Esta é a semana do Natal para os cristãos, mas também é a semana do “Dia da Família” para todos os moçambicanos das mais variadas convicções.
Este deveria ser, a escassos dias do fim do ano, um momento em que pudéssemos celebrar uma tal harmonização de vontades que ajudasse a superar diferenças que hoje em dia, volvidas mais de duas décadas de Paz ainda que precária, infelizmente, subsistem e acentuam-se em vez de desvanecerem.
Estamos de novo divididos no essencial porque quem com responsabilidades acrescidas deveria estar a promover a Paz, insiste em maltratá-la ainda que, hipocritamente, ande constantemente com o “credo na boca”, procurando fazer crer que ouve o clamor de uma cidadania crescente que por seu turno, decididamente e sem medo, agora se recusa a deixar-se intimidar, cansada de proclamar o que não consegue ver reflectido em acções práticas empreendidas pela actual liderança do País.
Volvidos 21 anos, passamos mais um Natal e Dia da Família em que a Grande Família Moçambicana volta lamentavelmente a ter os pés em cima de sangue derramado por inocentes, quer civis, quer cidadãos envolvidos nas Forças de Defesa e Segurança ao serviço de uma causa que está longe de ser nacional e é, antes porém, isso sim, causa de quem não consegue entender que há modos de se estar em Moçambique, que ultrapassam qualquer visão retrógrada e com forte pendor discriminatório, mesquinho, medíocre e insultuoso, que regride ao ancorar-se numa linguagem que se julgava superada pós-colonialismo, mas que reapareceu recentemente no léxico de certas figuras acocoradas na cúpula do regime, eivada de complexos populistas de índole racista e tribalista, com a novidade agora de ferir até correligionários da primeira hora da luta de libertação nacional.
Desejamos profundamente que a mesma quadra festiva do próximo ano, em que já deverá estar esclarecida a nova liderança do País por via do voto fruto de um escrutínio efectivamente transparente e fruto de uma real vontade popular não amedrontada por forças repressivas em dia de sufrágio, possa ser vivida num outro cenário de esperança renovada, com uma direcção do Estado diametralmente diferente e verdadeira e honestamente comprometida com a Paz, com discurso moderno, disposta a equacionar novas formas de distribuição da riqueza baseada em práticas diferentes e promotoras de maior justiça social.
Ao contrário de menos pobreza, temos hoje pobreza mais chocante do que quando se iniciou o actual ciclo de governação. E, sendo assim, é cada vez mais difícil a sociedade civil poder concordar que “o silêncio é de ouro e a palavra é de prata”.
Vimos entre a nossa última edição e esta o Presidente da República ir ao parlamento cumprir mais um ritual de rotina e constatámos mais uma vez que os milhões de Moçambicanos esperavam ouvir dele palavras que permitissem a reconstrução da confiança entre partes desavindas, mas acabaram vendo as suas esperanças frustradas com mais um discurso repleto de lugares comuns e oco de ideias, apenas baseado em pressupostos jurídicos de utilidade expirada quando se vivem momentos em que decididamente se impõe uma visão mais sintonizada. com o progresso do que com a necessidade de sobrevivência política de alguma entidade singular ou colectiva.
Esperava-se ouvir palavras que pudessem relançar as condições para um diálogo frutífero e conducente ao clima de harmonia que o País deseja que seja urgentemente conseguido, mas lamentavelmente escutaram-se antes palavras azedas, que não ajudam a promover ambiente que possa encaminhar o País para o abraço entre os desavindos.
A expectativa era ver-se este chefe de Estado reconciliador, diferente do que lhe tem sido peculiar.
Esperava-se ver o chefe de Estado a dar a volta por cima e a aparecer com uma linguagem reconciliadora, mas viu-se mais do mesmo: um discurso oco de ideias e vazio de conteúdo, eivado de mais do mesmo de sempre e pretensões pessoais.
O insistente e doentio egocentrismo voltou a imperar, revelando uma total incapacidade de superação para que finalmente se visse o estadista a sair-se, do novelo em que se embrulhou, com o mínimo de dignidade, projecto que, com semelhantes acções, se vai revelando cada vez mais a tal “missão impossível”.
Com a mais recente manifestação de ausência de magnanimidade e antes intransigência do chefe de Estado nesta sua ida ao Parlamento, perdemos todos a oportunidade soberana de nos reencontrarmos sem os obstáculos que a FIR abriu ao atacar, com ordens superiores, a sede da Renamo na localidade de Muxúnguè, a 03 de Abril último, abrindo dessa forma as hostilidades.
Não se ouviu a mais pequena referência a arrependimento pela tentativa de prática de homicídio contra quem se diz querer como interlocutor em mesas de conversações honestas.
Perdemos todos a oportunidade de celebrarmos este Dia da Família em Paz.
Julgava-se que depois de largos esforços de muitas partes estivessem colocados os ingredientes que faltavam para que se voltasse ao trilho da Paz, e esperava-se que o PR tivesse ido ao Parlamento estender a mão ao diálogo sem arrogância e em circunstâncias seguras para a outra parte ofendida em sua própria casa no dia 21 de Outubro, onde escapou da morte apenas devido à sua astúcia.
Depois do ataque a Sadjundjira, a 21 de Outubro – uma decisão do mais elevado grau de irresponsabilidade – pensava-se que o PR, ao aperceber-se que o sangue derramado não trouxe qualquer proveito político, iria ter um rasgo de bom senso e aproveitar a sua ida à Assembleia da República para dar uma alegria aos Moçambicanos e estender a mão ao seu rival da Renamo a quem, sem dúvida, quis matar. Mas, mais uma vez, infelizmente, o PR revelou que não aprendeu nada com
Mandela.
Nesta sua ida ao Parlamento, o PR voltou a patrocinar uma manifestação autista de quem não desiste de andar com os calcanhares para a frente e com os sapatos calçados ao contrário do sentido da História, sem perceber que a oportunidade de salvar ao menos a imagem da instituição que é, está a passar à medida que se aproxima o momento de partir por força da Constituição que jurou cumprir.
Canal de Moçambique – 24.12.2013