Canal de Opinião por Rafael Bié
Definitivamente, sou forçado a pensar que a Frelimo vai continuar, por muitos anos, a ser uma biblioteca que se recomenda a quem queira iniciar-se em matéria de política, “política” na definição de Maquiavel.
E não precisa de ser estudioso de ciência política para perceber como a Frelimo faz política, quais os métodos que usa, quais os estratagemas que acciona, os meios que aplica para atingir o que pretende: conquistar (já conquistou), manter-se e exercer o poder político.
Vem isto a propósito da última aparição, quanto a mim extemporânea, do presidente do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Daviz Simango, sobre a sua pretensão de se reunir com Armando Guebuza, a quem ele pretende “pedir” para que a lei então aprovada pela Assembleia da República não seja promulgada.
É que não é admissível que um partido da “dimensão” do MDM, venha, hoje, pedir desculpas pelo facto de os seus oito deputados e os tantos da Frelimo e outros tantos da Renamo haverem aprovado a lei que confere mordomias insultuosas à custa da maioria dos pagantes de impostos.
Com que então há uma dissonância entre a liderança do partido MDM e os deputados sentados na “24 de Julho”!? Isto nem lembra ao diabo!
Isto é uma distracção imperdoável para quem pretende ascender à “Ponta Vermelha”, a não ser que esteja a jogar a feijões, mas deve ser perigoso, quando se tem um adversário cinquentenário, um adversário que, em determinada parte do jogo, comporta-se como uma associação para delinquir.
É de alimentar sérias dúvidas sobre a eventual promulgação das leis então aprovadas pela Assembleia da República!
Todo este exercício não deixa de parecer uma “jogada de mestre” dum partido (Frelimo) astuto, um partido maquiavélico, um movimento que anda nas lides políticas e é conhecedor dos jogos debaixo da mesa para atingir os seus fins.
Em política, a ética é a última a ser chamada. Enfim, a Frelimo é um partido que sabe o que quer, um partido que sabe como se movimenta e que sabe com que pedras deve jogar e colocar no tabuleiro para se manter no poder. Incluindo a ilusão!
“Jogada de mestre” dum partido que pode estar a reconhecer – intramuros – que tem a sua imagem no esgoto, diga-se. E isto não parece ser mais do que uma tentativa de resgate dessa imagem. Porque, no final do dia, o Presidente da República nada mais fará senão devolver a lei para reexame em sede da Assembleia da República.
Parece ser muita coincidência o facto de Adelino Buque ter publicado recentemente uma carta de opinião, no diário do Banco Emissor, a pedir ao presidente Armando Guebuza para vetar a lei. Não me interessa muito discutir os argumentos e análises de Buque e a sua arrumação.
Mas não deixa de parecer que se trata do início, em minha opinião, dum desfile que se seguirá na TV e Rádio públicas com alguns “comentadores residentes”, catalogados de G-40, a elogiar a “decisão sábia”, “clarividente” do “filho querido”, desta “bela pátria amada”, quando este devolver a lei para a Assembleia da República. Não interessa o argumento, mas o que a Frelimo terá conseguido é lançar esta “poeira” aos olhos de muitos, pois ela acredita piamente que esta “jogada de mestre” lhe possa dar alguns votos, poderá resgatar alguns degraus na sua imagem encardida.
Definitivamente, sou forçado a pensar que o voto no MDM não é porque este partido seja a solução dos problemas do país, mas que é apenas um voto punitivo ao partido Frelimo, sobretudo nas zonas urbanas. Não é que o MDM se apresenta, de facto, como alternativa credível. Casos em que o líder do MDM devia ter dado a cara, não o fez, e posso elencar alguns. Qual foi o posicionamento de Daviz Simango aquando da greve dos médicos? Qual foi o posicionamento de Daviz Simango aquando da greve dos estudantes e posterior recambiação dos mesmos da Argélia? Qual é o posicionamento de Daviz Simango em relação ao caso EMATUM. Mais uma vez, parece mesmo que se está a “jogar a feijões”.
Mais, alguns sectores, incluindo académicos e jornalistas, colocam a hipótese de Armando Guebuza estar face a um problema pelo facto de, na mesa do Presidente da República, haver duas leis, a que a ele dá benefícios quando for a “reforma”.
Ora, parece ser pouco crível que Armando Guebuza, em particular com todo o seu império empresarial, não faça face a todas as despesas que a lei preconize, só com recursos próprios. Ademais, não quero acreditar que o Presidente Guebuza e certos círculos do partido não saibam do desgaste da imagem dele e do partido Frelimo. Negar tal facto é tentar dizer que a Terra não gira à volta do Sol.
P.S. – Seria esta a altura, com a realização da reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Moçambique, em que um partido que quer discutir o poder político (e a sociedade civil) devia convocar conferências de imprensa e abordar, no mínimo, duas coisas: EMATUM e as “marregalias” dos deputados e de antigos chefes de Estado. É assim em outras latitudes. (Rafael Bié)
CANALMOZ – 30.05.2014