficiou dos programas do distrito nesta área, razão porque podemos falar das escolas de Napai e Niúla”.
Na saúde, no presente mandato não houve registo de nenhuma infra-estrutura erguida e/ou reabilitada. O centro de saúde de Niúla vem do mandato anterior, sendo que, por esta via, o desempenho do Conselho Municipal de Montepuez, está na ordem dos zero porcento.
Edifício-sede do Conselho Municipal
A pressão já diminuiu
Os dados oficiais falam em 76.000 habitantes, em Montepuez, uma cidade que nos últimos três anos foi muito pressionada, em virtude de, tal como uma parte do distrito, acolher numerosos estrangeiros e nacionais de diferentes proveniências, em razão da ocorrência do rubi, no posto administrativo de Namanhumbir, 30 quilómetros da cidade em análise.
Hoje, de acordo com Rafael Correia, a pressão diminuiu, como consequência directa da passagem da área pretendida, onde decorria a exploração desenfreada e ilegal daquele minério, à exploração por um consórcio formado pela Mwiriti, Lda. e a Gemfields, denominado Montepuez Ruby Mining.
O rubi fizera deslocar a Montepuez gente abastada ou seus enviados, da Ásia, Europa, das Américas e do Ocidente e Centro do nosso continente, semeando imediatamente uma tensão social que mereceu diferentes tipos de intervenção, dos diferentes poderes, desde persuasivas a coercivas.
Do mesmo modo, cidadãos de outros pontos do país, principalmente Niassa, Nampula e Zambézia, que traziam alguma experiência de garimpo, estabeleceram-se para retirarem o produto e depois vendê-lo aos estrangeiros a preços teoricamente compensativos, mas que na realidade acabavam sendo muito baratos, quando postos no principal mercado das gemas, em Hong Kong.
A tensão em Namanhumbir partia do facto de o Governo querer impor a ordem na exploração daquele minério por entidades licenciadas e a comunidade populacional entender que estava a perder a oportunidade de ser ela própria a ganhar, individualmente, pelo facto de estar a viver numa região a que a natureza ofereceu a especificidade de ter no seu ventre um mineral largamente procurado pelo mundo fora.Por outro lado, a população achava que a vida, tanto de Namanhumbir quanto de todo o distrito de Montepuez, estava a melhorar na prática por intermédio das vendas que se faziam directamente aos compradores estrangeiros, bem como outras vantagens colaterais provindas do aluguer das suas casas, a preços competitivos, entre outras.
Para tudo isso, a cidade de Montepuez era uma espécie de quartel-general, onde se alojavam os principais compradores, por detrás de quem estavam todos os indivíduos encontrados a residir legal ou ilegalmente, tanto nesta cidade, como nas aldeias-tampão, próximas da mina.
Hoje, o presidente do Conselho Municipal não esconde o seu alívio e diz que a pressão diminuiu consideravelmente, apesar de os problemas de ocupação desordenada do solo urbano, que na verdade não são devidos ao êxodo causado pela mina de Namanhumbir, sejam ainda um problema por solucionar.“A ocupação desordenada do solo urbano continua. Há novas ocupações que até desorganizaram aquelas que já estavam organizadas, como por exemplo, o bairro Matuto, que neste momento precisa de uma requalificação” disse a nossa fonte.
Contudo, o presidente do Conselho Municipal de Montepuez enaltece os esforços envidados na luta contra o HIV/SIDA, o beneficio dos doentes padecendo da doença da cesta básica, palestras, feira de saúde, capacitações, entre outras actividades do conjunto de acções inseridas nos chamados assuntos transversais.
O recurso ao silo para o depósito de resíduos sólidos e a mudança de atitude dos residentes de Montepuez, em relação à própria limpeza da urbe, são aplaudidos pelo presidente daquele município, que a nível institucional, segundo repetiu, cresceu sobremaneira.
“Agora somos um Conselho Municipal já com técnicos médios, pessoas formadas em administração autárquica, já temos quadros de nível superior e investimos muito na aquisição de equipamento informático e de mobiliário”.
- Pedro Nacuo