Contribuições para História de Moçambique
A «Amnistia Internacional» deparou-se com a ocorrência de detenções sem julgamento, aplicação da pena de morte e o julgamento de prisioneiros políticos diante do «Tribunal Militar Revolucionário».
No início de 1981, em seguida à operação militar sul-africana em território moçambicano do final de Janeiro, ocorreu uma série de imensa de detenções.
Em 14 de Fevereiro oito membros das Forças Armadas moçambicanas foram detidos durante um desfile em Maputo e acusados publicamente de traição. O Presidente Samora Machel declarou que, uma vez completas as investigações, eles seriam julgados pelo «Tribunal Militar Revolucionário». No entanto, nenhum julgamento havia tido lugar até o final do ano (1981).
Americanos expulsos acusados de expionagem
Em Março, seis cidadãos norte-americanos foram expulsos por suspeita de espionagem e um certo número de pessoas foi detido. Acredita-se que vários estrangeiros incluídos entre os detidos tenham sido libertados no início de Maio. Um certo número de moçambicanos também havia sido preso mas não se sabe se foi ou não beneficiado com a mesma sorte.
Campos de reeducação de Chaimite e Ruarua
O Presidente Machel esteve em visita a mais dois outros campos de “reeducação”, em Chaimite, e em Ruarua, na província do Cabo Delgado. Conta-se que entre seus ocupantes estavam ex-guerrilheiros nacionalistas e outros pretensos criminosos comuns ali enviados para “reeducação”.
O Presidente ordenou a libertação de 684 pessoas do campo de Chaimite e afirmou que alguns haviam sido mantidos ali injustamente. Em Ruarua, ele criticou a detenção, por infracções menores, de ex-guerrilheiros da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e ordenou que 76 deles fossem libertos.
Presos políticos fuzilados
A pena de morte foi imposta a pelo menos 11 pessoas acusadas de infracções de natureza política. Todos foram subsequentemente executados. Em Fevereiro, quatro membros supostos da África Livre foram sentenciados à morte pelo Tribunal Militar Revolucionário de Quelimane, inculpados por rebelião armada e terrorismo. Antes que as sentenças fossem executadas, a «Amnistia Internacional» havia lançado um apelo de clemência em favor deles. Duas outras pessoas foram executadas em Julho. Enoch Cau, um sul-africano suspeito de espionagem, e Alberto Seane inculpado por rebelião armada, foram ambos fuzilados. Eles haviam sido sentenciados à morte em Junho pelo Tribunal Militar Revolucionário.
Novas execuções em Outubro de 82
Da mesma forma que outros réus que haviam comparecido diante desta corte, eles foram julgados in comera e sem representação legal. Novas execuções foram reportadas no início de Outubro, quando cinco supostos membros da «RNM – Renamo» foram fuzilados. Em Setembro, eles haviam sido inculpados pelo Tribunal Militar Revolucionário em Chimoio de rebelião armada, terrorismo e por pertencerem a uma organização clandestina.
Em Outubro, o governo denunciou que civis prisioneiros dos guerrilheiros da Renamo na região de Chimoio haviam sido torturados e mutilados.
Longas detenções sem julgamento
A «Amnistia Internacional» preocupou-se sobre longas detenções sem julgamento de suspeitos opositores ao governo, incluindo alguns prisioneiros detidos antes da independência em 1975 sobre julgamentos que não estão de acordo com as normas reconhecidas internacionalmente, sobre notícias de maus tratos a suspeitos membros de grupos da oposição armada, e ainda acerca da aplicação da pena de morte.
Fontes não oficiais reportam que elevado número de civis foram também detidos durante o ano, por suspeita de apoiarem de uma forma ou outra a Renamo. Alguns destes foram acusados de distribuir panfletos da Renamo, enquanto outros são noticiados terem sido presos sem acusação após serem denunciados às autoridades. Alguns foram detidos quando encontrados em posse de panfletos da Renamo, e que clamavam terem-nos recebido involuntariamente. A «Amnistia Internacional» preocupou-se com o facto de vários detidos acusados de ligações à Renamo terem sido arbitrariamente presos quando não havia nenhuma evidência concreta contra eles; igualmente preocupou-se com o caso de detidos acusados de apoiarem a Renamo, e de que há notícias de terem sido severamente espancados enquanto em custódia.
A «Amnistia Internacional» inquietou-se por prisões prolongadas sem julgamento, de pessoas acusadas de actividades que visavam o derrube do governo. Nestas incluir-se-iam antigos líderes de grupos políticos opostos à Frelimo antes da independência em 1975, e outros detidos desde essa altura, como por exemplo aqueles feitos prisioneiros após o “raid” sul-africano em Moçambique em Janeiro de 1981. O número total de tais detidos não foi conhecido.
Vários julgamentos políticos tiveram lugar perante o «Tribunal Militar Revolucionário», tribunal especial formado em 1979 para julgar ofensas contra a segurança do Estado.
Julgamentos à porta fechada
Os julgamentos perante este tribunal são feitos geralmente à porta fechada e os réus não são representados por um advogado. Tal tribunal tem poderes para impor a pena de morte e os réus não têm qualquer direito de apelo para instâncias judiciais superiores.
Em Junho de 1982, 15 pessoas foram julgadas pelo «Tribunal Militar Revolucionário» sob alegações de apoiarem a Renamo. Seis foram condenadas e sentenciadas à morte por pertencerem a uma organização “clandestina” e por rebelião armada. Em Setembro, mais 27 pessoas acusadas de apoiarem a Renamo compareceram perante o Tribunal Militar Revolucionário. Dois dos réus, considerados culpados como chefes guerrilheiros, foram sentenciados à morte, e terão sido executados pelo pelotão de fuzilamento. Todos os outros foram condenados a penas de prisão variando entre os 4 e os 15 anos.
AI pede cumutação da pena de morte
Após as sentenças de morte terem sido anunciadas em Junho e em Setembro de 1982, a Amnistia Internacional tinha pedido ao Presidente Machel que comutasse tais penas. A organização pediu igualmente às autoridades que reconsiderassem o uso da pena de morte – que tinha sido introduzida em 1979 – e para tomarem medidas com vista à sua abolição. (*) Extractos sobre o Tribunal Militar Revolucionário, dos relatórios de 1982 e 1983 referentes aos anos 1981 e 1982, respectivamente.
(N.E.: O título e os entretítulos são da responsabilidade do «Canal de Moçambique»)
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 21.07.2006