O MANGAL, que serve como “incubador” da fauna marinha, com destaque para o camarão, está a ser destruído por pessoas que amiúde usam pequenas embarcações ao longo da costa da província de Sofala.
Esta situação regista-se particularmente nos estuários dos rios Búzi e Púnguè, algumas regiões do posto administrativo de Nhangau, arredores da cidade da Beira, entre outras, onde a fauna marinha desova.
A situação está a ganhar contornos alarmantes nesta região do país. A verdade é que à medida que a exploração se intensifica, perante uma aparente inacção das autoridades do pelouro, também a fauna marinha vai ficando cada vez mais ameaçada porque os estuários estão a ficar paulatinamente sem o ambiente para a sua reprodução.
O que está a acontecer, segundo observamos, é que o abate indiscriminado do mangal e ao ritmo em que é feito continua a ser uma prática que, de acordo com alguns entendidos na matéria, levará a que dentro de alguns anos o Banco de Sofala venha a ressentir-se da falta do pescado, com realce para o camarão.
Para além de servir como combustível lenhoso, as estacas do mangal abatido nos estuários do Búzi, Púnguè, Nhangau, entre outros pontos, são usadas no lugar de prumos nas obras de construção civil bem como na edificação de casas de material precário.
Nas ruas, avenidas, bairros e outros lugares pode se ver pessoas a venderem enormes quantidades de estacas de mangal. Os estaleiros também andam abarrotados de estacas deste recurso natural abatido nas diversas zonas ao longo da costa.
Segundo soubemos na ronda que a nossa Reportagem efectuou, uma unidade custa entre 10, 15 e 20,00 meticais, dependendo da espessura e comprimento da estaca. A verdade, porém, é que enquanto uns ganham dinheiro by surfkeepit\\\0022 ""> com o abate e venda do mangal a actividade piscatória vai se ressentindo, o que um dia pode concorrer para a insegurança alimentar na região. O que se está a assistir nestes últimos tempos é a diminuição dos volumes de pescado, desde camarão, passando pela famosa marora, também conhecida por magumba, magarage, entre outras espécies de mariscos.
Não há controlo
O Conselho Comunitário de Pesca (CCP) da Praia Nova anda bastante preocupado. A razão disso, segundo o respectivo presidente, Dilip Ramgi, está no facto de neste momento não haver controlo por parte das autoridades sobre o abate desenfreado do mangal.
“No ano passado estivemos nas ilhas a fazer uma sensibilização num grupo multissectorial. Ao longo do trajecto fomos encontrando muitas pessoas a venderem estacas de mangal em pequenas quantidades. É lá onde os compradores idos da Beira, principalmente, e de outros locais vão adquirir o mangal e trazem-no para revender. A Administração Marítima e o MICOA deveriam ter uma fiscalização cerrada para acabar com isso porque nós, como pescadores, estamo-nos a ressentir disso porque as nossas capturas já estão a diminuir. Nós nos propomos que seja criada uma equipa multissectorial para trabalhar by surfkeepit\\\0022 ""> no estancamento desse problema”, defendeu Ramgi.
O presidente do CCP da Praia Nova entende ainda que deve haver acções de desencorajamento das pessoas que comercializam este produto, pois, segundo ele, se não existirem compradores também ninguém vai continuar a cortar mangal.
“Dentro de poucos anos poderemos ter uma crise acentuada de peixe, camarão e outras espécies marinhas que se reproduzem nos mangais porque há abate desenfreado desta espécie de recurso natural. Vamos viver de peixe importado? Os estuários estão a ser destruídos pelos cortadores de mangal e estamos a assistir de forma passiva a esta acção”, sustentou o presidente do Conselho Comunitário de Pesca da Praia Nova.
Recurso à vida
UM pouco por toda a cidade da Beira e outras áreas peri-urbanas encontramos quantidades enormes de estacas de mangal à venda. Os maiores centros de comercialização são a Praia Nova e Dama, no bairro da Munhava-Matope.
As embarcações que diariamente largam e chegam de e para aqueles pontos trazem grandes quantidades de estacas de vários tamanhos de mangal para a venda. Uma parte é imediatamente comercializada no local, enquanto outra é transportada através de camiões, txovas ou mesmo na cabeça para as diversas áreas de venda existentes a nível da urbe.
