Reflexão (161)de: Adelino Buque
A expressão que assume o título desta reflexão está no último parágrafo do editorial do semanário Canal de Moçambique, de 11 de Setembro de 2013, página 6. Para uma melhor compreensão do estimado leitor que, eventualmente, não tenha lido esse semanário, aqui reproduzo na íntegra o referido parágrafo: "mas, sinceramente, sentimonos lisonjeados com os programas elogiosos a um Guebuza omnipresente e omnipotente, porque finalmente isso permite-nos elogiar quem conseguiu de facto fazer o que nós ainda não tínhamos conseguido: pôr Armando Emílio Guebuza completamente no ridículo”. O sublinhado é meu. Tratando-se de um editorial que, segundo as regras jornalísticas, reflecte o posicionamento da linha do jornal, fica esclarecida a agenda do semanário Canal de Moçambique: “pôr Armando Emílio Guebuza completamente no ridículo”, feito que, de acordo com o editorial, ainda não tinha conseguido lograr. Interessante é trazer o título do referido editorial que é “GUEBUZA É QUE FEZ, GUEBUZA É QUE FAZ?" que pretende debruçar-se sobre as peças seguidas de debate sobre "Balanço da Governação do Presidente Armando Emílio Guebuza”.
Pessoalmente, não pretendo debruçar-me sobre se o balanço é ou não oportuno. Pretendo, sim, compreender o alcance do editorial de um semanário cuja agenda última é "pôr Armando Emílio Guebuza completamente no ridículo". Se assim é, como me parece ser de facto, o semanário Canal de Moçambique acha que não existem outras correntes que, ao contrário da sua, pretendem "pôr Armando Emílio Guebuza no lugar que merece na história recente do país”. Sim, porque a mesma liberdade de que goza o semanário em referência, suponho que outros órgãos de comunicação também devem gozar, salvo se o Canal de Moçambique se considera um jornal de excepção em Moçambique.
De contrário, deveria, na minha opinião, empenharse a fundo em procurar "pôr Armando Emílio Guebuza completamente no ridículo" com todos os recursos de que tem à disposição, incluindo outros que possa adquirir dos que pensam de igual maneira, deixando em paz outras correntes de opinião.
Aliás, Armando Emílio Guebuza é o Presidente da República de Moçambique, eleito democraticamente.
Os órgãos de comunicação públicos têm o dever de noticiar e exaltar os feitos desse governo, ainda para mais quando existem semanários concebidos com agenda exclusiva para "pôr Armando Emílio Guebuza completamente no ridículo”.
Embora não seja propositado, vale recordar ao director do Canal de Moçambiqueque Moçambique de 1975 e de 2013 não é o mesmo. A comunicação que se fez nos anos subsequentes à independência, digamos, até 10 a 15 anos depois, é diferente da que se faz hoje, embora continuem actores do pós-independência. Vale dizer que entraram no jogo novos e quantitativamente mais actores. É provável que Fernando Veloso de 1975 fosse um senhor “dono absoluto da verdade" e, nessa condição, não houvesse condições de o contrapor porque as condições assim estavam criadas e estabelecidas.
Devo recordar aos mais novos que no período a que me refiro não tínhamos os órgãos independentes, mas tínhamos "HERÓIS VIVOS DA REVOLUÇÃO MOÇAMBICANA”. Esses heróisvariavam muito pouco em termos de personalidades; poderia ser o mesmo em várias frentes e nunca ninguém os contestava. Lembra-se, Veloso?! Ou precisa de um refrescamento? Quem deveria estar na primeira página do jornal? Quem eram os democratas filiados na Renamo ontem? Acaso lembra-se. É muita pena que pessoas que ontem escreviam páginas inteiras de elogios à “tenacidade, heroicidade, visionários, socialistas internacionalistas, combatentes incansáveis, entre outros elogios", estejam, hoje, a fazer esforço de lavagem cerebral aos mais novos.
Para esses é fácil os heróis de ontem se tornarem "bandidos” de hoje e os “bandidos" de ontem serem os heróis de hoje!
A questão que eu coloco é: para onde vamos com esta sociedade de acusações e de autoflagelação? Chegaremos a algum lugar como sociedade ou precisamos de retornar ao passado, antes de 1975? Será isso que queremos como um povo?
Não precisamos de recordar as nossas trincheiras do passado, até porque Moçambique está se reconciliando. Nós, como cidadãos deste país, precisamos de criticar e elogiar sem ridicularizar e nem bajular.
Eu gosto de fazer reflexões semanais. Não gostaria de fazer reflexões com tendências de reviver o passado recente, contudo, se existem correntes que assim querem, quem sou eu para negar: vamos recordar quem foram os promotores de várias arbitrariedades que, pelo seu impacto, desvirtuaram a cultura moçambicana. Quem aconselhou a Frelimo a diabolizar os régulos, os detentores do poder tradicional, os curandeiros, os polígamos, quem animou a aprovação da Lei das Chicotadas, quem dinamizou e/ou aprovou a Lei de “Operação Produção”, entre outras medidas? Se calhar, recorrendo ao acervo fotográfico de Fernando Veloso muitas dúvidas se podem dissipar. Não acha?
Reitero, aqui e agora: esta reflexão não pretende olhar o mérito ou a sua falta ao balanço da governação do Presidente Armando Emílio Guebuza, até porque no quadro da liberdade vigente, diferente da liberdade de ontem, os jornais podem emitir a sua posição relativamente à governação. O semanário Canal de Moçambiquetem a liberdade de estar ou não de acordo com aquilo que é a governação de Armando Emílio Guebuza. Não concordo é com a criação de um jornal com o propósito último de "pôr Armando Emílio Guebuza completamente no ridículo”. Haja razoabilidade na comunicação, caro director!
CORREIO DA MANHÃ – 16.09.2013