Falando à nossa Reportagem, alguns comerciantes disseram que o fazem com a consciência de que estão a destruir o meio ambiente, sobretudo os recursos marinhos, mas não têm outra alternativa enquanto não houver emprego. Fazem-no como recurso à sobrevivência.
Por exemplo, Amadeu Elias, que está nesta actividade desde 2009 na Praia Nova, reconheceu que ao se fazer às ilhas sempre tem na consciência que está a minar o desenvolvimento marinho.
“Sempre vou cortar mangal nas ilhas mas estou ciente de que estamos a fazer mal. Só que eu faço isso porque não tenho outra alternativa. Não quero roubar para poder viver. Não tenho emprego”, argumentou Elias.
Afirmou que em cada viagem consegue trazer para o seu estaleiro entre 220 a 500 estacas de mangal grandes e pequenas.
Ecossistema recuperado
O programa de reflorestamento em curso no posto administrativo de Nhangau, arredores da cidade da Beira, já permitiu a reposição de cerca de 500 hectares que haviam sido devastados em consequência dos efeitos combinados da acção humana e das mudanças climáticas.
Segundo o director executivo da Agência de Desenvolvimento Económico Local (ADEL - Sofala), Amid Taybo, neste momento o maior desafio é garantir uma fiscalização eficiente de modo a que o trabalho feito pelas comunidades continue a preservar os recursos naturais existentes.
Com esta actividade, que é feita pela ADEL - Sofala, Governo e outros parceiros, Nhangau considera-se como um dos exemplos bem sucedidos de reflorestamento, sobretudo de mangal, eucaliptos, entre outras espécies florestais.
A gestão ambiental sustentável que está a ser feita através da reposição da floresta devastada, sobretudo do mangal ao longo da costa daquela região, também já permitiu a recuperação em grande escala das espécies marinhas, bem como contribuiu para a defesa da zona de marés altas e ventos fortes.
Para além do apoio material, os comités de gestão dos recursos naturais daquela região beneficiam igualmente de apoio técnico.
A Agência de Desenvolvimento Económico Local de Sofala potenciou ainda aquela região com um jardim medicinal, estando a trabalhar com escolas e clubes ambientais no âmbito do programa de educação sobre o meio ambiente.
Taybo disse que a componente de fiscalização constitui um dos grandes desafios em Nhangau tendo em vista a preservação dos recursos naturais ali existentes, sobretudo para desencorajar a desmatação que tem sido feita por alguns indivíduos oriundos de vários pontos, mas com incidência para a cidade da Beira para o fabrico de carvão e produção de lenha.
“A iniciativa de desenvolvermos um debate sobre o mangal não deve ser apenas da ADEL - Sofala mas sim de outros organismos que trabalham no processo de mudanças climáticas. Temos que encontrar soluções neste âmbito para o abate indiscriminado de mangal”, disse Amid Taybo.
Segundo a fonte, cientistas a nível do mundo estão a estudar o potencial do mangal para o sequestro do carbono que visa fazer a compensação dos países industriais.
Criar movimento
A chefe dos Serviços Provinciais de Florestas e Fauna Bravia, Maria Augusta, disse a propósito que, a avaliar pela forma como está a ser abatido o mangal, dentro dos próximos anos teremos muitas dificuldades nos produtos pesqueiros.
Para ela, a conjuntura actual socioeconómica do país não justifica que as pessoas procedam ao abate indiscriminado deste recurso natural. Assim, entende que deve existir um movimento visando travar esta situação, com o envolvimento de estudantes, académicos, autoridades comunitárias, governantes, entre outras sensibilidades.
“Deve-se criar um clube de amigos do mangal para que possamos dar a volta ao que acontece. Temos que recuperar a floresta e para isso os SPFFB tencionam criar um movimento que, de forma espontânea, possa trabalhar na recuperação da floresta. Queremos ser o veículo para isso. Temos que intensificar aspectos que possam regenerar as florestas devastadas, tal como está a acontecer em Nhangau” - explicou Maria Augusta.
ANTÓNIO JANEIRO
NOTÍCIAS – 30.07.2014